Nesta sexta-feira (5), o ministro da Fazenda do Brasil, Fernando Haddad, anunciou que os Estados Unidos (EUA) estão dispostos a formalizar uma proposta de parceria para o combate ao crime organizado. A declarou ocorreu após uma reunião entre Haddad e o encarregado de negócios dos EUA no Brasil, Gabriel Escobar.
A iniciativa teria surgido após um telefonema entre o presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, e o presidente dos EUA, Donald Trump, no qual Lula “ressaltou a urgência em reforçar a cooperação” no tema. Segundo informado pelo Palácio do Planalto na última quinta-feira (4), Lula teria feito um apelo direto para uma ação conjunta no combate ao crime organizado internacional, especialmente visando a prisão de líderes de facções que estariam em território norte-americano. A partir do telefonema, o governo brasileiro encaminhou uma carta formal aos EUA sobre o tema.
A reunião subsequente entre Haddad e Escobar foi solicitada pela própria embaixada norte-americana, o que o ministro interpretou como um sinal de “entusiasmo”. O brasileiro mencionou, inclusive, que Escobar teria recebido orientação direta de Trump para aprofundar o diálogo com o Brasil. Haddad destacou que a “provocação” brasileira foi avaliada pelos EUA como “muito viável”.
O principal ponto da cooperação proposta pelo Brasil é a integração e o compartilhamento de informações entre as principais agências de fiscalização e inteligência financeira dos dois países — isto é, a Polícia Federal (PF), a Receita Federal e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Brasil e suas respectivas contrapartes nos EUA. Trata-se de uma cooperação entre agências responsáveis por espionar e monitorar a população dos próprios países, conhecidas por protagonizar inúmeros casos de perseguição política. Nos Estados Unidos, há uma verdadeira indústria da espionagem, cuja agência mais famosa é a Agência Central de Inteligência (CIA, em inglês), responsável por crimes contra a humanidade, como a tortura, e golpes de Estado.
Para justificar a cooperação, Haddad alertou para uma “triangulação internacional gravíssima”, onde recursos ilícitos de facções estariam sendo canalizados para empresas no exterior, muitas vezes registradas nos Estados Unidos, funcionando como fachadas para lavagem de dinheiro. O anúncio do ministro ocorreu na esteira da operação deflagrada contra a refinaria privada Refit, onde a investigação da Receita apontou operações irregulares com empresas constituídas no estado americano de Delaware, conhecido por permitir a criação de entidades com anonimato.
Apesar dos pretextos apresentados por Haddad, o que é mais significativo é o fato de que o governo Trump tem utilizado o combate ao crime organizado e ao narcotráfico como uma ferramenta explícita de pressão contra o governo de Nicolás Maduro na Venezuela. Trump chegou a afirmar publicamente que qualquer país que trafique drogas para os EUA pode ser alvo de ataque, citando a Venezuela como um caso “muito ruim”.
Os EUA têm expandido sua presença militar no Caribe sob a alegação de combater o tráfico internacional. O governo Trump designou a Venezuela sob Maduro, e especificamente o suposto Cartel de los Soles (o “Cartel dos Sóis”, que seria liderado por altos oficiais militares venezuelanos e o próprio Maduro), como uma Organização Terrorista Estrangeira e um Terrorista Global Especialmente Designado. Essas designações não apenas tornaram crime o apoio a esse grupo, mas oferecem uma base legal para os EUA justificarem o uso de força militar na região, alegando estarem combatendo “terroristas” e não um Estado.
As autoridades norte-americanas acusam formalmente Maduro de narcoterrorismo, corrupção e tráfico de drogas, chegando a oferecer uma recompensa milionária por informações que levem à sua prisão. A Venezuela, por sua vez, nega veementemente as acusações e alega que o objetivo dos EUA é forçar uma mudança de regime e ter acesso aos recursos naturais do país.
Além do rastreamento financeiro, a cooperação entre Brasil e EUA visa a criação de um canal direto e célere para o rastreamento de peças de fuzis que saem dos EUA e supostamente acabam chegando nas mãos de facções criminosas no Brasil. Haddad ressaltou que as investigações apontam que remessas dos Estados Unidos, por vezes, chegam ao Brasil sem passar por procedimentos essenciais, como o escaneamento de contêineres nos portos. A proposta brasileira é que, ao identificar a chegada de um contêiner suspeito com componentes de fuzis, as autoridades norte-americanas sejam notificadas imediatamente. Uma proposta que praticamente passa a gestão dos portos brasileiros para mãos norte-americanas.
Em uma declaração verdadeiramente sinistra, Escobar apresentou exemplos de cooperação já em curso entre os EUA e o México. Esses acordos são mundialmente conhecidos por seu caráter colonial, que, entre outras medidas humilhantes. estabelecem a possibilidade de deportação de condenados mexicanos para os Estados Unidos. Diante de tal comparação, Haddad cinicamente defendeu que os termos da parceria com o Brasil sejam ajustados à realidade brasileira, considerada “muito diferente” do mexicano.
Infelizmente, não é o caso. A parceria “proposta” pelo governo brasileiro é um marco de sua capitulação diante do imperialismo norte-americano. Na medida em que o governo norte-americano, representando os grandes monopólios, se lança em uma ofensiva sobre os povos oprimidos, o governo brasileiro, enfraquecido internamente, se alinha aos genocidas, na ilusão de que receberá sua proteção.