
Por Filipe Augusto Peres
Da Página do MST
Realizado neste sábado (6), o Encontro das Amigas e Amigos do MST reuniu centenas de militantes, apoiadores, autoridades públicas, artistas e famílias assentadas no Centro de Formação Sócio-Agrícola Dom Helder Câmara, localizado no Assentamento Mário Lago, em Ribeirão Preto. A atividade integrou formação política, celebração cultural, conquistas institucionais, educação popular e partilha de alimentos saudáveis, reafirmando a centralidade da reforma agrária popular como projeto de desenvolvimento social, ambiental e econômico.
A programação teve início com o Seminário sobre Questão Agrária e Questão Ambiental, coordenado por Joaquim Lauro Sando, da Direção Estadual do MST. Na abertura, Sando destacou que o seminário buscou articular a luta pela democratização da terra com os desafios impostos pela crise climática, o avanço do agronegócio e a necessidade de fortalecimento da agroecologia como base produtiva dos assentamentos.
A Mesa foi composta por Guilherme Cortez (PSOL/SP), deputado estadual pelo PSOL, por Marcelo Goulart, promotor de Justiça aposentado, e Nivalda Alves, da direção estadual do MST. Em sua fala, Guilherme Cortez afirmou que a questão agrária permanece como eixo estrutural das desigualdades sociais no Brasil e que não há soberania alimentar nem enfrentamento real da crise ambiental sem a efetivação da reforma agrária. Goulart também alertou para o crescimento da extrema-direita no campo e nas cidades e defendeu a organização permanente dos movimentos populares, aliando mobilização social e disputa política institucional.

Um dos principais responsáveis pela conquista do PDS da Barra, Marcelo fez uma análise histórica da concentração fundiária no país, afirmando que a desigualdade no acesso à terra atravessa mais de cinco séculos da formação brasileira. O promotor ressaltou que a reforma agrária é um dever constitucional do Estado e que sua não implementação aprofunda as desigualdades sociais, regionais e ambientais. Em sua intervenção, também relacionou a pauta agrária à proteção ambiental, denunciando o papel do agronegócio no desmatamento, no uso intensivo de agrotóxicos e na precarização das relações de trabalho no campo.
Na sequência do Seminário, Nivalda Alves, da Direção Estadual do MST, reforçou que a reforma agrária popular é inseparável da luta ambiental, pois os assentamentos agroecológicos cumprem papel estratégico na preservação das nascentes, na recuperação do solo e na produção de alimentos sem venenos para a população.
Após as falas centrais, a vereadora Perla Müller (PT/SP) participou do debate, destacando a importância das políticas públicas municipais voltadas ao campo, especialmente no que se refere ao acesso à água, à saúde e aos canais de comercialização da produção da agricultura familiar.

Encerrando as intervenções do Seminário, Kelli Mafort, secretária da Secretaria Nacional de Diálogos Sociais e Articulação de Políticas Públicas, abordou o papel estratégico da participação popular na formulação das políticas públicas, afirmando que os avanços só se consolidam quando a sociedade civil organizada mantém diálogo permanente com as instituições do Estado.
Na parte da tarde, foi realizado o ato simbólico de assinatura de contrato entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e assentados da reforma agrária para liberação de recursos destinados a Recuperação Ambiental; contrato entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e assentados da reforma agrária para liberação de recursos destinado a construção de casas; assinatura pelo Ministério de Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e a Superintendência do Instituto de Colonização e Reforma Agrária – INCRA-SP, do Termo de Execução Descentralizada (TED) para fortalecimento de Sistemas Agroecológicos e Mitigação das Mudanças Climáticas; convenio entre o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e a Prefeitura Municipal de Ribeirão Preto para contratação de serviços especializados de engenharia relacionados a implantação de sistemas de abastecimento de água para as famílias do PDS da Barra.
Em sua fala, Sabrina Diniz destacou a reconstrução das políticas de reforma agrária após anos de desmonte institucional, ressaltando o aumento dos créditos habitacionais, ambientais e de fomento à produção, além da importância do assentamento Mário Lago como referência em agroecologia e recuperação ambiental.

