Redação Viomundo
Nessa quinta-feira, 24 de julho, representantes de organizações e movimentos sociais se reuniram na Defensoria Pública do Estado Rio de Janeiro para protestar contra a instituição ter concedido a Medalha do Mérito ao governador Cláudio Castro.
Uma comissão foi recebida pelo Defensor Público-Geral, Paulo Vinícius Cozzolino Abrahão, no auditório da entidade.
Marcelo Nogueira, membro da Frente Contra a Barbárie, participou do encontro
Abaixo, ele faz um relato do que aconteceu.

Ato em repúdio à Defensoria Pública do Rio de Janeiro por conceder a Medalha do Mérito ao governador Cláudio Castro. Foto: Arquivo pessoal
Movimentos sociais repudiam homenagem da Defensoria a governador marcado pelo incremento da letalidade policial
Por Marcelo M. Nogueira*
Em uma iniciativa contundente de resistência, cerca de 30 representantes de organizações e movimentos sociais realizaram, na tarde de quinta-feira, 24/07, um ato político em frente à sede da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.
A mobilização foi convocada em repúdio à homenagem prestada recentemente pelo órgão ao governador Cláudio Castro, identificado pelos manifestantes como responsável por cerca de 160 chacinas cometidas pelas polícias fluminenses.
A concentração, marcada por uma roda de falas aberta ao público, resgatou o sentido simbólico do espaço institucional, que há anos não era palco de manifestações políticas.
Durante o ato, foi lida a nota de repúdio que seria protocolada na Defensoria. Em seguida, representantes de coletivos e familiares de vítimas de ações policiais fizeram uso da palavra, denunciando a homenagem feita pela órgão ao governador, como um gesto que legitima a repressão e ignora o sofrimento de milhares de pessoas atingidas por políticas de segurança pública marcadas pela letalidade seletiva.
As falas destacaram que homenagens a figuras públicas associadas ao autoritarismo e à morte não são neutras, e funcionam como instrumentos de apagamento histórico e revitimização.
Participantes denunciaram o impacto psicológico e político da decisão institucional, afirmando que tal gesto compromete o já fragilizado vínculo entre o sistema de justiça e as populações mais vulnerabilizadas.
As intervenções reforçaram que a homenagem representa uma afronta direta às famílias de vítimas de violência de Estado e afeta negativamente a construção do acesso à justiça e aos direitos fundamentais.
Para os manifestantes, não se trata apenas de um erro simbólico, mas de uma ação que corrói a confiança da sociedade civil na Defensoria Pública como espaço de escuta e acolhimento.
A comissão foi recebida por integrantes da administração superior da Defensoria, incluindo o Defensor Público-Geral, Paulo Vinícius Cozzolino Abrahão.
A reunião, segundo os participantes, foi tensa desde o início, com tentativas de minimizar o episódio por meio de justificativas como “a homenagem não interfere no funcionamento da instituição” ou “a Defensoria precisa de orçamento”.
Tais argumentos foram prontamente refutados pela comissão, que denunciou a contradição entre o discurso institucional e o compromisso com os direitos humanos.
Diante da firmeza das manifestações, os gestores se viram sem justificativas consistentes e prometeram dar tramitação formal à nota de repúdio apresentada.
O número de protocolo do documento já foi emitido, e os movimentos aguardam a confirmação dos trâmites administrativos para acompanhamento coletivo do desdobramento da demanda.
Durante a reunião, a Defensoria proibiu a exibição de faixas e bandeiras no auditório, o que foi interpretado como um gesto simbólico de negação do diálogo e tentativa de esvaziamento político da ação.
Também foram feitas insinuações sobre a suposta inadequação do registro em vídeo e fotografia por parte de alguns participantes, numa clara tentativa de controlar a narrativa e deslegitimar a mobilização.
Apesar disso, os manifestantes mantiveram o foco e destacaram que o fundamental foi romper o silêncio e demarcar um posicionamento político claro diante de uma homenagem que, para muitos, representa uma aliança institucional com práticas de opressão e morte (necropolítica).
Ao fim do encontro, foi proposta a realização de posterior reunião para avaliação coletiva do ato e definição de estratégias de continuidade.
Também está em debate a melhor forma de repercutir publicamente o episódio, a fim de ampliar o debate sobre a função social das instituições públicas, a reforma do sistema de justiça e os limites éticos da memória institucional.
*Marcelo M. Nogueira é graduado em Direito (UERJ), mestre em Políticas Públicas e Formação Humana (UERJ), pesquisador em Direitos Humanos (UFRJ/PUC-RS) e membro da Frente Contra a Barbárie.