Jair Bolsonaro olhando para o relógio. Foto: Pedro Ladeira/Folhapress

Por Luís Carlos Streck

O tempo é o nome do ser, dizia Heidegger. Por isso sua obra maior pode ser lida como Tempo é Ser. Quando nos perguntamos sobre a realidade, talvez estejamos nos perguntando sobre a real-idade da coisa. Ou de nós mesmos. O tempo lanha. Conspira.

Vejamos dados objetivos – até porque sou daqueles que não concorda com Nietzsche de que “fatos não há; só há interpretações”. Para mim, só existem interpretações porque há fatos. Assim, há oito meses Moro estava “mortinho”, como diziam. Sua cassação era dada como certa. Passado o tempo, Moro foi absolvido por unanimidade. E pelo Tribunal Superior Eleitoral. Vejam o tempo pregando peças, costurando. O tempo perfeitamente alinhado com os arranjos políticos-institucionais brasileiros, país que mistura “perfeitamente” as interpretações marxistas e weberianas.

O mesmo se aplica à prisão de Bolsonaro (e quem sabe aos processos contra ele). Há oito ou nove meses, Bolsonaro estava prestes a ser preso. Passado o tempo, isso hoje é impossível, a menos que ocorra alguma patacoada. É o tempo andando de mãos dadas com essa “perfeita” simbiose entre “teoria da dependência-e ‘os donos do poder faoriana”.

Outro dado objetivo: a delação de Mauro Cid, que já chamei de Delação Sherazade. Mil e uma noites. Não acaba nunca. E o tempo vai passando. E conspirando.

Mauro Cid e Jair Bolsonaro. Foto: Foto: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo

O sistema de justiça brasileiro tem sobre seus ombros não apenas os casos (tentativa de golpe do 8 de janeiro, cartão de vacinas, conspiração dos ministros militares – e civis -, caso das joias, ABIB paralela etc.), mas tem de lutar também contra o tempo.

É esse tempo que pode naturalizar não apenas um conjunto de crimes e até, arrepiemo-nos, uma tentativa de golpe, como também, quem sabe, uma anistia para os golpistas daqui a alguns meses. Não, não se assustem. E para os céticos, pensem no que escrevi acima. Há alguns meses era uma coisa; meses depois, bem outra. O fato não mudou; mudaram foram as circunstâncias, chefiadas por Chronos – o Deus do Tempo.

O Brasil, por suas raízes (quais são, mesmo?) – no meu livro O que é Fazer a Coisa certa dedico um capítulo para tentar explicar esse ornitorrinco conceitual – não consegue se livrar do passado que o oprime. Aqui no Rio Grande do Sul tem a Igreja Positivista, cujo lema está na bandeira nacional. E tem uma frase positivista muito forte que diz “cada vez mais os vivos serão governados pelos mortos”. Pois é. Basta ver o espectro militar que ronda sobre o país. Até o presidente Lula não quis que se fizesse críticas ao golpe de 64. Os mortos não são fáceis, mesmo.

Lembram da camiseta que Collor (vejam o passado) usava? Estava escrito O Tempo é o Senhor da Razão.

Pode ser. E eu estou virando cronofóbico…!

Publicado originalmente no Red

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Última Atualização: 22/07/2024