No meio da reunião desta segunda-feira (18)  na Casa Branca, Donald Trump interrompeu o encontro com o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, e sete líderes europeus para fazer uma ligação a Vladimir Putin. 

A cena, apenas três dias depois de o presidente dos Estados Unidos estender o tapete vermelho ao chefe do Kremlin em Anchorage, no Alasca, no primeiro encontro presencial entre os dois desde o início da guerra, tornou-se o símbolo da posição de vantagem dos russos no conflito — uma reviravolta em relação à correlação de forças dos últimos dois anos.

A reunião da última sexta-feira (15) ocorreu na base aérea de Elmendorf-Richardson e marcou o retorno da diplomacia direta entre Washington e Moscou, depois de anos de isolamento.

A interrupção do encontro expôs a contradição central da cúpula: enquanto os líderes europeus correram a Washington para dar respaldo a Zelensky e tentar impor a Trump a exigência de um cessar-fogo como condição mínima para negociações, o presidente norte-americano seguiu o caminho inverso.

Se antes, Trump chegou a apoiar a ideia, depois de Anchorage adotou a posição de Moscou de que qualquer acordo precisa ser abrangente, não se limitando à suspensão temporária dos combates. 

Na prática, a chamada “paz americana” apresentada na Casa Branca não representou uma saída para a Ucrânia, mas sim a demonstração clara de seus limites frente à força de manobra da Rússia.

Prova da posição vantajosa do Kremlin é a cobertura da imprensa internacional. A Reuters destacou que “Trump tem pressionado por um fim rápido à guerra mais letal da Europa em 80 anos, e Kyiv e seus aliados temem que ele tente impor um acordo nos termos da Rússia”. 

O texto lembrou ainda que, em Anchorage, “o presidente americano recebeu Putin com pompa, apesar de o líder russo enfrentar acusações de crimes de guerra no Tribunal Penal Internacional, que ele nega”.

O New York Times, por sua vez, observou que o encontro em Washington deixou evidente o caráter performático da diplomacia de Trump. “Na prática, os líderes europeus se viram reféns dos impulsos de um único homem, Trump”, escreveu o jornal. 

A reportagem sublinhou que a reunião terminou sem definições concretas, mas com a constatação de que o presidente americano “adotou grande parte da abordagem de Putin sobre a Ucrânia” após o encontro no Alasca.

A “paz americana” e a cortina de fumaça

Trump buscou manter suspense em torno do que seriam as garantias norte-americanas a Kiev. Não ofereceu “botas no chão”, como se referiu a tropas em território ucraniano, mas prometeu vender armas e ampliar negócios de empresas norte-americanas no país — promessas vistas por Kiev como muito aquém de uma garantia de segurança.

Na prática, como registrou Gérard Araud, ex-embaixador da França em Washington, “em Anchorage e em Washington, foi o triunfo do vazio e de compromissos sem significado. Nada mudou”. 

A aparente cordialidade entre Trump e Zelensky, com elogios ao traje do ucraniano e risos ensaiados no Salão Oval, funcionou como cortina de fumaça para esconder o verdadeiro jogo: a condução de uma negociação que já se desenha em torno dos termos de Moscou.

Durante todo o encontro, no entanto, a presença de Putin pairou como uma sombra permanente. Trump mencionou diversas vezes que precisava atualizar o russo e, no meio da reunião, levantou-se para telefonar a ele. 

De acordo com diplomatas europeus, os dois discutiram a possibilidade de um encontro direto entre Putin e Zelensky, seguido de uma cúpula trilateral. Moscou chegou a ser sugerida pelo Kremlin como sede, mas Trump recusou.

Ainda assim, a mensagem era inequívoca: Kiev não é protagonista, mas peça em um tabuleiro já dominado por Trump e Putin. 

A vitória de Moscou e o recuo europeu

Os europeus se esforçaram para mostrar unidade, mas, na prática, tiveram que engolir o recuo de Trump em relação ao cessar-fogo. 

“Para ser honesto, todos gostaríamos de ver um cessar-fogo”, disse Merz. “Não consigo imaginar que a próxima reunião aconteça sem um.” Trump, porém, retrucou afirmando que já solucionou conflitos sem precisar interromper os combates. 

Emmanuel Macron, que em 2022 fracassou em dissuadir Putin da invasão, limitou-se a declarar que “o presidente Trump está muito confiante em sua capacidade de fechar um acordo, o que é uma boa notícia para todos nós”.

Enquanto isso, as declarações sobre garantias de segurança se limitaram a promessas vagas. Zelensky anunciou que Kiev se dispõe a comprar US$90 bilhões em armas dos EUA, um número que apenas reforça a dependência de um país já fragilizado. 

Para Londres, Paris e Berlim, a viagem a Washington serviu mais para conter danos do que para abrir perspectivas. “Estávamos bem preparados e bem coordenados”, disse Merz após a reunião. “Representamos os mesmos pontos de vista, e acho que isso agradou ao presidente americano, que percebeu que os europeus estão falando com uma só voz.”

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Last Update: 19/08/2025