Por Fernanda Giannasi*

Depois de sete anos de espera, vislumbra-se uma luz no fim do túnel.

Em 14 de agosto, o Supremo Tribunal Federal (STF) retomará o julgamento da lei 20.514/2019, de Goiás, que permite a exploração do amianto para fins de ‘’exportação’’.

A nossa expectativa é que o STF ponha um fim definitivo à mineração do mineral cancerígeno no Brasil.

Até porque, agora, os ministros da Corte têm um caminhão com 47 toneladas de amianto no meio do caminho.

— Mas o amianto já não foi banido em 2017?! – algum leitor talvez questione.

Em 29 de novembro de 2017, numa decisão histórica, o STF aprovou o banimento do amianto crisotila, ou amianto branco, em todo o País.

Desde então, extração, fabricação, comércio e uso de produtos e equipamentos contendo amianto estão explicitamente proibidos no Brasil.

Porém, em flagrante afronta e desrespeito à decisão da Suprema Corte, a Assembleia Legislativa do Estado de Goiás aprovou e o governador Ronaldo Caiado promulgou, em 16 de julho de 2019, a Lei nº 20.514.

Essa lei permite à Sama Minerações, subsidiária do grupo Eternit, continuar explorando o amianto crisotila na mina de Cana Brava, em Minaçu, para fins de exportação. É a única mina ainda em atividade nas Américas.

— Como?! O amianto não está banido?! – algum leitor, perplexo, pode insistir.

Banido está. Mas a lei goiana valeu-se deste artifício (o negrito é meu): ‘’autoriza, para fins exclusivos de exportação, a extração e o beneficiamento do amianto da variedade crisotila no Estado.’’

Dizer que é para ‘’fins exclusivos de exportação’’ é um eufemismo para esconder toda a cadeia produtiva do amianto:

  • Extração
  • Beneficiamento
  • Embalagem
  • Armazenamento
  • Destinação de resíduos
  • Transporte por rodovias
  • Novo armazenamento em recintos de exportação nos portos brasileiros, onde as embalagens paletizadas são movimentadas por empilhadeiras
  • Colocação em containers e embarque em navios

O principal destino são os portos de países da Ásia, os maiores importadores do amianto brasileiro.

Portanto, o amianto extraído em Minaçu, Goiás, pela Sama/Eternit não vai direto para os portos de exportação, como num passe de mágica.

Para chegar aos portos, os caminhões com cargas de amianto têm que trafegar por várias rodovias e atravessar estados que proíbem expressamente o mineral cancerígeno, como Minas Gerais e São Paulo.

Nesse percurso, há inúmeros acidentes registrados nas rodovias.

Depois, nos portos, frequentemente a movimentação da carga por empilhadeiras danificam embalagens peletizadas de amianto.

Resultado: o cancerígeno amianto espalhado pelo ambiente sem qualquer proteção.

É o que aconteceu no último sábado, 6 de julho, com um caminhão transportando 47 toneladas de amianto tombou no Km 253 da Rodovia PR-092, no município de Wenceslau Braz, no Paraná.

O site publicou no domingo, 7 de julho.

Um acidente do tipo capotamento, ocorrido por volta das 12 horas, deste sábado no Km 253 da PR-092, no município de Wenceslau Braz. Segundo relatório da PRE [Polícia Rodoviária Estadual], o condutor do caminhão DAF com placas de Goiânia, seguia pela referida rodovia sentido W. Braz ao entroncamento da PR-422 quando veio a capotar.

Acionadas as equipes de apoio, o motorista de 44 anos, com ferimentos médios, foi encaminhado ao hospital São Sebastião de Wenceslau Braz.

O veículo estava acoplado a dois semirreboques, carregados com 47 toneladas de amianto branco.

LEI GOIANA AFRONTA OS DIREITOS FUNDAMENTAIS À SAÚDE

Em 19 de julho de 2019, imediatamente após a sanção da lei goiana, a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) ajuizou no STF uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 6200), para pedir a sua revogação.

A ADI 6200 versa sobre a decretação da ilegalidade da lei e o estabelecimento de um prazo para o fechamento da mineradora em pleno bioma do cerrado no planalto central.

Para a ANPT, a lei goiana afronta os direitos fundamentais à saúde. É direito de todo cidadão e dever do Estado dar proteção em face dos riscos laborais e de promover o meio ambiente adequado, previstos na Constituição da República.

Em 9 de junho de 2023, o STF começou a julgá-la.

O início do julgamento se deu em Plenário Virtual.

Na ocasião, o relator, ministro Alexandre de Moraes, votou pela inconstitucionalidade da Lei nº 20.514, mas somente após 12 meses da publicação da ata de julgamento.

A então presidente do STF, ministra Rosa Weber também votou pela inconstitucionalidade da lei goiana, mas divergiu em relação ao prazo de um ano.

Por fim, o ministro Gilmar Mendes pediu vista dos autos e, com isso, atrasou o julgamento, só agora remarcado para ter sua continuidade. Será em plenário presencial com veiculação ao vivo pela TV Justiça.

A Abrea-Associação Brasileira dos Expostos mais uma vez demanda que se declare a ilegalidade da lei o quanto antes.

Afinal, a lei 20.514/2019, mais conhecida como lei goiana, permite o criminoso comércio de uma matéria-prima inequivocamente nociva aos seres humanos.

A Abrea demanda também que nenhum prazo adicional seja dado para a continuidade da exploração do amianto, proibindo-o não somente para proteger a população brasileira como a de todo o planeta.

Esperamos que nenhuma chicana a mais ocorra em 14 de agosto – como pedido de vista, falta de quórum qualificado, declarações de impedimentos injustificados – e, com isso, adie novamente esta decisão tão esperada e necessária.

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Última Atualização: 12/07/2024