Estamos vivenciando semanas de significativa agitação política no terreno nacional, a qual, obviamente, não pode ser compreendida sem considerar a influência que os agentes externos exercem dentro dos nossos limites territoriais.
Essa agitação política, fruto de um processo contínuo de lutas de classes que se aprofundou nas últimas duas décadas no país, está abrindo oportunidades históricas de grande magnitude para a consolidação do Brasil enquanto nação soberana.
Esse tipo de situação abre grandes oportunidades, mas também é responsável por causar confusões nas análises, euforia exacerbada, erros e equívocos nas tomadas de decisão, os quais podem ocasionar períodos de refluxo.
No dia 9 de julho, o presidente dos EUA, Donald Trump (Partido Republicano), anunciou que taxaria em 50% as importações vindas do Brasil, seguindo a linha geopolítica, econômica e comercial que adota desde o início de seu governo. Atrelado a isso, aproveitou para chantagear política e juridicamente o Brasil no que diz respeito ao julgamento da tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023.
Trump fez sucessivas declarações chantageando o Estado brasileiro, alegando que, para retirar a taxação, seria necessário interromper o julgamento dos golpistas, principalmente do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O governo federal, o Supremo Tribunal Federal, o presidente da Câmara dos Deputados e o presidente do Senado e do Congresso Nacional deram respostas contundentes a essa situação. Mas a resposta mais importante tem sido dada pelo próprio povo brasileiro, que vem demonstrando seu apoio ao presidente Lula com o crescimento nas pesquisas eleitorais e com mobilizações de rua em diversas cidades, por meio de suas principais organizações populares.
Diante da chantagem aberta, articulada pelo filho do ex-presidente, Eduardo Bolsonaro, que se encontra nos EUA há alguns meses com o objetivo de atentar contra a soberania nacional, no dia 18 de julho de 2025 o ministro do STF, Alexandre de Moraes, determinou medidas cautelares contra Jair Bolsonaro. Entre elas: uso de tornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar entre 19h e 6h, inclusive nos finais de semana, proibição de comunicação com embaixadas e diplomatas estrangeiros, proibição de contato com outros réus e investigados e proibição de acesso às redes sociais.
O governo Trump respondeu a essas medidas do Judiciário brasileiro retirando o visto de ministros do STF que não são alinhados ao bolsonarismo e deixando no ar a possibilidade de outras retaliações.
Antes das medidas cautelares e posteriormente ao anúncio da taxação por parte de Trump, a Procuradoria-Geral da República (PGR) já havia solicitado ao STF a condenação de Jair Bolsonaro, Alexandre Ramagem, Augusto Heleno, Anderson Torres, Braga Netto, Paulo Sérgio Nogueira, Mauro Cid e Almir Garnier no processo referente ao golpe de 8 de janeiro de 2023.
Esses fatos específicos são bastante relevantes no cenário político imediato, conforme mencionado no início do texto. E podem adquirir uma relevância ainda maior se for adotada, diante dessa conjuntura, uma tática e uma estratégia acertadas. Do contrário, podem servir apenas para restabelecer a ordem de coisas e a hegemonia política vigente desde o fim da ditadura militar.
Há alguns dias, escutei algo muito interessante do professor Elias Jabour (PCdoB-RJ): que o governo Lula governa com as instituições políticas do golpe de 2016. Essa é uma caracterização necessária para compreender a dinâmica política do país, pois o bolsonarismo e o golpe de 2016 foram derrotados apenas no terreno eleitoral, no âmbito do governo federal.
Aliás, se se quer traçar uma tática e uma estratégia corretas para a intervenção política, essa é a questão central da situação do país, para que se possa avançar no que diz respeito aos direitos sociais, políticos e econômicos da população e, por conseguinte, garantir uma efetiva soberania nacional.
A imprensa capitalista tem deslocado todo o debate acerca do golpe de 8 de janeiro para ações que focalizam sujeitos de maneira individualizada. Essa é a posição conservadora, que busca manobrar o debate para manter intacta a estrutura político-institucional do golpe de 2016 e permitir a reabilitação dos representantes do regime político de 1988.
Para nós, da esquerda e das forças políticas que defendem os interesses nacionais, as ações do Judiciário contra determinados sujeitos que participaram da tentativa de golpe de 8 de janeiro devem servir de ponto de partida para um debate que desemboque em medidas muito mais profundas.
O Estado brasileiro, como Estado de um país de capitalismo atrasado, sofre sucessivas intervenções e adequações em seu metabolismo para atender aos interesses dos países imperialistas e dos grandes monopólios capitalistas internacionais, sendo um constante reprodutor de agentes políticos que servem a esses interesses.
Nesse sentido, o que quero dizer — e o que é necessário entender — ao se falar de mudanças profundas e de reformas políticas na institucionalidade estatal brasileira, é que é preciso superar essa estrutura tal como está montada hoje e constituir outra, que permita desagregar de forma efetiva a cultura política existente, substituindo-a por uma que defenda os interesses dos brasileiros.
De forma prática, é preciso aproveitar o calor do momento e a retomada da popularidade do governo para disputar a consciência da sociedade e colocar na ordem do dia a necessidade de reformar as Forças Armadas, realizar uma verdadeira reforma política, efetuar uma reforma tributária, pôr fim ao arcabouço fiscal, realizar a auditoria da dívida pública, nacionalizar as terras e garantir o efetivo cumprimento da função social da propriedade, reduzir a jornada de trabalho sem redução salarial e com garantia de folga nos fins de semana, entre outras medidas.
Algumas dessas reivindicações fundamentais estão sendo discutidas no cenário político atual por meio do plebiscito popular, de maneira acertada. Cabe agora, diante da oportunidade que se abriu, às organizações populares e aos partidos de esquerda aprofundarem sua visão de horizonte, de modo a alcançarmos uma situação em que, verdadeiramente, quem mande no Brasil sejam os brasileiros.