Na última sexta-feira (18), Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal e relator dos processos contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por suposta tentativa de golpe de Estado, proferiu decisão impondo medidas cautelares contra o ex-presidente. Dentre elas, Moraes proibiu Bolsonaro de utilizar “redes sociais, diretamente ou por intermédio de terceiros”.
Após entrevista dada no Congresso Nacional nesta segunda-feira (21), no mesmo dia Alexandre de Moraes proferiu despacho no âmbito da Ação Penal nº 2.668, afirmando que “a medida cautelar de proibição de utilização de redes sociais, diretamente ou por intermédio de terceiros, imposta a JAIR MESSIAS BOLSONARO inclui, obviamente, as transmissões, retransmissões ou veiculação de áudios, vídeos ou transcrições de entrevistas em qualquer das plataformas das redes sociais de terceiros, não podendo o investigado se valer desses meios para burlar a medida, sob pena de imediata revogação e decretação da prisão”.
Em outras palavras, Alexandre de Moraes decretou que Bolsonaro e sua imagem sejam completamente banidos das redes sociais, que atualmente são os principais veículos de divulgação de informações que não são divulgadas pela imprensa tradicional ou que o são de forma manipulada.
Em coluna publicada no jornal Poder 360, o advogado e professor André Marsiglia, especialista em liberdade de expressão e direito digital, denuncia que a decisão de Moraes vai muito além da censura prévia, sendo também censura retroativa e seletiva.
É seletiva, pois o banimento de Bolsonaro é aplicado apenas em relação às redes sociais. Não é feita nenhuma menção aos veículos da imprensa tradicional (aos canais de TV e portais de notícia).
É retroativa, pois, conforme se constata da própria decisão de Moraes, estão proibidas as retransmissões, ou seja, que vídeos e áudios anteriores de Bolsonaro sejam transmitidos novamente nas redes sociais (não apenas nas do ex-presidente, mas de qualquer pessoa).
Caso ocorram tais retransmissões, Moraes diz que será imediatamente decretada a prisão de Bolsonaro. E um dos princípios de um Estado de Direito (que Moraes e o STF dizem que Bolsonaro tentou destruir) é o da irretroatividade das Leis.
Isto é, as leis não podem retroagir para prejudicar. No direito brasileiro, existe especificamente a irretroatividade da lei penal, isto é, lei penal não pode retroagir para prejudicar o réu. E, se a lei não pode retroagir, muito menos interpretações abusivas feitas por juízes de suas próprias decisões já abusivas, ilegais e inconstitucionais.
Nesse sentido, cumpre lembrar que, em abril de 2019, o Supremo Tribunal Federal entendeu que era censura a proibição que havia sido imposta a Lula na época em que ele estava preso ilegalmente, proibindo-o de dar entrevistas de dentro da prisão. Entendendo que essa proibição era censura, o STF revogou a decisão e permitiu que entrevista fosse realizada com Lula dentro da prisão.
Além disso, Alexandre de Moraes, ao proibir que imagem de Bolsonaro seja transmitida em redes sociais de terceiros não está apenas penalizando Bolsonaro, mas todos os cidadãos brasileiros que quiserem reproduzir algum vídeo ou áudio do ex-presidente. Ou seja, a decisão de Moraes é um ataque direto aos direitos democráticos do povo brasileiro, especificamente a liberdade de expressão/manifestação do pensamento (art. 5º, IV, CF/88), de comunicação (art. 5º, IX, CF/88) e de informação (art. 220, caput, CF/88). E viola expressamente os §§1º e 2º do art. 220 da Constituição:
Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.
- 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.
- 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.
Não bastando, a decisão de Moraes deixa implícito que ele irá presumir que qualquer transmissão da imagem e voz de Bolsonaro que será feita nas redes sociais de terceiros, será feita sob o conhecimento e ordens de Bolsonaro, com o intuíto de violar a proibição que Moraes impôs ao ex-presidente (de não usar as redes).
Sobre isto, em primeiro lugar, dolo (intenção de fazer uma coisa) não pode ser presumido, o que torna o despacho de Moraes ilegal também nesse aspecto. Em segundo lugar, usar redes não é crime, mas se fosse, Bolsonaro estaria sendo penalizado pelas ações de outras pessoas, o que é uma violação expressa de outro princípio de um Estado de Direito (que Moraes e STF dizem defender), o da intransmissibilidade da pena, previsto no art. 5º XLV da Constituição:
XLV – nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;
O recente despacho de Moraes contra Bolsonaro é uma nova demonstração de que a ditadura que já existe no Brasil é cada vez mais aberta, e continua se intensificando.