Deputados podem ser trocados a cada 4 anos; e os juízes do STF?

No artigo Danos: A Ruptura entre Funções Constitucionais e Práticas Políticas, publicado em 3 de dezembro pelo Poder360, o jornalista Janio de Freitas apresenta a tese verdadeiramente grotesca de que “o Supremo, ao adotar decisões com reflexos políticos diretos e contrários às forças conservadoras, abriu caminho à normalidade de reprovações pretendidas por Câmara e Senado”. Dito de outra forma, segundo Freitas, o Judiciário, ao supostamente combater “forças conservadoras”, teria salvado um regime que se pretenda democrático.

A ideia é absurda. O que caracteriza um regime como democrático não é a ausência de  “forças conservadoras”. Tampouco é papel do regime combater qualquer ideologia. O que define o caráter democrático do regime é o controle que a população tem sobre ele. Neste sentido, a ideia de um Supremo como garantidor da “democracia”, em vez do Congresso, é uma contradição em termos.

Essa ideia é, em primeiro lugar, um eufemismo. O que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem feito é usurpar as funções do Poder Legislativo e do Poder Judiciário. É uma interferência direita em outro poder, um ato típico de ditaduras. O caso é ainda mais antidemocrático porque o Judiciário é um poder não eleito, enquanto o Congresso, por mais viciadas que sejam as eleições, tem seus representantes escolhidos pelo povo. É a definição de ditadura: uma minoria, que não foi eleita por ninguém, atropela aquilo que foi decidido pela população.

Durante todo o texto, Freitas procura embelezar o papel reacionário do STF:

“A redemocratização se impôs à ditadura militar em um processo ao qual o Supremo esteve alheio. A tradição de concessões ao conservadorismo civil e militar resistiu com êxito nas primeiras décadas da volta ao regime de direito.”

Não é que o STF esteve alheio ao processo de “redemocratização”. A Corte foi o único dos poderes que não foi modificado durante a ditadura militar. O STF era parte do regime e, neste sentido, representa a sua continuidade. O autor, então, segue apontando o papel do STF como positivo:

“Decisões de imposição constitucional foram pontuais, mas em crescente frequência e vigor, inclusive com reprovação de posições assumidas pelo Congresso – em muitos casos, por omissão.”

O STF é a instituição mais conservadora do regime. Como apontamos, é um órgão que não é eleito por ninguém. É, ainda, um poder constituído por apenas onze pessoas — o que o torna facilmente corruptível. Durante dos 37 anos em que a Constituição Federal se encontra em vigor, o STF atuou em vários momentos para violar os direitos democráticos e sociais da população, garantindo os interesses do grande capital, mesmo nos momentos em que não havia um acordo entre os parlamentares.

Janio Freitas, então, segue, cinicamente, dizendo que:

“Um impulso transformador mais forte parece ter vindo com as anulações de sentenças e de processos inteiros da Lava Jato. Ao adotarem decisões com reflexos políticos diretos e contrários às forças conservadoras, as anulações abriram caminho à normalidade de reprovações ao pretendido por Câmara e Senado. Na ótica dos congressistas conservadores – portanto, da maioria – o Supremo criou uma confrontação com intenções legislativas.”

Ora, mas quem foi o responsável pela Operação Lava Jato? Quem foi o responsável pela prisão de Lula? O mesmíssimo STF. As anulações da Lava Jato foram uma mudança de rumo na política do próprio STF. Não é que o STF decidiu agir, romper com uma suposta neutralidade. O STF simplesmente acompanhou o movimento geral da burguesia, que foi obrigada a relaxar as condenações da Lava Jato por causa da crise causada no regime político. No entanto, o Supremo não recuou, em nada, nas invenções jurídicas da Lava Jato. Na verdade, aprofundou essas invenções, como visto no julgamento de Jair Bolsonaro (PL).

A rebeldia do Congresso ocorre porque justamente porque o STF continuou a Lava Jato por outros meios.

Em outra passagem, Freitas diz:

“O Supremo pode impor a correção constitucional aos desmandos legislativos e demais abusos da ilegalidade. É a proteção fundamental para uma democracia em construção.”

O problema da corte constitucional é: quem irá recorrer quando os onze togados decidirem que tal coisa não poderia ser aprovada pelo Congresso? Ninguém, pois não há como recorrer ao STF. No caso dos deputados, o povo pode, nas eleições seguintes, trocá-los. No caso dos ministros do STF, conforme agora decidido por Gilmar Mendes, o povo terá de aguentá-los até o resto da vida.

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