Os Estados Unidos estão monitorando o trabalho do Supremo Tribunal Federal (STF) para uma eventual expansão da Lei Magnitsky – uma lei que, como muitas leis domésticas norte-americanas, possui efeito extraterritorial.

Nesta quinta-feira, a Embaixada dos Estados Unidos voltou a criticar o trabalho do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmando que o magistrado é o “principal arquiteto da censura e perseguição contra Bolsonaro e seus apoiadores”.

“Os aliados de Moraes no Judiciário e em outras esferas estão avisados para não apoiar nem facilitar a conduta de Moraes. Estamos monitorando a situação de perto”, disse a Embaixada norte-americana no Brasil em postagem na rede social X.

Segundo a advogada Vera Kanas, sócia do escritório VK Law, a lei Magnitsky acaba tendo aplicação extraterritorial por conta dos diversos pontos de conexão com os Estados Unidos.

“A lei diz ‘olha, vocês empresas dos EUA estão proibidas de fazer negociação com a pessoa sancionada pela lei’. Qualquer banco com ponto de conexão com os EUA – com escritório no país, ou que negocia em dólar – está sujeito à legislação norte-americana”, explica.

Isso explica o possível impacto da lei norte-americana sobre Moraes no Brasil, tendo em vista que os grandes bancos brasileiros possuem escritórios e ações negociadas no mercado norte-americano.

“Ela se aplica no Brasil? Na prática sim, pois atinge qualquer entidade que tenha ligações com os EUA, inclusive com negócios no Brasil”, explica Vera, ressaltando que as operações financeiras são as mais fáceis de se rastrear vínculos, fazendo da Magnitsky uma lei “administrativa e de fácil aplicação”.

“(A questão financeira) é mais fácil achar vínculos, as bandeiras de cartão de crédito são norte-americanas e a gente pode até extrapolar – como o impedimento de se efetuar compras em site internacional. A lei chega realmente em uma esfera bastante ampla”, pontua Vera Kanas.

Antipatia a perseguição judicial

“(Donald) Trump, depois do que passou nos EUA, criou uma antipatia grande a tudo que veja, e que entenda que seja, perseguição judicial”, explica Bernardo Weaver, advogado e sócio do Weaver Law.

Mestre em Direito Penal pela Universidade de Harvard, Weaver diz que, basicamente, Trump está “prestando atenção em como o processo (do ex-presidente Jair) Bolsonaro está sendo tocado”.

Em entrevista ao Jornal GGN, Weaver lembra que Trump não foi levado a julgamento pelos atos de 06 de janeiro, “mas isso não impede Trump de ver instrumentalização do processo judicial de maneira similar ao que aconteceu”.

No caso, o advogado se refere às ações envolvendo o entorno de Trump, com operações criminais envolvendo diversas pessoas do staff do político republicano por “questões das mais diversas”.

“Soberania também é questão de força”

Weaver ressalta que parte da soberania de um país “é uma projeção da sua força como país”. No caso dos Estados Unidos, o país tem “controle e domínio do sistema bancário internacional, e usam esse controle para estender a jurisdição para além das fronteiras”.

“Os Estados Unidos usam a força do mercado financeiro como projeção do seu poder jurisdicional. Tudo o que toca o mercado financeiro norte-americano acaba sendo entendido pelo Departamento de Justiça que é sua jurisdição. Por isso que as sanções a Moraes têm tanta força”, pontua o jurista.

Bernardo Weaver explica que “o grande erro que as pessoas cometem no momento é subestimar a gravidade e extensão das sanções” da lei Magnitsky. “(A lei) é uma maneira de entrar na lista de sanções da OFAC (Agência de Controle de Ativos Estrangeiros dos EUA, na sigla em inglês), em uma espécie de ‘pena de morte financeira’”.

Todas as instituições financeiras do mundo recebem diariamente uma lista com os nomes daqueles que estão na lista da OFAC, e todas sabem que precisam terminar todos os relacionamentos bancários com os listados de forma imediata.

“Todos os bancos provavelmente fecharão todas as contas – corrente, de investimento – do ministro”, pontua Weaver. “O banco que não faz isso se sujeita a sanções bilionárias, que são feitas para inviabilizar as operações (…) Se tivesse de apostar, todos os bancos brasileiros já encerraram as contas dele pois se não o fizerem serão multados em muito dinheiro pela OFAC”.

Embora os afetados pela lei possam se adaptar à legislação, Vera Kanas destaca o impacto na vida da pessoa afetada, mas alerta para o “uso indiscriminado do instrumento jurídico, inicialmente elaborado para lidar com casos graves de corrupção”.

Impasse

O ministro Alexandre de Moraes já deixou claro que não pretende retroceder na condução do processo contra Bolsonaro, e possui o apoio da maioria do Supremo Tribunal Federal, mas tanto Vera Kanas como Bernardo Weaver acreditam que a questão legal está em um grande impasse.

“Parece que ninguém quer se mexer, e realmente não tenho a menor ideia do que esperar”, diz Bernardo. “Não vejo perspectiva de (restrições da lei Magnitsky) serem levantadas, a não ser que exista mudança de tratamento no que Trump acredita ser ‘caça às bruxas’ ou um agente externo – como impeachment de Moraes”.

Embora destaque a “ingerência política” da embaixada norte-americana ao repostar sobre o assunto em inglês e em português, a advogada Vera Kanas destaca a incerteza gerada pelo assunto também do ponto de vista econômico.

“Um grande problema é a incerteza: uma empresa não sabe quanto vai custar item os EUA, e depois entra na exceção… A incerteza é o grande inimigo dos negócios, e mesmo para as pessoas fica a sensação de que ‘hoje é o Supremo, amanhã é alguém que fala algo que o outro não gostou’”.

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Last Update: 10/08/2025