Centenas de milhares de manifestantes saíram às ruas de Israel, neste domingo (17), em uma das maiores manifestações contra o governo do primeiro-ministro Benjamim Netanyahu. Convocados por familiares de sequestrados em 7 de outubro de 2023, atos e uma greve nacional tomaram o país para exigir o fim da guerra em Gaza e um acordo imediato que permita o retorno dos reféns ainda detidos no enclave.
Alguns relatos afirmam que manifestações reuniram um milhão de pessoas por todo o país, que tem pouco menos de 10 milhões de habitantes, e exigiram a renúncia do primeiro-ministro, a quem é visto com desconfiança pela sociedade israelense.
Em Tel Aviv, a concentração noturna na chamada Praça dos Reféns foi a maior desde 2024: os organizadores falaram em mais de 400 mil presentes no entorno da praça; outras coberturas citaram “quase meio milhão” ao cair da noite.
A polícia não divulgou estimativa oficial, e reportagens mencionaram números mais conservadores em comparação aos dos organizadores.
Desde cedo, estradas principais foram bloqueadas — entre elas a Ayalon (norte e sul, em Tel Aviv), a Rota 1 (Tel Aviv–Jerusalém), a Rota 4, a Rota 6 e a Begin (em Jerusalém). Houve queima de pneus em alguns pontos e interrupção do tráfego em túneis e interseções.
Restaurantes e cafés fecharam, diversas prefeituras e empresas aderiram, e universidades — como a Hebraica de Jerusalém — confirmaram participação. A Histadrut, principal central sindical, não apoiou formalmente a greve. Escolas não foram afetadas por estarem em recesso de verão.
Ao longo do dia, a polícia usou canhões de água para dispersar bloqueios e informou dezenas de detenções. Às 14h, segundo a Reuters, eram 38 detidos.
Em outras reportagens, falou-se em 33 prisões ao longo do dia, com sete pessoas ainda sob custódia à noite. Também foram registradas agressões contra manifestantes: em Tel Aviv, um caminhão tentou avançar sobre um grupo da comunidade de Nir Oz; em Ra’anana, outro caminhoneiro foi acusado de agredir pessoas em um bloqueio.
Por volta das 16h, sirenes soaram em Tel Aviv, Jerusalém e outras cidades por causa de um míssil lançado do Iêmen. O projétil foi interceptado, e a Força de Defesa de Israel (IDF) afirmou ter abatido o míssil. Manifestantes buscaram abrigo e, depois, a mobilização foi retomada.
Quem estava nas ruas: famílias de reféns, ex-reféns e apoio institucional
As famílias dos sequestrados conduziram a agenda e os palcos. Einav Zangauker, mãe de Matan, falou em Tel Aviv e criticou o governo após a divulgação de um vídeo do filho em cativeiro (gravado em janeiro de 2024 e encontrado recentemente em Gaza).
Em outra declaração pública no mesmo domingo, ela respondeu à fala do primeiro-ministro segundo a qual os protestos “atrasam” a libertação dos reféns, descrevendo a mensagem dele como “tóxica e desconectada” e convocando: “Eu conclamo a todos — vão para as ruas!”
Outros pais e parentes discursaram na Praça dos Reféns:
- Ophir Breslavski, pai de Rom, disse que receberam sinal de vida do filho semanas atrás e acusou a liderança política de abandonar os sequestrados.
- Rubi Chen, pai de Itay Chen, afirmou que trazer os filhos de volta é um “dever moral, ético e judaico”.
- Michel Ilouz, pai de Guy Ilouz (cujo corpo está em Gaza), disse que “Bibi tem medo” da mobilização.
- Elad Or, irmão de Dror Or, avaliou que a greve “trouxe a verdade à luz” — os israelenses querem os reféns em casa.
- Lishi (Lishay) Miran-Lavi, uma das organizadoras, dirigiu-se ao marido Omri (sequestrado) em mensagem pública.
