O instrumento deve regulamentar a atuação das plataformas digitais, estabelecendo deveres e responsabilidades, assegurando mecanismos de prevenção, identificação e punição de abusos virtuais contra crianças e adolescentes

 

Autoridades, sociedade civil e representantes do governo defenderam ações de proteção a crianças e adolescentes nas redes sociais, contra crimes de aliciamento, abuso e exploração sexual. Durante seminário realizado na Câmara, nesta terça-feira (5/8), também foi apontado a necessidade da adoção de um marco legal no país que institucionalize ações voltadas a este segmento da sociedade e que responsabilize as plataformas digitais, promovendo o uso seguro da tecnologia. O evento foi uma iniciativa do deputado Reimont (PT-RJ), que preside a Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM).

Convidadas para participar do seminário, apenas as plataformas Discord e YouTube enviaram representantes. Google, Meta, Tik Tok e Roblox não responderam ao convite para participar do debate.

Na abertura do evento, o deputado Reimont disse que, embora o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) assegure a prioridade absoluta dos direitos infanto-juvenis, sua aplicação ainda se mostra insuficiente diante das complexidades trazidas pelas novas tecnologias e dinâmicas digitais.

“Por isso é fundamental promover um debate qualificado que culmine na formulação de um marco normativo atualizado, capaz de regulamentar a atuação das plataformas digitais, estabelecendo deveres e responsabilidades, assegurando mecanismos de prevenção, identificação e punição de abusos virtuais contra crianças e adolescentes no ambiente digital”, afirmou Reimont.

Sociedade civil

Um dos temas debatidos no seminário foi a promoção do uso saudável da tecnologia digital entre crianças e adolescentes. Citando uma pesquisa, a Secretária-Executiva do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), Ana Cifali, lembrou que 93% das crianças e adolescentes residentes no Brasil, entre 9 e 17 anos, já utilizaram a internet, enquanto 83% afirmam possuir perfil próprio nas redes sociais.

Ao mesmo tempo ela lamentou que o mesmo levantamento também apontou que 26% do público infanto-juvenil, ao assistir vídeos de conteúdo violento, tiveram vontade de atacar verbalmente ou fisicamente outras pessoas, e que 15% dos jovens entrevistados efetivamente realizaram esses atos após assistirem esse tipo de conteúdo. Diante desse cenário, a representante do Conanda enumerou ações adotadas pelo Conselho para resolver o problema.

“A partir desse cenário, o Conanda publicou a Resolução 245 que dispõe sobre os direitos da criança e do adolescente no ambiente digital. Essa resolução traz o principio básico de proteção dos direitos desse público, como o direito à privacidade e proteção de dados, e do dever de cuidado e responsabilidades de empresas provedoras de produtos e serviços digitais”, destacou.

A Diretora de Relações Institucionais do Conselho Digital, Roberta Jacarandá, enfatizou ainda que a proteção de crianças e adolescente no meio digital, é responsabilidade de toda a sociedade.

“A digitalização é uma realidade irreversível nas nossas vidas. Nós, adultos, trabalhamos com o celular na mão ou com um computador em cima da mesa, e as crianças, além do entretenimento digital, muitas vezes estão fazendo atividades ou tarefas escolares online. Esse cenário impõe responsabilidade não apenas as famílias, mas também escolas, governo e as plataformas digitais”, disse.

Ações do governo

Vários representantes de ministérios e órgãos governamentais revelaram no seminário as iniciativas que vem sendo adotadas pelo governo para a proteção de crianças e adolescentes no mundo digital. Representando o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), Fábio Meirelles, destacou que, além da implementação da Política Nacional de Proteção dos Direitos da Criança e do Adolescente no Ambiente Digital, a pasta também realizou um diagnóstico nacional da violência sexual online contra crianças e adolescentes no país, em pesquisa com parceria da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e o Pnud (órgão das Nações Unidas)

Ele citou ainda o lançamento do Guia de Telas, uma publicação sobre o uso de dispositivos digitais, com análises e recomendações do governo federal – baseados em evidências cientificas e nas melhores práticas internacionais – voltadas a proteção de crianças e adolescentes no meio digital.

Além dessas ações, a Secretaria de Comunicação do Governo lançou a Estratégia Brasileira de Educação Midiática. A ação visa formar 300 mil profissionais da educação e 400 mil profissionais da saúde para desenvolver habilidades para lidar com informações, comportamentos e praticas sociais no meio digital.

Crimes digitais

Já o Ministério da Justiça adotou 45 medidas voltadas a prevenção da violência, acolhimento de vítimas e acesso a justiça, com foco n o contexto digital e promovendo aceso seguro a internet, apoio a famílias e fortalecendo as investigações de crimes digitais.

Nesse caso, o diretor de Combate a Crimes Cibernéticos da Polícia Federal, Valdemar Lance Neto, destacou que o órgão criou uma unidade específica para investigar crimes de abuso e exploração sexual infantil online.

Já o Ministério da Educação criou no ano passado o Sistema Nacional de Acompanhamento e Combate a Violência na Escola (Snave), que regulamenta a lei que autoriza o Poder Executivo a implantar o serviço de monitoramento de ocorrências escolar. A pasta ainda lançou o Programa Escola que Protege, programa que fortalece a capacidade das redes de ensino para prevenir e enfrentar a violência na escola, muitas vezes planejada pelas redes sociais.

Proteção

Deputada Erika Kokay (PT-DF) – Foto: Renato Araújo/Câmara dos Deputados

Segundo a deputada Erika Kokay (PT-DF), 1ª vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, para além da implementação absoluta do Estatuto da Criança e do Adolescente, o Brasil deveria ter um marco legal que tornasse política de Estado todas as ações voltadas a proteção das crianças e adolescentes no mundo digital.

“Nós precisamos avançar na perspectiva de proteger as crianças e adolescentes que se dá de forma virtual. Estamos vivenciando um processo de domínio das redes sociais, com conteúdos violentos estabelecidos. Penso que deveríamos ter um marco legal, para proteger nossas crianças e adolescentes no mundo digital”, defendeu.

Plataformas Digitais

Durante o debate, representantes da Discord e do Youtube afirmaram que adotam ações para combater crimes virtuais contra crianças e adolescentes em suas respectivas plataformas. Karen Scavacini, chefe de Políticas Públicas da Discord para as Américas, disse que a empresa tem diretrizes rígidas para uso da plataforma de jogos onde usuários podem compartilhar áudio, vídeo e mensagem de texto. Segundo ela, a plataforma também dispõe equipes de moderadores para remover conteúdos impróprios.

Já a representante do Youtube, Erika Alvarez, destacou que a plataforma de compartilhamento de vídeos também tem diretrizes que protegem a juventude. Segundo ela, além de uma equipe de moderadores que removem conteúdos impróprios, existe uma moderação automática que elimina – segundo levantamento interno – 94% desse tipo de conteúdo.

Indagados pelo presidente da CDHM, as representantes das duas plataformas se colocaram favoráveis a eventuais políticas públicas de regulação das redes sociais, visando maior proteção às crianças e adolescentes.

Também participaram do seminário representantes do Conselho Federal de Psicologia; da organização não governamental Vita Alere; do Ministério da Justiça; e da Associação Nacional dos Defensores Públicos Federais.

 

Héber Carvalho

 

 

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Last Update: 05/08/2025