Encontro para debater as proposições ao 16º Congresso do PCdoB, realizado nesta segunda, no Rio de Janeiro, teve como eixo a análise da Proposta de Resolução do Partido, que aponta a transição geopolítica global como um momento estratégico para o Brasil afirmar sua soberania. Os debatedores destacaram a crise do neoliberalismo, o declínio relativo da hegemonia dos Estados Unidos e a ascensão da China como elementos centrais da nova configuração internacional. “A contradição principal no mundo hoje é a luta entre o imperialismo e projetos nacionais autônomos, com a China operando como uma formação econômico-social de orientação socialista dentro do sistema capitalista global”, disse Elias Jabbour.
O ciclo de debates preparatórios para o 16º Congresso do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) chegou ao Rio de Janeiro com o tema Mundo em Transição, reunindo militantes, intelectuais e simpatizantes para discutir os desafios da conjuntura internacional. O evento, realizado no auditório do SIAERJ, foi promovido pela Fundação Maurício Grabois e transmitido pela TV Grabois, e contou com a participação dos professores Elias Jabbour (UERJ), Ana Penido (UFF) e Luis Fernandes (PUC-Rio/MCTI), sob mediação de Conceição Cassano, da direção nacional do PCdoB.
Pontos de convergência: declínio, multipolaridade e guerra híbrida
Os debatedores apresentaram um diagnóstico comum sobre o declínio da hegemonia estadunidense. “Estamos diante de uma transição estrutural na ordem mundial, com o enfraquecimento relativo dos Estados Unidos e o surgimento de novos polos de poder, como a China, que já supera os EUA em paridade de poder de compra”, explicou Luis Fernandes. Essa transição, que se acelerou a partir da crise financeira de 2007-2008, foi analisada por Elias Jabbour como a expressão de um neoliberalismo em crise e da incapacidade dos EUA de se adaptarem à conjuntura atual. Por sua vez, Ana Penido complementou a análise, ressaltando que, apesar do enfraquecimento econômico, os EUA ainda mantêm uma forte influência cultural e militar.
Nesse contexto, os três concordaram sobre a emergência de um mundo multipolar, que se apresenta como um campo de oportunidades para países como o Brasil. Elias Jabbour destacou que a ascensão da China, com seu modelo de socialismo, está redefinindo as regras do jogo e abrindo caminho para projetos nacionais autônomos. Luis Fernandes, por sua vez, complementou a análise, associando a multipolaridade à resistência de novos blocos, como os BRICS, que buscam fazer contraponto às instituições financeiras tradicionais, como o FMI e o Banco Mundial. Ana Penido ressaltou que, para aproveitar essa brecha, o Brasil precisa de uma estratégia de defesa nacional coerente. “A hegemonia cultural dos EUA ainda é forte, especialmente no modo de vida e na influência sobre as elites, como as militares brasileiras, que mantêm laços com a OTAN”, afirmou.

Guerras Híbridas
Outro ponto de união entre os debatedores foi a análise da guerra híbrida como uma estratégia imperialista que se intensificou. Luis Fernandes vinculou a guerra híbrida à tentativa dos EUA de manter sua influência por meio de sanções e intervenções judiciais. Jabbour alertou para o uso de grandes empresas de tecnologia e redes sociais para manipular narrativas e opiniões, enquanto Ana Penido destacou a capacidade de customização dessas táticas, o que dificulta uma pronta resposta. “As guerras híbridas, com operações psicológicas via redes sociais, mudaram com a inteligência artificial, permitindo customização em massa e exigindo respostas estratégicas”, disse Penido.
Nuances e novas perguntas
O debate se aprofundou ao apresentar diferentes perspectivas sobre temas essenciais. A natureza da transição hegemônica foi um desses pontos. Enquanto Elias Jabbour sugere que a China está construindo uma nova formação histórico-social, redefinindo o conceito de socialismo no século XXI, Ana Penido apontou para a persistência da hegemonia estadunidense em esferas como a cultural. Luis Fernandes, por sua vez, apresentou uma tese provocadora: a transição não levará a uma nova hegemonia, mas a um “balanço de poder” global, sem uma potência dominante.
O papel da China na ordem mundial também foi um ponto de riqueza analítica. Elias Jabbour a vê como uma força que introduz um novo paradigma histórico, enquanto Luis Fernandes argumentou que o país asiático, apesar de sua ascensão, opera dentro das regras do capitalismo global, sem estruturar um sistema mundial alternativo, como a União Soviética fez no século passado.
O sucesso do debate reafirma a centralidade do pensamento crítico e da organização partidária para enfrentar os desafios do século XXI.