Postos de Gasolina Estão Cavando a Própria Cova

por Henrique Alvarez

Caso você use carros por aplicativo, já deve ter andado em um carro elétrico, provavelmente da BYD. Se conversou com o motorista sobre o veículo, deve ter notado o entusiasmo dele com a novidade e com a economia que está fazendo. Relatos como esse estão se tornando comuns nas redes sociais. À primeira vista, podem parecer apenas evidências anedóticas, mas os dados confirmam essa tendência.

A chinesa BYD, que recentemente inaugurou sua fábrica em Camaçari (BA), tornou-se a quarta marca mais vendida no varejo brasileiro de automóveis. Em maio, superou marcas já consagradas em nosso mercado, como Renault, Toyota e Honda, ficando atrás apenas de Fiat, Volkswagen e GM. Já detém 9,7% de participação no mercado e deve ultrapassar, em breve, a GM, que tem 10,5%. Todos os carros vendidos pela empresa são elétricos ou híbridos.

E isso é apenas de uma marca. Outras empresas, como GWM, Renault, JAC, entre outras, também estão vendendo seus modelos elétricos e híbridos no Brasil. Segundo estudo da consultoria Strategy&, da PwC Brasil, até 2030 deve haver redução de 12% na demanda por gasolina e de 10% por diesel em comparação com a demanda atual. Para 2040, a queda pode chegar a 59% e 66%, respectivamente. Vale lembrar que o estudo foi divulgado em 2023 e a expansão das vendas de carros elétricos e híbridos vem superando as expectativas ano após ano, sobretudo com a chegada de modelos de custo mais acessível.

Mas essa expansão ocorreria se o preço da gasolina estivesse mais baixo? Comprar um veículo de tecnologia nova sempre representa risco: perda de valor, falhas descobertas ao longo do tempo ou a chegada de tecnologias mais modernas que os tornem obsoletos rapidamente. Ainda assim, o custo menor para rodar com eletricidade tem sido suficiente para convencer os compradores a assumirem esse risco.

Esse cenário pode ser ruim para a Petrobras e outras empresas da cadeia do petróleo no país, mas elas ainda possuem vantagens para garantir sua sobrevivência. Primeiro, a indústria do petróleo não depende apenas da produção de gasolina e diesel, embora esses combustíveis sejam fundamentais. Além disso, em países com matriz energética pouco sustentável, o aumento do consumo de eletricidade para veículos pode até elevar o consumo de petróleo para geração de energia. Por fim, essas empresas possuem capital suficiente para diversificar seus negócios durante a transição.

O mesmo não se pode dizer dos postos de gasolina, que vêm sendo lentamente substituídos por centros comerciais ou mesmo pela recarga residencial, à medida que cresce a frota de elétricos. O longo tempo de recarga faz com que esse serviço não seja tão lucrativo para os postos, mesmo que instalem totens de abastecimento.

Apesar disso, os postos brasileiros não parecem preocupados com a concorrência. Eles mesmos, ao não repassarem a redução dos preços dos combustíveis nas refinarias para o consumidor, ampliando sua margem de lucro, estimulam o mercado de carros elétricos e híbridos e aceleram a transição.

Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), entre 2021 e 2025, os postos aumentaram sua margem de lucro em 97% sobre a gasolina e em 89% sobre o diesel, enquanto a inflação acumulada no período foi de 31%. Em junho deste ano, após a redução de 5,6% no preço da gasolina nas refinarias, o preço médio ao consumidor caiu apenas 0,78%.

Se a grande vantagem dos carros elétricos é a economia com combustível, os postos de gasolina têm dado sua contribuição para acelerar essa transição tecnológica. O Brasil possui uma tradição de priorizar carros compactos e populares, fator que ajuda a explicar o sucesso da BYD no país, mas atribuir apenas a isso o crescimento acelerado das vendas de elétricos não basta. O alto custo do combustível no Brasil, em comparação a outros países, certamente tem sido determinante.

Os postos não são os únicos responsáveis pelo preço elevado da gasolina, mas certamente serão os mais afetados. No entanto, parecem não demonstrar grande preocupação com esse problema iminente. Talvez acreditem que o governo irá socorrê-los quando começarem a quebrar.

Henrique Fernandes Alvarez Vilas Porto é doutor em Políticas Públicas, Estratégia e Desenvolvimento (UFRJ), mestre em Estudos Estratégicos da Defesa e da Segurança (UFF) e graduado em História (UFF).

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Last Update: 28/08/2025