O ministro Paulo Teixeira afirmou que o governo federal voltou a tratar a reforma agrária como política estratégica de desenvolvimento, enfatizando o diálogo com municípios e estados para garantir água, moradia, infraestrutura e produção aos assentamentos, além de defender que a democratização da terra é condição essencial para a justiça social no país.
A procuradora da República Sabrina Menegário ressaltou o papel do Ministério Público na defesa dos direitos das famílias assentadas, destacando que o saneamento básico, o acesso à água potável e às políticas públicas são direitos fundamentais e não favores institucionais, devendo ser garantidos pelo Estado.
O prefeito Ricardo Silva, por sua vez, reconheceu a dívida histórica do poder público com as famílias assentadas e afirmou que o município assumiu o compromisso de colaborar com a implantação do saneamento básico, da unidade de saúde e de outras melhorias estruturais, destacando que garantir água, esgoto e dignidade é uma obrigação do Estado.
Representando a Direção Estadual do MST, Manuela Aquino realizou pronunciamento no Ato Político, ressaltando que as conquistas anunciadas são fruto de décadas de resistência das famílias assentadas. Em sua fala, destacou que a reforma agrária não se resume ao acesso à terra, mas envolve o direito à água, à moradia, à saúde, à educação, à produção agroecológica e à dignidade.
Também estiveram presentes na mesa: Kelli Mafort, Secretária Nacional de Diálogos Sociais e Articulação de Políticas Públicas da Secretaria-Geral da Presidência da República; a deputada estadual Marcia Lia (PT/SP); a vereadora Judeti Zill (PT/SP); Marcelo Goulart, ex-Promotor de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo; Newton Lima, ex-Prefeito de São Carlos.

O Encontro também foi marcado por um dos momentos mais emocionantes do dia: a cerimônia de entrega dos diplomas da turma da Alfabetização de Jovens e Adultos do projeto “Sim, Eu Posso”, do Assentamento Mário Lago, tendo como educadora Raquel Braga. O método, de origem cubana, é baseado na associação entre números, letras e recursos audiovisuais, e tem como objetivo garantir uma alfabetização rápida, crítica e voltada à emancipação social de jovens, adultos e idosos. Doze educandos se formaram, e um deles realizou, pela primeira vez em sua vida, a leitura pública de uma carta escrita por ela para a prima, ao vivo, no palco, sob aplausos e forte comoção do público. Além da turma do Mário Lago, outras nove turmas na cidade e na região estão em fase de conclusão nas próximas duas semanas, processo que deve resultar na alfabetização de quase 80 novos alunos, ampliando significativamente o alcance da educação popular.
No Estado de São Paulo, o “Sim, Eu Posso” conta com 150 turmas, sendo 50 no interior.
Além da dimensão política e educacional, o evento celebrou a cultura popular com apresentações musicais ao longo da tarde e da noite. Passaram pelo palco os grupos Ana Favaretto e Márcio Coelho, Coletivo O Hierofante, Samba da Opinião, Trio Tamanco Suado e o Maracatu Nzila, reafirmando a arte como instrumento de resistência, identidade e mobilização popular.
A alimentação também teve destaque com a Culinária da Terra, sob o comando do chef Hugo da Selva, que serviu galinhada caipira e arroz com pequi para os vegetarianos. Durante todo o evento, o tatuador Guilherme Pasck realizou “flashes tattoos” a preços populares, oferecendo ilustrações que dialogavam diretamente com a temática da luta pela terra, da agroecologia e da cultura popular. O público pôde ainda visitar a Feira de produtos sem agrotóxicos, organizada pelas famílias assentadas, e um espaço destinado à saúde, integrando cuidado, alimentação e bem-estar ao projeto de vida no campo.
Realizado no território conquistado pela luta popular, o Encontro das Amigas e Amigos do MST em Ribeirão Preto reafirmou que a reforma agrária é construída não apenas com terra, mas com educação, cultura, saúde, produção, organização coletiva e participação política permanente, projetando um futuro baseado na soberania alimentar, na justiça social e na preservação ambiental.