O gabinete de segurança de Israel aprovou, entre quinta (7) e sexta-feira (8), o plano do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu para invadir a Cidade de Gaza, principal região do enclave árabe.
A decisão ignora até mesmo alertas das Forças de Defesa de Israel (IDF) sobre os riscos à vida dos reféns e ao agravamento da catástrofe humanitária na região.
O plano prevê a expulsão de aproximadamente 800 mil civis palestinos até o dia 7 de outubro — data que marca dois anos do ataque do Hamas em solo israelense. Após esse prazo, as tropas lançarão uma ofensiva terrestre para sitiar completamente a cidade e “eliminar os combatentes restantes”.
Segundo o governo, o objetivo é “derrotar o Hamas”, embora militares tenham advertido que a ação ameaça diretamente os 50 reféns ainda mantidos na Faixa.
Apesar do esforço retórico para evitar o termo “ocupação”, autoridades israelenses admitem que a operação equivale à imposição de controle militar direto sobre a região — uma medida que, na prática, abre caminho para uma política de anexação territorial e deslocamento forçado da população palestina.
De acordo com informações divulgadas pelo jornal Israel Hayom e confirmadas por fontes oficiais, a ofensiva deverá durar até sete meses: três para a invasão, dois para a tomada dos campos de refugiados do centro do território e mais dois para ações de “limpeza”. A operação exigirá a convocação de cerca de 200 mil reservistas.
Atualmente, Israel afirma controlar 75% da Faixa de Gaza. Os 25% restantes incluem áreas densamente povoadas como a Cidade de Gaza e campos de refugiados centrais, onde, segundo a inteligência militar, estaria concentrada a maior parte dos reféns.
O plano aprovado pelo gabinete estabelece cinco condições para que a guerra chegue ao fim: o desarmamento total do Hamas, a libertação de todos os reféns, a desmilitarização da Faixa, a manutenção do controle militar israelense e a instalação de um governo civil sem participação do Hamas ou da Autoridade Palestina.
Netanyahu afirmou à Fox News que, após concluir a invasão, transferirá o controle do território para “forças árabes”. Nenhum país árabe, no entanto, aceitou participar da administração do enclave sem a inclusão da Autoridade Palestina — opção formalmente rejeitada pelo governo israelense.
Chefe do Exército e famílias de reféns alertam para tragédia
Durante a reunião de dez horas do gabinete de segurança, o chefe do Estado-Maior da IDF, general Eyal Zamir, se posicionou contra o plano. Ele advertiu que não há garantias de que os reféns não sejam mortos na operação e alertou para o desgaste das tropas, a necessidade de manutenção de equipamentos e os riscos humanitários e sanitários.
Zamir propôs uma alternativa militar mais contida, rejeitada pela maioria dos ministros. Segundo ele, uma ocupação total da Faixa poderia levar até dois anos para ser concluída, com cinco meses iniciais de combate intenso.
Também participaram da reunião membros da equipe de negociação de reféns, que pediram aos ministros que evitassem qualquer decisão que inviabilize futuros acordos. Netanyahu respondeu que a operação poderá ser interrompida se o Hamas aceitar as condições impostas por Israel.
O ministro da Segurança Nacional, Itamar Ben Gvir, exigiu o contrário: que o governo declare publicamente que não haverá negociação até a conclusão total da ofensiva.
A reação mais contundente veio das famílias dos reféns, que organizaram um protesto em Tel Aviv ainda na noite de quinta-feira. A manifestação bloqueou ruas e enfrentou a repressão policial. Os familiares acusam o governo de assinar uma sentença de morte para seus entes queridos e argumentam que a pressão militar não trouxe resultados concretos desde março, quando foi lançada a chamada Operação Carruagens de Gideão.
Situação humanitária se deteriora e pressão internacional cresce
A decisão de Netanyahu ocorre no momento em que Gaza enfrenta uma crise de fome em larga escala e mais de 2 milhões de pessoas se encontram deslocadas — muitas delas por múltiplas vezes. A Cidade de Gaza abriga hoje quase metade dessa população, concentrada nos 25% do território ainda não ocupados por Israel.
Segundo o ministério da Saúde da Faixa, mais de 60 mil pessoas foram mortas ou estão desaparecidas desde o início da guerra. Israel afirma ter matado 20 mil combatentes até janeiro e outros 1.600 militantes durante o ataque de 7 de outubro.
Mesmo sob pressão crescente da ONU e de organizações de direitos humanos, Israel rejeita as acusações de crimes de guerra e genocídio. Em julho, dois dos principais grupos israelenses de direitos humanos passaram a usar formalmente o termo “genocídio” para descrever a campanha em curso na Faixa.
Críticos do governo afirmam que Netanyahu prolonga deliberadamente a guerra ao recusar qualquer alternativa viável ao Hamas, excluindo até mesmo a Autoridade Palestina. Sem uma solução política, alertam analistas, o conflito se perpetua como instrumento de sobrevivência política da coalizão de extrema direita que sustenta o premiê no poder.