Célia Soares de Brito
Célia Soares de Brito

Por Ana Oliveira e Felipe Borges

Uma mulher que se apresentava como desembargadora, juíza, promotora, advogada e até chefe da Interpol foi presa em Mossoró (RN) na última quarta-feira (20). Célia Soares de Brito, de 46 anos, utilizava documentos adulterados e chegou a se autoproclamar “guardiã da democracia”. O episódio expôs mais um desdobramento do universo bolsonarista que, desde a derrota de Jair Bolsonaro (PL) em 2022, deu vazão a personagens e narrativas cada vez mais delirantes.

Segundo a Polícia Rodoviária Federal (PRF), a prisão ocorreu depois que um motorista de aplicativo desconfiou da história contada por Célia e decidiu levá-la a um posto policial. Ela estaria na cidade potiguar para tomar posse em um suposto cargo na prefeitura, mas carregava bagagens incompatíveis com uma estadia curta e apresentava versões desencontradas.

No local, a mulher exibiu um “certificado de posse” como desembargadora e uma carteira da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que levantou suspeitas imediatas: não havia chip de segurança, o nome dos pais não coincidia com o de sua identidade e o número de registro, após consulta, pertencia a um advogado do Paraná. A Polícia Civil confirmou o uso de documento falso, apreendeu seu celular e a conduziu à delegacia. No carro, estavam também sua mãe e filha, ambas liberadas após depoimento.

Célia passou por audiência de custódia no dia seguinte e obteve liberdade provisória mediante o pagamento de fiança de dois salários mínimos.

Das barracas ao “cargo de desembargadora”

A trajetória da falsa advogada não começou em Mossoró. Em dezembro de 2022, logo após o resultado das eleições presidenciais, ela integrou o acampamento bolsonarista montado em frente ao Tiro de Guerra de Juazeiro do Norte (CE). Vestida de verde e amarelo e empunhando a bandeira nacional, Célia gravava vídeos para o YouTube em que se apresentava como representante do “povo brasileiro”.

“Dra. Célia Soares. Estou aqui representando meu povo brasileiro. Lutei pela minha cidade e hoje estou lutando pelo meu país”, declarou em um vídeo publicado em 3 de dezembro de 2022. Em meio às tendas, faixas pediam “SOS Exército Brasileiro” e clamavam para que o país fosse “livre do comunismo”.

Assim como em diversas cidades, o acampamento de Juazeiro do Norte reproduzia a lógica dos protestos golpistas que se espalharam pelo país após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Durante 59 dias, os manifestantes permaneceram diante do quartel, chegando até a organizar churrascos no local. O grupo só se dispersou em 31 de dezembro de 2022.

O ápice da mobilização ocorreu no dia 8 de janeiro de 2023, quando milhares de apoiadores de Bolsonaro invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes, em Brasília.

8 de Janeiro e suas consequências

A tentativa de golpe deixou marcas profundas. Vidraças quebradas, obras de arte vandalizadas, móveis destruídos e gabinetes devastados simbolizaram o ataque ao patrimônio público e à democracia.

Até 12 de agosto deste ano, o Supremo Tribunal Federal contabilizava 1.628 ações penais abertas contra envolvidos. 141 pessoas permaneciam presas, enquanto 44 estavam em regime domiciliar. No total, 638 condenações já haviam sido proferidas — 279 por crimes graves e 359 por infrações menores.

Além disso, 552 acordos de não persecução penal foram firmados, resultando em quase R$ 3 milhões em indenizações e medidas reparatórias.

Quem é Célia Soares

Em 2020, Célia Soares de Brito chegou a disputar uma vaga na Câmara Municipal de Juazeiro do Norte pelo Partido Verde. Obteve apenas 19 votos. Na época, declarou à Justiça Eleitoral que era empresária e tinha ensino superior incompleto.

Três anos depois, reapareceu nos acampamentos bolsonaristas e, agora, envolvida em um episódio de falsificação que mistura delírio de grandeza e oportunismo político. A “guardiã da democracia”, como ela própria se intitulava, acabou flagrada justamente por atentar contra a lei.

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Last Update: 25/08/2025