Ao discursar nesta terça-feira (16) na 10ª Reunião do Conselho de Participação Social (CPS), no Salão Oeste do Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reafirmou a centralidade da participação popular na condução do governo e propôs intensificar o calendário de encontros do colegiado em 2026. Segundo ele, o próximo ano será “o mais delicado e decisivo das últimas décadas” para o futuro da democracia brasileira.
“Eu queria começar essa reunião pelo fim”, disse Lula, ao alertar que o país tem apenas 12 meses até dezembro de 2026 para organizar uma ampla mobilização democrática. Segundo ele, o próximo ano será “o mais importante das últimas décadas”, quando a sociedade brasileira terá de decidir “que país quer deixar para os seus filhos e netos” e “que tipo de democracia vai querer”.
Criado em 2003, o CPS assessora a Presidência da República no diálogo com setores organizados da sociedade civil. Na reunião, Lula assinou a portaria de recondução dos conselheiros — todos oriundos da sociedade civil —, acompanhou o balanço das atividades de 2025 e apontou prioridades políticas para o próximo período.
Reuniões mais frequentes e debate de conjuntura
Lula sugeriu que, em vez de encontros trimestrais, o Conselho passe a se reunir a cada dois meses ou dois meses e meio em 2026. Para o presidente, a frequência maior é necessária para discutir não apenas pautas específicas, mas a conjuntura nacional e os rumos do país. “A sociedade brasileira vai ter que definir que país quer construir, que democracia quer exercer”, afirmou.
“Não é só para discutir as faltas ou as coisas a aprimorar, mas para discutir a conjuntura nacional”, afirmou.
Reconstrução após o desmonte
No balanço de sua gestão, Lula comparou o início do terceiro mandato a um cenário de terra arrasada. Segundo ele, o governo encontrou ministérios desmontados, conselhos esvaziados e ausência de planejamento orçamentário. Lula usou metáforas fortes: “Era como se a gente tivesse chegado num açude para beber água e não tivesse encontrado água”, disse. “Eles tinham praticamente dizimado quase tudo neste país.”
O presidente lembrou que o governo sequer encontrou orçamento aprovado e que foi necessário reconstruir ministérios, conselhos e estruturas do Estado. “Nós fomos eleitos não para reclamar, mas para fazer o que era preciso ser feito”, afirmou. “Passamos praticamente dois anos reconstruindo esse país”, disse, destacando a reorganização do Estado e a retomada de políticas públicas.
Avanços sociais e limites do Congresso
Lula destacou que, apesar das dificuldades iniciais, o governo alcançou resultados que antes pareciam inalcançáveis. “Eu tenho muito orgulho de dizer que chegamos a uma situação altamente confortável do ponto de vista da economia, das conquistas sociais e dos avanços democráticos.”
Entre os indicadores citados, o presidente mencionou a menor inflação acumulada em quatro anos, o retorno do aumento real do salário mínimo após sete anos de congelamento, o crescimento da massa salarial e o menor nível de desemprego da história. Ao mesmo tempo, reconheceu as dificuldades impostas pela correlação de forças no Congresso, ressaltando que reformas estruturais, como a tributária, exigiram intensa negociação. “Pouco dinheiro na mão de muitos significa desenvolvimento; muito dinheiro na mão de poucos significa pobreza”, afirmou.
Brasil de volta ao cenário internacional
No campo externo, Lula destacou a recuperação do prestígio do Brasil, a abertura de novos mercados para produtos nacionais e a expectativa de assinatura do acordo Mercosul–União Europeia. Também mencionou negociações com os Estados Unidos e a defesa firme da democracia e da soberania brasileiras nas tratativas comerciais e políticas.
“O Brasil não era mais convidado para eventos internacionais”, disse, lembrando o isolamento diplomático do período anterior.
Segundo ele, em três anos o governo realizou reuniões com todos os países da União Africana, da União Europeia e da Celac, além de retomar a Unasul. Lula também afirmou que o Brasil abriu cerca de 500 novos mercados para produtos nacionais e demonstrou otimismo com a assinatura do acordo Mercosul–União Europeia. “Não vou aceitar que tenham medo de competir com o povo brasileiro”, declarou.
Ao comentar a relação com os Estados Unidos, Lula afirmou que o Brasil atuou com “altivez e paciência” diante de disputas comerciais. “A primeira coisa que fizemos foi não aceitar, em hipótese alguma, o complexo de vira-lata”, disse. “A soberania brasileira e a democracia brasileira não estavam em discussão.”
Democracia, Justiça e soberania
Entre os resultados internos, o presidente citou ainda a ampliação da proteção ambiental e o reconhecimento de terras indígenas. O presidente ressaltou os avanços democráticos recentes, citando como marco histórico a responsabilização de envolvidos em tentativa de golpe de Estado. Para Lula, esse processo demonstra o amadurecimento institucional do país e o respeito às regras constitucionais.
“Pela primeira vez em 520 anos, este país tem um ex-presidente preso por tentativa de golpe”, disse, acrescentando que isso não é motivo de orgulho individual, mas prova de amadurecimento democrático.
“A sociedade brasileira aprendeu a exigir que as regras da Constituição e do processo eleitoral sejam cumpridas”, afirmou Lula, lembrando que perdeu eleições e respeitou os resultados. “A gente resolveu se preparar para ganhar, e não para quebrar a democracia.”
Violência contra as mulheres: chamado aos homens
Lula dedicou parte final do discurso ao combate à violência contra as mulheres e ao feminicídio. Defendeu de forma contundente que a responsabilidade pela mudança de comportamento é dos homens e que o enfrentamento do machismo deve ser um processo educativo permanente, desde a escola até os espaços de trabalho e militância. “Não é uma luta só das mulheres”, enfatizou.
“O problema da violência contra a mulher é o comportamento do homem”, afirmou. “Se a gente não mudar isso, não vai resolver.”
O presidente defendeu que o enfrentamento do machismo seja incorporado à educação e às lutas sociais. “Não é uma luta só das mulheres. Quem tem que ir para a rua protestar é o homem que respeita a mulher”, declarou.
2026 como teste decisivo
Ao encerrar, Lula voltou a enfatizar a centralidade do próximo ciclo eleitoral. “2026 é o ano da verdade”, afirmou. Para ele, será necessário dialogar com quem pensa diferente e sair da zona de conforto política. “Ir onde já está com a gente é fácil. A gente tem que ir onde está a abelha com ferrão.”
Convicto, concluiu: “Com a mesma fé que eu tenho em Deus, eu estou convencido de que, se depender de nós, a extrema-direita negacionista nunca mais vai governar este país chamado Brasil.”
Encerrando a fala, convocou os conselheiros e movimentos sociais a dialogarem com toda a sociedade. Para Lula, a disputa política exige presença nos territórios, escuta ativa e clareza sobre quem governou para o povo.