Representantes do governo federal e da Coalização Negra por Direitos afirmaram, de forma consensual, durante audiência pública realizada nesta terça-feira (19/8) na Câmara, que a COP 30 – 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, a ser realizada em Belém (PA) – será uma grande oportunidade de o mundo combater os efeitos das mudanças climáticas e o racismo ambiental. O debate ocorreu na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara, promovido e presidido pelo deputado Nilto Tatto (PT-SP). Todos os palestrantes reconheceram que os eventos climáticos severos observados com frequência crescente no planeta afetam, de forma mais intensa, as populações socialmente vulneráveis.
“Essa expressão, o racismo ambiental, se dá na prática quando vemos em uma favela alguém morando na beira de um córrego, e que ainda é criminalizado porque mora ali ou porque está em uma área de preservação permanente. Esses sofrem injustiça pelo fato de o poder público não ter dado as condições para eles terem uma moradia adequada, num lugar decente e sem risco. Vivem muitas vezes sem saneamento básico, sem água potável, sem iluminação e sem os serviços e equipamentos públicos que poderiam lhe garantir uma melhor qualidade de vida. Assim como as populações do campo, indígenas e quilombolas, são as maiores vítimas das consequências da crise climática”, ressaltou o deputado na abertura da reunião.
O parlamentar destacou ainda que esse cenário tem que ser considerado pelos líderes mundiais que vão participar da COP 30.
COP 30
Representando o presidente da Conferência, o embaixador André Côrrea do Lago, a diretora de Programas da Presidência da COP30, Alice Amorim, destacou que, entre as seis cartas de Côrrea Lago com diretrizes a serem debatidas na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas, uma trata especificamente de políticas voltadas à justiça climática.
“É importante reconhecer que, nesse processo, e como isso está interagindo o governo, a gente tem trabalhado na presidência da COP30 para que a justiça climática não seja apenas um termo, mas sim a forma de agir”, afirmou.
Segundo Alice Amorim, após várias edições da COP voltadas à formulação de mecanismos contra as mudanças climáticas, a Conferência de Belém marcará a fase de implementação efetiva de propostas.
“Neste momento, a gente já alcançou quase todos os consensos necessários para agir. A pergunta é: em que medida esse processo aterrissa nos territórios e será incorporado nas políticas públicas não apenas voltadas ao meio ambiente, mas naquelas essenciais para construção de modelos de desenvolvimento incorporando a justiça climática e o combate ao racismo ambiental?”, indagou.
Ações do governo
Representantes do governo federal ressaltaram que a justiça climática e combate ao racismo ambiental já fazem parte da agenda muito antes da realização da COP30.
Augusto Araújo Santos, do Ministério da Igualdade Racial, lembrou que a pauta afeta principalmente a população negra, quilombola, povos tradicionais de matriz africana e comunidades de terreiro. Ele destacou ainda que o ministério já desenvolve diversas ações nesse sentido. Entre elas, o edital do programa Mãe Beata de Yemanjá, que vai selecionar e premiar 54 lideranças de povos e comunidades de terreiro por iniciativas ambientais bem-sucedidas. Outra ação é o projeto Juventude de Terreiro, que promove debates entre jovens sobre o racismo ambiental e iniciativas de educação voltadas à mitigação das injustiças climáticas.
Economia Verde
A coordenadora-geral de Estrutura e Sustentabilidade do Ministério da Fazenda, Júlia Mascarello, explicou que, pela primeira vez em sua história, o Brasil possui programas governamentais voltados à promoção de uma economia de baixo carbono, como o Plano de Transformação Ecológica.
“O objetivo desse Plano é basicamente promover o emprego e produtividade, a sustentabilidade ambiental e a justiça social. A ideia é mudar nosso paradigma de desenvolvimento tornando-o compatível com a proteção ambiental, que envolva toda a sociedade, não deixando ninguém para trás – especialmente as populações mais vulnerabilizadas”, argumentou.
Ela citou projeções que indicam que, com o Plano, o Brasil pode elevar seu PIB em 0,8% ao ano até 2035; aumentar a renda per capita em até 4% até 2025, gerar 2 milhões de novos empregos em diversos setores da economia e reduzir significativamente a emissão de gases de efeito estufa.
O Ministério da Fazenda também lançou o Plano Nacional da Sociobioeconomia, que promove as economias florestais a partir da identificação de inovação, da valorização do potencial socioeconômico, ambiental e cultural e da ampliação da participação dos povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares nos mercados.
Além disso, a pasta está desenvolvendo ainda o Plano Nacional da Bioeconomia, que busca tornar a economia mais sustentável, priorizando o uso recursos naturais renováveis em substituição aos combustíveis fósseis.
Sociedade civil
Ao falar pela Coalização Negra por Direitos, Mônica Oliveira elogiou os esforços do governo. Segundo ela, diante do exposto pelos representantes, é possível reconhecer avanços. No entanto, evocando o título do manifesto lançado pela entidade, reforçou que “não haverá justiça climática sem enfrentamento ao racismo ambiental”, no Brasil e no mundo.
“Quero lembrar que a população mundial é majoritariamente não branca. São povos indígenas, afrodescendentes, asiáticos. No Brasil, 57% da população é negra. Portanto, não podemos tratar a questão racial como tema de minoria. Não falamos estamos falando na questão nacional e do planeta de minorias. O conceito de racismo ambiental precisa estar incorporado às negociações, às análises e às proposições do governo”, defendeu.
Héber Carvalho