Da repressão à conquista: a luta sindical que garantiu o 13º salário aos trabalhadores no Brasil

O décimo terceiro salário não foi concessão nem favor, é fruto da luta dos sindicatos, de greves históricas e da resistência da classe trabalhadora diante da repressão do Estado e da oposição dos patrões.

Cerco policial ao Sindicato dos Metalúrgicos na greve deflagrada por metalúrgicos e têxteis em São Paulo para lutar pelo 13º salário — Foto: MEMORIAL DA DEMOCRACIA.

O 13º salário, hoje parte fundamental da renda de milhões de trabalhadoras e trabalhadores brasileiros, é uma das maiores conquistas do movimento sindical no país. Sua história comprova que os direitos trabalhistas não surgem por boa vontade do empresariado ou por decisões isoladas do Estado, mas são resultado de mobilização, unidade e luta coletiva da classe trabalhadora organizada.

Desde as primeiras décadas do século XX, o pagamento de uma gratificação de fim de ano já aparecia como reivindicação nos sindicatos e nas campanhas salariais. Em algumas empresas, o chamado abono de Natal era pago de forma espontânea, porém sem garantia legal, restrito a determinados setores e tratado como favor patronal. Diante dessa realidade, os sindicatos passaram a lutar para transformar essa prática em um direito assegurado a todos os trabalhadores.

#HojenaHistoria 1961 – SÃO PAULO Em São Paulo, greve de várias categorias exigindo o 13º salário. A polícia prende mais de 6 mil trabalhadores e, por falta de espaço nas cadeias, os amontoa no Hipódromo Municipal. [Fonte: Livro Agenda NPC 2015 – A comunicação dos trabalhadores dia a dia].

Nos anos 1950, a pauta chegou ao Congresso Nacional, mas enfrentou forte resistência. Em 1951, um projeto que tratava da gratificação natalina foi barrado sob o argumento de que o Estado não poderia interferir nos custos das empresas. Essa posição expressava a lógica das elites econômicas, historicamente contrárias à ampliação dos direitos trabalhistas e à intervenção estatal em favor da classe trabalhadora.

A luta, no entanto, se manteve viva. Em 1959, um novo projeto sobre o abono de Natal foi apresentado, já em um contexto de maior organização sindical e de intensificação das mobilizações no chão das fábricas. A partir de 1960, os sindicatos ampliaram a pressão sobre o Parlamento e o governo, combinando atuação política institucional com mobilização direta, conscientes de que o direito não seria conquistado sem enfrentamento.

Esse processo culminou na greve de dezembro de 1961, liderada principalmente pelos sindicatos dos metalúrgicos e dos trabalhadores têxteis de São Paulo. A paralisação exigia a aprovação do 13º salário e ganhou grandes proporções. A resposta do Estado foi dura: o movimento foi declarado ilegal, sindicatos foram cercados pela polícia e milhares de trabalhadores foram presos. Em São Paulo, mais de seis mil grevistas chegaram a ser detidos e mantidos no Hipódromo Municipal por falta de espaço nas cadeias.

Manifestação de bancários grevistas no Rio de Janeiro, em 1961 — Foto: MEMORIAL DA DEMOCRACIA.

Mesmo sob forte repressão, a mobilização produziu efeitos políticos. A Câmara dos Deputados aprovou o projeto em primeiro turno, mas adiou a votação final diante da pressão do empresariado, que reagiu com discursos alarmistas, afirmando que o novo direito provocaria prejuízos econômicos e demissões — argumentos que a própria história desmentiu.

Diante da postergação da decisão e do agravamento da crise política nacional, o movimento sindical elevou o nível da luta. Em 5 de julho de 1962, foi convocada a primeira greve geral nacional da história do Brasil. A paralisação atingiu setores estratégicos da economia e demonstrou, de forma clara, a força da unidade e da organização da classe trabalhadora em escala nacional.

Sancionado o projeto do 13º mês de salário’, noticiava o jornal O Globo em 14 de julho de 1962 — Foto: REPRODUÇÃO O GLOBO/ACERVO DIGITAL

Durante a greve geral, lideranças sindicais se dirigiram a Brasília para negociar diretamente com o presidente João Goulart. O Senado já havia aprovado o projeto, e a pressão dos trabalhadores foi decisiva para que o presidente assumisse o compromisso de sancionar a lei. Em 13 de julho de 1962, João Goulart sancionou a Lei nº 4.090, instituindo oficialmente o 13º salário no Brasil.

São Paulo (SP) – 13/12/1961 – Greves – SP – Greve deflagrada pelos sindicatos de metalúrgicos e têxteis para lutar pelo décimo terceiro salário (13º salário) – Cerco policial ao sindicato dos metalúrgicos de São Paulo – Foto Arquivo / Agência O Globo – Neg: 26844
São Paulo (SP) – 13/12/1961 – Greves – SP – Greve deflagrada pelos sindicatos de metalúrgicos e têxteis para lutar pelo décimo terceiro salário (13º salário) – Cerco policial ao sindicato dos metalúrgicos de São Paulo – Foto Arquivo / Agência O Globo – Neg: 26844

A conquista, porém, não foi imediata para toda a classe trabalhadora. Inicialmente, trabalhadores rurais e servidores públicos ficaram de fora do direito. Em 1963, o benefício foi estendido aos aposentados. Em 1965, já sob a ditadura militar, foi regulamentado o pagamento em duas parcelas. Somente com a Constituição Federal de 1988 o 13º salário passou a ser garantido aos trabalhadores urbanos e rurais, sendo posteriormente estendido também aos servidores públicos.

A trajetória do 13º salário ensina uma lição central para o presente: direitos não são favores. Eles são resultado de organização, luta e resistência coletiva. Mesmo diante dos ataques aos direitos trabalhistas e da precarização das relações de trabalho nas últimas décadas, o 13º salário permanece como símbolo da força das conquistas históricas da classe trabalhadora brasileira.

Ao relembrar essa história, a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) reafirma seu compromisso com a defesa dos direitos e da dignidade da classe trabalhadora. A conquista do 13º salário mostra que é a luta sindical que transforma reivindicações em direitos e resistência em vitória para a classe trabalhadora.

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