O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pode ficar fora da disputa eleitoral pelos próximos 35 anos. A condenação de Jair Bolsonaro (PL) pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quinta-feira (11), não apenas marca um divisor de águas na trajetória pessoal do ex-presidente, mas também redesenha o futuro político da direita no Brasil. Ao ser sentenciado a 27 anos e três meses de prisão por crimes relacionados à tentativa de golpe de Estado, Bolsonaro carrega agora uma inelegibilidade que, pela regra atual da Lei da Ficha Limpa, se estenderá até 2060.
Mais do que a pena de prisão, o impacto político é profundo. A decisão judicial retira de cena o líder que estruturou, desde 2018, um campo conservador mobilizado em torno de sua figura e de seu estilo de confronto com as instituições.
Da condenação à inelegibilidade
Pela Lei da Ficha Limpa, a inelegibilidade de oito anos começa a contar somente após o cumprimento da pena, acrescentando oito anos ao período. Dessa forma, Bolsonaro, hoje com 70 anos, estaria impedido de disputar eleições até 2060, quando teria 105 anos de idade — uma impossibilidade prática.
Isso se soma à inelegibilidade já imposta pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), válida até 2030, pela reunião com embaixadores em que atacou o sistema eletrônico de votação. Agora, os obstáculos jurídicos não apenas se acumulam, mas se tornam praticamente intransponíveis.
A disputa sobre a Lei da Ficha Limpa
Há, porém, variáveis em aberto. Na semana passada, o Senado aprovou o PLP 192/2023, que altera o marco da inelegibilidade. Pela nova regra, o prazo de oito anos passaria a contar a partir da data da condenação em colegiado, e não mais após o cumprimento da pena. Caso Lula sancione a nova lei, Bolsonaro poderia voltar a ter direitos políticos em 2033, com 78 anos.
Essa alteração, embora geral e aplicável a todos os casos, é lida nos bastidores como uma forma de reabrir a porta do jogo para o ex-presidente. O Planalto, no entanto, avalia o desgaste político de sancionar uma medida que beneficiaria diretamente seu principal adversário.
O discurso da anistia
Apesar da possibilidade de mudança na lei, aliados do ex-presidente já falam em buscar uma saída política mais direta: uma anistia aprovada pelo Congresso. Deputados da base bolsonarista devem iniciar, na próxima semana, articulações para pressionar o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), a pautar uma proposta de perdão coletivo aos envolvidos na trama golpista.
Essa seria a única via capaz de reabilitar o ex-presidente mais rapidamente. O problema é o custo político: anistiar um condenado por tentativa de golpe de Estado significaria tensionar ainda mais a relação com o STF e aprofundar a percepção de impunidade em casos de ataque à democracia.
Se o Congresso aprovar uma anistia ampla para os envolvidos na trama golpista — e essa lei abranger Jair Bolsonaro — os efeitos da condenação no STF (27 anos e 3 meses de prisão, com inelegibilidade até 2060) desapareceriam imediatamente.
Nesse cenário, Bolsonaro ficaria apenas com a condenação já existente no TSE (inelegibilidade até 2030). Ou seja, ele poderia disputar eleições novamente a partir de 2030 (quando completará 75 anos).
Em resumo: a anistia funciona como um “atalho jurídico”, apagando os efeitos da pena criminal, mas não teria impacto sobre a condenação eleitoral do TSE — a menos que o Congresso também aprovasse uma anistia eleitoral específica, algo ainda mais improvável juridicamente.
A direita sem Bolsonaro
Com Bolsonaro afastado do horizonte eleitoral, o bolsonarismo enfrenta um dilema: como manter sua força política sem o líder centralizador. A eventual ascensão de figuras como Tarcísio de Freitas (Republicanos), Michelle Bolsonaro ou até outsiders que busquem herdar a base conservadora dependerá de como o campo da direita se reorganizará nos próximos anos.
O vácuo deixado pelo ex-presidente pode abrir espaço para disputas internas e fragmentação, mas também para uma tentativa de renovação da pauta conservadora em moldes menos personalistas.
Com duas inelegibilidades acumuladas, Bolsonaro vive seu momento de maior fragilidade política desde 2018. Entre depender de uma eventual mudança na Lei da Ficha Limpa ou de uma anistia no Congresso, o ex-presidente fica à mercê de decisões institucionais que podem consolidar ou encurtar seu afastamento da arena eleitoral.
A inelegibilidade até 2060 não apenas encerra, na prática, as ambições eleitorais de Jair Bolsonaro: ela também obriga a direita brasileira a se repensar. Entre a aposta em mudanças legislativas, o risco de desgaste com uma eventual anistia e a busca por novas lideranças, o campo conservador entra em um período de transição turbulento.
Seja qual for o desfecho, o episódio confirma que os efeitos da tentativa de golpe de 2022 continuarão reverberando por muito tempo na política nacional.