O jornal britânico Financial Times trouxe nesta segunda-feira (8) uma reportagem sobre o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF), classificando-o como um processo que “dividiu o Brasil” e colocou a maior democracia da América Latina no centro de uma crise geopolítica com os Estados Unidos.

Conforme resume o jornal, Bolsonaro, de 70 anos, responde por acusações de conspiração golpista, supervisão de plano para assassinar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu vice Geraldo Alckmin e o ministro Alexandre de Moraes, além de incitar a invasão das sedes dos Três Poderes em Brasília, em 8 de janeiro de 2023. Ele pode pegar mais de 40 anos de prisão se condenado.

O plano, segundo a acusação, só fracassou porque os comandantes do Exército e da Aeronáutica se recusaram a apoiá-lo. Uma mensagem de texto encontrada no celular de um assessor mostra que Bolsonaro estava ciente da conspiração.

Bolsonaro, de 70 anos, está em prisão domiciliar em Brasília, sob restrições severas de comunicação.

Pressão dos poderosos

Segundo o jornal britânico, setores influentes da política e da economia brasileira trabalham nos bastidores para articular uma anistia que livre Bolsonaro e seus aliados de uma condenação. A manobra, impulsionada sobretudo pelo Centrão e por líderes conservadores, com o objetivo de aliviar seu ônus judicial e preservar seu legado político. Esse movimento, segundo o jornal britânico, reflete preocupações com o risco de o processo no Supremo Tribunal Federal transformar Bolsonaro em um mártir no imaginário público.

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, citado como favorito de Bolsonaro para sucedê-lo, já atua em Brasília para viabilizar um projeto de lei de perdão. Analistas ouvidos pelo FT afirmam que o Congresso poderia aprovar uma versão diluída, reduzindo penas de insurgentes, mas dificilmente avançaria com uma anistia plena ao ex-presidente antes das eleições. O objetivo seria postergar o veredito ou neutralizar suas consequências através de um indulto ou anistia ampla. A urgência é ainda mais evidente diante do cenário eleitoral para 2026.

Lula, que cumpre seu terceiro mandato presidencial, rejeita veementemente a ideia: “Não podemos retroceder. O Brasil não pode virar um país onde se tenta derrubar a democracia e depois se perdoar.”

Crise diplomática com Trump

O julgamento elevou as tensões com Washington. O presidente Donald Trump, aliado de Bolsonaro, impôs tarifas de 50% sobre produtos brasileiros e sancionou ministros do STF, em especial Alexandre de Moraes, classificado como alvo político.

O Departamento do Tesouro dos EUA (OFAC) chegou a notificar cinco dos maiores bancos brasileiros — entre eles o Banco do Brasil , responsável pela folha de pagamento do STF — exigindo informações sobre o cumprimento das avaliações. O STF, por sua vez, já decidiu que as avaliações não valem no Brasil sem autorização judicial local , colocando os bancos em um dilema entre obedecer aos EUA ou ao Judiciário brasileiro .

Lula, por sua vez, rejeitou a “pressão inaceitável” dos EUA e buscou apoio junto ao bloco Brics, apresentando-se como defensor da soberania nacional.

Divisão no Brasil

Pesquisas citadas pelo FT indicam que a sociedade segue polarizada: uma parte vê o julgamento como necessário para proteger a democracia, outra o enxerga como “perseguição política”. A AtlasIntel mostra que, se fosse possível disputar 2026, Bolsonaro e Lula estariam tecnicamente empatados, com cerca de 48% cada.

Para analistas, o veredito dificilmente encerrará a crise: “Quem acha que a prisão de Bolsonaro é justa continuará achando. Quem vê farsa, continuará vendo farsa. O julgamento apenas definirá o peso político dele como fiador de candidaturas da direita”, avaliou Lucas de Aragão, da Arko Advice.

O jornal ainda relata que, neste último domingo, Dia da Independência, o Brasil foi palco de protestos rivais: Em São Paulo, apoiadores de Bolsonaro marcharam com bandeiras dos EUA e faixas: “SOS Trump”. Em outras capitais, os manifestantes contra Bolsonaro gritavam “Soberania!” e “Não à ingerência externa!”

O Brasil, hoje, está diante de uma encruzilhada: entre a defesa da democracia e o risco de um novo ciclo de impunidade. O veredito do STF pode ser o início — e não o fim — da batalha. “O Brasil não pode esquecer o que aconteceu em 8 de janeiro. Mas também não pode ignorar que milhões ainda veem Bolsonaro como um herói”, diz o texto.

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Last Update: 08/09/2025