- Yehuda Cohen, pai do soldado Nimrod Cohen, atacou duramente o primeiro-ministro durante a marcha em Tel Aviv.
Ex-reféns também falaram. Arbel Yehud, libertada em troca durante um cessar-fogo, afirmou em Tel Aviv que “a única maneira de trazê-los de volta é por meio de um acordo, de uma vez, sem jogos.”
Ex-cativos libertados em 2025 levaram a faixa “Tragam eles de volta agora!”. A atriz Gal Gadot visitou a Praça dos Reféns e se encontrou com familiares. Na mesma praça, familiares de um estudante do Nepal sequestrado falaram publicamente, relatando ausência de sinais de vida por quase dois anos.
Presidentes de universidades compareceram e defenderam um acordo; Daniel Chamovitz (Universidade Ben-Gurion) recordou carta de março em que reitores pediam “completar o acordo e trazer todos de volta”, descrevendo a cobrança como “moral e de consciência”.
Ato da noite em Tel Aviv e a decisão de levar o protesto à fronteira
À noite, a concentração na Praça dos Reféns virou o centro nacional da mobilização. O Fórum das Famílias de Reféns e Desaparecidos anunciou greve nacional e disse: “Vamos paralisar o país hoje com um único chamado: tragam de volta os 50 reféns, acabem com a guerra.”
O grupo avisou que pretende montar um acampamento próximo à fronteira de Gaza para ampliar a pressão. “Se não os trouxermos agora, vamos perdê-los para sempre”, alertou um dos organizadores.
Houve também performances simbólicas. A ex-refém Ilana Gritzewsky encenou uma “cerimônia de casamento” com o companheiro Matan Zangauker, ainda em cativeiro, para chamar atenção ao caso.
Ao final do comício central, milhares marcharam até a sede do Likud, partido do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, na fortaleza (Metzudat) Zeev, em Tel Aviv. Manifestantes acenderam uma fogueira na via e foram retirados à força pela polícia.
O que diz o governo; o que dizem as famílias
Na abertura da reunião semanal de gabinete, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu declarou, de forma cínica, que “aqueles que hoje pedem o fim da guerra sem derrotar o Hamas não apenas estão endurecendo a posição do Hamas e afastando a libertação de nossos reféns, como também estão garantindo que as atrocidades de 7 de outubro se repitam de novo e de novo.”
“Para avançar na libertação de nossos reféns e garantir que Gaza nunca mais seja uma ameaça a Israel, precisamos completar a missão e derrotar o Hamas”, disse.
Netanyahu reafirmou estar “determinado a implementar” a decisão do gabinete de segurança de conquistar a Cidade de Gaza — ponto que motivou a deflagração da greve deste domingo.
O Fórum das Famílias de Reféns rebateu em comunicado, acusando o premiê de “enganar o público” e de ter rejeitado oportunidades de trazer os cativos de volta:
“Por 22 meses os reféns estão definhando em Gaza — sob sua responsabilidade.” O texto sustenta que “houve muitas oportunidades” e que “quem torpedeou, rejeitou e evitou [um acordo] é quem elevou o preço”.
O Fórum também afirmou que “centenas de milhares” se juntaram aos protestos e que “milhares de empresas” fecharam as portas para permitir a participação de trabalhadores.
No campo político, aliados de Netanyahu atacaram as manifestações. O ministro das Finanças, o ultra-direitista Bezalel Smotrich classificou a campanha como “perversa e nociva” e disse que ela “serve ao Hamas”; outro parlamentar do Likud chamou os atos de “motins de apoio ao Hamas”.
Na oposição, Yair Lapid participou dos protestos e afirmou que os reféns “não são peões” e devem ser devolvidos às famílias. O ex-ministro da Defesa Yoav Gallant também aderiu à paralisação e disse haver “dever supremo de trazer todos de volta”, defendendo a sequência: primeiro devolver os reféns, depois continuar a eliminar o Hamas.