
O projeto da chamada Dosimetria, aprovado pela Câmara dos Deputados e enviado ao Senado, deve abrir brechas que vão além da redução de pena para o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro. Segundo o Globo, avaliações feitas por senadores da base governista e da oposição, além de juristas e integrantes do Ministério da Justiça, indicam que o texto pode beneficiar também réus condenados por crimes cometidos com violência ou grave ameaça, inclusive em casos de exploração sexual e interferência violenta em licitações públicas.
A principal controvérsia está na alteração da Lei de Execução Penal. Pela legislação atual, réus primários que cometem crimes sem violência ou grave ameaça podem progredir de regime após cumprir 16% da pena. Quando há violência, o percentual mínimo sobe para 25%.
O projeto da Dosimetria, no entanto, permite a aplicação dos 16% a crimes cometidos com violência ou grave ameaça que não estejam classificados como crimes contra a pessoa e o patrimônio nem enquadrados como hediondos.
Na prática, a mudança abre espaço para que condenados por diversos tipos penais possam deixar o regime fechado mais cedo.
Entre os crimes potencialmente beneficiados estão a abolição violenta do Estado Democrático de Direito e a tentativa de golpe de Estado, pelos quais Bolsonaro e outros réus do 8 de janeiro foram condenados; a coação no curso do processo, imputada ao deputado Eduardo Bolsonaro (PL); além de favorecimento à prostituição ou outra forma de exploração sexual por meios violentos, afastamento de licitante mediante violência, incêndio doloso, resistência e atentado à soberania nacional.

No Senado, parlamentares avaliam ajustes no texto para conter essas brechas. “Percebemos essa falha na redação proposta e estamos avaliando se será viável alterar o texto no ponto, sem ter que voltar à Câmara”, afirmou o senador Sergio Moro (União-PR), defensor da anistia aos réus dos atos de 8 de janeiro.
O projeto foi aprovado na Câmara por 291 votos a favor e 148 contra, na madrugada desta quarta-feira, e chegou ao Senado sob críticas de ter sido moldado para reduzir o tempo de prisão de Bolsonaro e aliados.
Durante a votação, o relator da proposta na Câmara, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), foi questionado sobre os impactos mais amplos da mudança.
Ele negou que o texto tenha alcance geral. “Respeitando a opinião dos deputados, muitas vezes política, quero deixar claro que este texto, organizado por uma série de juristas, dos mais importantes do Brasil, trata apenas do 8 de Janeiro”, declarou.
A afirmação foi contestada por parlamentares contrários ao projeto. O deputado Pedro Campos (PSB-PE) alertou para os efeitos práticos da alteração.
“Lendo o relatório, eu vi que há uma alteração na Lei de Execução Penal, que diz quanto tempo, no mínimo, o preso tem que cumprir pena em regime fechado. É importante ficarmos atentos a isso, porque a medida que serve para beneficiar Bolsonaro e o pessoal do 8 de Janeiro — o que já seria um absurdo —, pode servir para que muita gente presa hoje ou que ainda vai cometer crime passe menos tempo no regime fechado”, disse.