O governo dos Estados Unidos divulgou, nesta sexta-feira (5), a estratégia de segurança nacional, documento que orientará a política externa e a atuação militar do segundo mandato de Donald Trump. A publicação marca uma mudança significativa de postura, em que Washington pretende reduzir seu papel global e concentrar esforços na América Latina, ao mesmo tempo em que transfere parte de suas responsabilidades internacionais a países aliados.
A estratégia prevê um “reajuste da presença militar global”, a fim de enfrentar ameaças consideradas urgentes no Hemisfério Ocidental. Isso inclui uma ampliação da mobilização no Caribe, onde forças norte-americanas já atuam em meio ao aumento das tensões com o governo de Nicolás Maduro, na Venezuela. O combate a cartéis de drogas latino-americanos, citado pela Casa Branca desde agosto, também foi formalizado.
O documento afirma de forma explícita que os EUA buscam reforçar sua influência política e militar na América Latina e limitar a presença de países não-ocidentais na região, especialmente da China, hoje um dos principais parceiros comerciais de diversos países latino-americanos, incluindo o Brasil. Segundo a Casa Branca, o novo direcionamento pode resultar em uma presença militar duradoura no hemisfério e em maior peso político sobre governos locais.
Doutrina Monroe
A Estratégia de Segurança Nacional declara a intenção de “reafirmar e aplicar a Doutrina Monroe” para restaurar a predominância dos EUA no Hemisfério Ocidental. Formulada no século 19, a doutrina estabelece que qualquer tentativa de potências externas de influenciar a região será considerada ameaça direta à segurança norte-americana.
“Negaremos a competidores de fora do Hemisfério a capacidade de posicionar forças ou outras capacidades ameaçadoras, ou de possuir ou controlar ativos de importância estratégica em nosso Hemisfério”, afirma o texto.
Três eixos para o realinhamento militar
O realinhamento estratégico na América Latina será guiado por três pilares: fortalecimento da presença da Guarda Costeira e da Marinha para controlar rotas marítimas, conter a migração ilegal, combater o tráfico de pessoas e drogas e assegurar vias de trânsito em situações de crise; ações direcionadas contra cartéis de drogas, inclusive com possível uso de força letal, em substituição à estratégia centrada apenas na aplicação da lei vigente nas últimas décadas; e ampliação de acesso a áreas estratégicas, mediante instalação ou expansão de infraestrutura militar.
Além da América Latina, o plano cita preocupações com Taiwan e acusa a Europa de dificultar avanços diplomáticos na guerra da Ucrânia. O governo Trump promete “grande foco” no Indo-Pacífico, destacando a importância estratégica da região, especialmente devido ao papel de Taiwan como líder na produção global de chips de inteligência artificial. Japão e Coreia do Sul serão pressionados a ampliar gastos militares e assumir mais responsabilidades na própria segurança.
A Casa Branca defende que os EUA devem garantir a “paz por meio da força”, evitando conflitos, mas mantendo investimentos robustos em defesa, entre eles, a construção do chamado “Golden Dome”, sistema considerado essencial para a próxima geração de defesa antimísseis. O documento também relaciona a manutenção da maior economia do mundo à superioridade militar norte-americana.
Críticas à Europa
A nova estratégia dedica amplo espaço ao tema migratório. O governo Trump pretende “acabar com as imigrações em massa” e colocar o controle de fronteiras como elemento central da segurança nacional. O texto critica a política migratória europeia da última década e afirma que Washington apoiará forças políticas que se opõem às diretrizes da União Europeia nesse campo.
Quanto à Europa, o documento fala em “promover a grandeza europeia”, mas também chama de “não realistas” as expectativas do continente em relação à guerra na Ucrânia. Mesmo assim, os EUA se comprometem a continuar apoiando aliados europeus “para preservar sua defesa e liberdade”.
A estratégia enfatiza a necessidade de redistribuir encargos militares entre aliados. No leste asiático, Washington cobra maiores investimentos de Japão e Coreia do Sul. Já no Oriente Médio, após bombardear instalações nucleares do Irã e mediar um acordo de paz na Faixa de Gaza, os EUA consideram possível reduzir seu envolvimento direto e transferir parte da segurança regional a parceiros locais engajados no combate ao radicalismo.
A publicação desta sexta-feira marca o primeiro grande documento de orientação estratégica do segundo governo Trump e indica uma reconfiguração substancial das prioridades externas dos Estados Unidos, com impacto direto sobre a dinâmica política e militar no Hemisfério Ocidental.
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