
Em 2008, o governo Lula lançou o Programa de Apoio ao Desenvolvimento do Complexo Industrial da Saúde, uma política pública inovadora que articulou compras públicas, transferência de tecnologia e parcerias entre laboratórios públicos e empresas privadas. Regulamentado em 2012, no governo Dilma Rousseff, o programa se tornou a mais bem-sucedida experiência de política industrial do Brasil pós-redemocratização.
Inspirado nesse modelo, propõe-se agora um novo passo estratégico: a criação de um Programa de Desenvolvimento Produtivo da Educação (PDP-Educação). A ideia é simples e poderosa: usar o poder de compra do Estado para induzir inovação, fortalecer a indústria nacional e, ao mesmo tempo, melhorar a qualidade da educação pública.
O tripé do PDP aplicado à educação
Assim como na saúde, o PDP-Educação se apoiaria em três pilares:
- Compras públicas estratégicas: o Estado direciona sua demanda para produtos e serviços educacionais de alto impacto, como kits de ciência, plataformas digitais, laboratórios móveis e infraestrutura sustentável para escolas públicas.
- Transferência e desenvolvimento tecnológico: empresas nacionais, em parceria com universidades e centros de pesquisa, desenvolvem soluções educacionais adaptadas à realidade brasileira, com foco em acessibilidade, inclusão e inovação.
- Parcerias público-privadas: laboratórios públicos, startups de edtech e empresas privadas trabalham juntas para atender ao mercado educacional, com apoio de políticas de fomento e garantias de mercado inicial.
Educação como vetor de desenvolvimento
O setor educacional representa uma oportunidade única de unir inclusão social e desenvolvimento econômico. O Brasil já conta com um ecossistema de edtechs em expansão, além de uma tradição pedagógica reconhecida internacionalmente, com nomes como Paulo Freire, Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro.
Além disso, a educação responde por uma parcela significativa das compras públicas e pode ser um motor de geração de empregos qualificados, especialmente nas áreas de tecnologia, design instrucional, engenharia e produção de conteúdo digital.
Produtos com potencial de exportação
O PDP-Educação também pode posicionar o Brasil como exportador de soluções educacionais para o Sul Global. Entre os produtos com alto potencial estão:
- Tablets e softwares educacionais em português e espanhol.
- Kits de robótica e ciência de baixo custo.
- Plataformas digitais bilíngues para ensino a distância.
- Equipamentos off-grid para escolas rurais.
- Conteúdos culturais digitais baseados na pedagogia brasileira.
Fontes de financiamento e apoio
O programa pode articular diversas fontes de fomento já existentes:
- BNDES Educação e Inovação: crédito para empresas desenvolverem produtos educacionais.
- FINEP e CNPq: subvenção para pesquisa e desenvolvimento.
- Fundos regionais (FNE, FNO, FCO): apoio a projetos em regiões menos desenvolvidas.
- Organismos multilaterais: como BID, Banco Mundial e NDB (BRICS Bank), com foco em inclusão digital.
- PDDE: compras diretas pelas escolas, com apoio técnico de organizações como o CIEB.
Conclusão: as indústrias do bem-estar
A proposta do PDP-Educação se insere em uma visão mais ampla de desenvolvimento: a das indústrias do bem-estar. São setores que, ao mesmo tempo, atendem às necessidades sociais da população e geram inovação, empregos e capacidade exportadora.
Se não tivesse havido a interrupção do processo democrático em 2016, essa visão já poderia estar consolidada. Mas ainda é tempo de retomá-la. A educação pode — e deve — ser tratada como política industrial, social e estratégica. O Brasil tem o conhecimento, a demanda e o talento. Falta apenas a decisão política de transformar essa visão em realidade.
E – importante – subordinar toda essa política a modelos pedagógicos consistentes.
Leia também: