O governo norte-americano aceitou o pedido de consultas apresentado pelo Brasil na Organização Mundial do Comércio (OMC), em resposta ao tarifaço imposto por Donald Trump a exportações brasileiras. O gesto foi recebido como sinal de abertura ao diálogo, ainda que autoridades brasileiras considerem a negociação difícil e vejam a medida como um passo burocrático previsto nas regras do organismo internacional.
Segundo a carta enviada a Genebra, Washington concordou em conversar, mas reiterou que a sobretaxa de até 50% sobre produtos brasileiros é “necessária” para enfrentar um cenário de emergência nacional ligado a déficits comerciais persistentes.
Argumentos do Brasil contra o tarifaço
O Itamaraty sustenta que as medidas adotadas por Trump violam compromissos assumidos pelos EUA na OMC. Em ofício protocolado na entidade, o governo brasileiro argumenta que Washington discriminou o Brasil ao isentar outros parceiros comerciais das tarifas adicionais, ferindo o princípio de não-discriminação.
Além disso, o Brasil aponta que a sobretaxa aplicada extrapola os limites tarifários previstos em acordos multilaterais e que, caso os EUA tivessem reclamações contra práticas brasileiras, deveriam ter recorrido ao mecanismo de solução de controvérsias da OMC, e não adotar medidas unilaterais.
Consultas e próximos passos
A aceitação americana abre espaço para reuniões bilaterais entre Brasil e EUA em Genebra, sem prazo definido para conclusão. Caso as consultas não resolvam o impasse em até 60 dias, o Brasil poderá solicitar a formação de um painel arbitral, primeira etapa de julgamento no âmbito da OMC.
Esse processo, porém, costuma se arrastar. Em média, dura cerca de 18 meses e pode chegar a cinco anos em casos mais complexos. Além disso, a última instância da entidade — o Órgão de Apelação — está paralisada desde 2019, justamente por bloqueio dos próprios EUA, o que limita as chances de uma resolução definitiva.
Segurança nacional como escudo
Na resposta enviada à OMC, os EUA insistiram que as tarifas contra o Brasil se enquadram em temas de “segurança nacional”, tese historicamente usada por Washington para blindar medidas de política comercial de revisões jurídicas internacionais.
“Todos os membros da OMC retêm a autoridade para determinar por eles mesmos quais medidas consideram necessárias para proteger seus interesses essenciais de segurança”, afirmou a missão norte-americana.
Ainda assim, a carta conclui afirmando que Washington “está pronto para discutir com as autoridades brasileiras em data mutuamente conveniente”.
Perspectivas
Para diplomatas brasileiros, a abertura de consultas já representa um avanço, já que os canais bilaterais estavam bloqueados. Um técnico que acompanha o tema avalia que o gesto pode ser apenas uma tentativa de ganhar tempo por parte dos EUA, mas não descarta que o diálogo seja oportunidade para reduzir o impacto das sobretaxas.
Seja pela via política ou jurídica, a disputa marca mais um capítulo da tensão comercial entre Brasil e Estados Unidos e coloca a OMC como palco de uma negociação delicada em que os dois países buscam preservar interesses estratégicos.