Em meio ao ajuste econômico, a Argentina perdeu relevância nas exportações brasileiras. Nos primeiros seis meses deste ano, a participação do país vizinho nas vendas do Brasil foi de apenas 3,5%, o menor índice desde 1991, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços compilados pelo Estadão.
No início dos anos 2000, a Argentina representava mais de 10% das exportações brasileiras. No entanto, as crises frequentes no país e o aumento da importância da China – grande importadora de commodities como minério de ferro e soja – na pauta exportadora brasileira fizeram com que a Argentina perdesse espaço.
Hoje, a Argentina ainda é o terceiro principal destino dos produtos brasileiros, mas está bem atrás da China (30,9%) e dos Estados Unidos (11,5%), e próxima da Holanda (3,3%) e da Espanha (3%).
Em 2024, dois fatores principais explicam a perda de relevância da Argentina. O primeiro é mais específico e está relacionado à redução nas exportações de soja brasileira em comparação ao ano anterior. Em 2023, a Argentina enfrentou uma quebra de safra e precisou importar soja do Brasil.
No primeiro semestre, a exportação de soja do Brasil para a Argentina somou apenas US$ 61,6 milhões, bem abaixo dos US$ 1,548 bilhão registrados no mesmo período do ano passado. O segundo fator são as medidas econômicas adotadas pelo governo de Milei.
Eleito no final do ano passado com um discurso radical, prometeu acabar com o Banco Central e dolarizar a economia. No poder, implementou várias medidas para controlar a inflação e ajustar as contas públicas. O Produto Interno Bruto (PIB) caiu 5,1% no primeiro trimestre, colocando o país em recessão técnica.
Segundo Julia Gottlieb, economista do Itaú, a queda das exportações para a Argentina reflete uma demanda menor e uma economia mais fraca. Isso é evidente no desempenho das exportações brasileiras de veículos automotivos de passageiros, que caíram de US$ 858,5 milhões no primeiro semestre de 2023 para US$ 734,1 milhões no mesmo período deste ano.
As vendas de partes e acessórios de veículos também diminuíram, de US$ 950,7 milhões para US$ 700,1 milhões no período. No total, as exportações para a Argentina somaram US$ 5,9 bilhões no primeiro semestre, uma queda de 37,6% em comparação ao mesmo período do ano passado.
José Augusto de Castro, presidente executivo da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), afirmou que a Argentina enfrenta a falta de divisas e tem três alternativas: obter financiamento internacional, atrair capital estrangeiro ou gerar superávits comerciais restringindo importações.
Apesar da queda nas vendas para a Argentina, o cenário geral ainda é positivo para o comércio internacional brasileiro. No primeiro semestre deste ano, as exportações totais do Brasil somaram US$ 167,61 bilhões, acima dos US$ 165,23 bilhões registrados no mesmo período de 2023.
Jankiel Santos, economista do banco Santander, explicou que o saldo comercial só deve ser menor este ano porque as importações estão crescendo, impulsionadas por estímulos fiscais que aumentam a atividade e o consumo.
Entre janeiro e junho de 2024, as importações somaram US$ 125,3 bilhões, acima dos US$ 120,61 bilhões do mesmo período de 2023.
Atualmente, bancos e consultorias projetam um saldo comercial positivo entre US$ 75 bilhões e US$ 85 bilhões para este ano. Se confirmado, será um resultado inferior ao recorde de US$ 98,8 bilhões do ano passado, mas ainda em um nível positivo.
“O país mudou de patamar em relação ao superávit comercial”, diz Jankiel. “Projetamos um saldo comercial de US$ 75 bilhões, que será o segundo maior da série histórica do Brasil.”