Guinada dos EUA ameaça estabilidade e favorece avanço chinês no mundo

Na nova edição do Entrelinhas Vermelhas, o professor Evandro Menezes de Carvalho descreve o “tarifaço” de Donald Trump como uma política que produziu mais danos do que resultados para os próprios EUA. Evandro é professor de Direito na Universidade Federal Fluminense (UFF) e na FGV no Rio de Janeiro, fundador do Centro de Estudos e Pesquisas do BRICS, e também leciona em instituições universitárias e acadêmicas da China. 

O especialista destaca que, apesar do discurso de reindustrialização, o aumento de tarifas encareceu produtos para o consumidor estadunidense, pressionando cadeias produtivas internas e alimentando descontentamento popular.

Além disso, a estratégia não conteve a expansão chinesa: a China bateu recorde de exportações, superando US$ 1 trilhão, e acelerou o desenvolvimento de chips e outras tecnologias — justamente nas áreas afetadas pelas barreiras impostas pelos EUA.

EUA perdem legitimidade e se afastam do multilateralismo

O programa enfatiza que a política externa de Trump aprofunda a perda de legitimidade histórica dos EUA como liderança global.

Segundo Evandro, a imagem de “potência benigna” — sustentada por décadas apesar de guerras e intervenções — desmorona diante do unilateralismo, da espionagem global revelada por Assange e Snowden, e da crise democrática interna, marcada por desigualdade crescente, xenofobia e perseguições políticas.

Para o especialista, o país vive uma deterioração estrutural com 49 milhões de pessoas na miséria, 75 mil prisões sem antecedentes criminais desde a posse de Trump e aumento de grupos ultradireitistas e “nazificação” de parcelas da política doméstica.

Esse cenário, afirma, compromete o futuro dos EUA e reduz sua capacidade de liderar a ordem internacional.

China adota estratégia clara e consolida liderança global

Diferentemente do improviso trumpista, Evandro ressalta que a China opera com planejamento estratégico de longo prazo, guiado pelos planos quinquenais, relatórios anuais de metas e forte integração entre Estado, empresas e comunidade científica.

O país avança em infraestrutura global, ampliação de parcerias e políticas de atração de talentos — em contraste direto com a postura norte-americana de fechamento de fronteiras e desconfiança contra estrangeiros.

A combinação de planejamento, diplomacia ativa e investimentos estruturantes torna a China, segundo o professor, a principal potência econômica emergente, possivelmente já impossível de conter.

Risco real de intervenção na Venezuela e impacto no Brasil

Um dos pontos mais sensíveis do programa é o alerta sobre o risco de intervenção militar dos EUA na Venezuela, impulsionado por figuras republicanas e pela doutrina da “garantia do quintal” citada por Marco Rubio.

Evandro considera que tal movimento seria desastroso para a América do Sul e obrigaria o Brasil a levar o tema ao Conselho de Segurança da ONU — abrindo espaço para disputas entre EUA, China e Rússia e reduzindo o protagonismo diplomático brasileiro.

Para o professor, a presença de governos de direita alinhados a Washington — como Javier Milei na Argentina — amplia as vulnerabilidades regionais.

Desafio brasileiro: firmeza diplomática e distanciamento da subserviência

A edição também destaca a atuação do governo Lula diante do tarifaço. Evandro afirma que o Brasil agiu corretamente ao evitar retaliações precipitadas, manter negociação diplomática, preservar soberania e dignidade nas conversas e ampliar diversificação de mercados.

O especialista compara essa postura com a do governo Bolsonaro, que adotara “submissão explícita”, simbolizada até pela cena de bater continência para a bandeira dos EUA.

Para ele, num cenário de tensões crescentes, o Brasil precisa manter autonomia estratégica, fortalecer parcerias plurais e evitar dependência de Washington.

O mundo pós-hegemonia: incerteza e oportunidades

Entrelinhas Vermelhas conclui que o declínio do poder norte-americano, associado à ascensão da China e à radicalização política interna nos EUA, forma o ambiente internacional “mais difícil das últimas décadas”.

Mas também abre espaço para países capazes de ler o cenário com inteligência diplomática, construir alianças diversificadas e evitar escolhas alinhadas automaticamente a um bloco ou outro.

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