Nos dias 15 e 16 de julho, a Colômbia liderou a reação da América Latina e de outros países à barbárie praticada em Gaza. Em muitos aspectos, tratou-se de uma revolução contra o cinismo e a impunidade do imperialismo e de “Israel”. Mais de 30 países, incluindo até mesmo alguns estados europeus, se reuniram na capital colombiana para a Cúpula de Emergência do Grupo de Haia.

Até agora, a América Latina se caracterizou por uma negligência em relação ao genocídio. Poucas manifestações aconteceram e com pouco impacto, se comparadas às que ocorreram nos outros continentes. Tratou-se de uma cúpula, não de uma manifestação de massas, mas foi uma iniciativa fundamental para que todos se mobilizem a partir de agora.

A Colômbia, antes considerada o “Israel” da América do Sul, agora, com a liderança extraordinária de Gustavo Petro, representa o enfrentamento mais efetivo ao imperialismo na região. Petro, que rompeu relações diplomáticas com “Israel” em 2024, colocou a Colômbia em confronto com os Estados Unidos, a Europa e “Israel” por causa de sua firme oposição ao ataque do Estado de ocupação a Gaza.

O imperialismo reagiu da forma esperada, emitindo agressões e ameaças a todos e sancionando a relatora especial da ONU, Francesca Albanese, por seus esforços legítimos e bem fundamentados em caracterizar como crimes de guerra o que estão fazendo as autoridades israelenses e norte-americanas perante o Tribunal Penal Internacional (TPI).

Mais de 30 países participaram, incluindo os oito membros fundadores do Grupo de Haia: Bolívia, Colômbia, Cuba, Honduras, Malásia, Namíbia, Senegal e África do Sul, copresidido pela Colômbia e pela África do Sul. Eles se juntaram a mais de 20 estados da América Latina, África, Ásia e até Europa. A participação de países europeus como Portugal e Espanha foi importante. Desde que o genocídio israelense em Gaza começou no final de 2023, Madri adotou uma série de medidas diplomáticas punitivas. A Espanha cancelou uma compra de munições de € 6,6 milhões (cerca de US$ 7,2 milhões) de uma empresa israelense, descartou um acordo de mísseis antitanque de € 285 milhões (cerca de US$ 310,7 milhões) com a subsidiária espanhola da Rafael Advanced Defense Systems, proibiu armas israelenses nos portos e reconheceu formalmente o Estado palestino, tendo pressionado a União Europeia pela suspensão do Acordo de Associação entre a UE e “Israel”.

O Grupo de Haia publicou um catálogo detalhado de crimes de guerra: o assassinato de mais de 57 mil civis, ataques a hospitais e escolas, a instrumentalização da fome e do cerco e o uso deliberado de deslocamento forçado. O Estado de apartheid na Cisjordânia ocupada, imposto por meio de segregação racial, sistemas jurídicos paralelos e confiscos de terras para assentamentos, foi citado como uma violação clássica da Quarta Convenção de Genebra e, de acordo com a opinião consultiva de 2024 da Corte Internacional de Justiça (CIJ), uma violação das proibições internacionais contra aquisição territorial forçada e apartheid.

Francesca Albanese fez o discurso de abertura da cúpula, alertando para o total descumprimento das normas jurídicas internacionais por “Israel” e seus cúmplices. Em entrevista à imprensa, detalhou o que isso significa: “Cada Estado deve reconsiderar e suspender imediatamente todos os seus laços com ‘Israel’ – suas relações militares, estratégicas, políticas e diplomáticas, tanto em termos de importações quanto de exportações – e garantir que seu setor privado, suas seguradoras, seus bancos, seus fundos de pensão, suas universidades e outros fornecedores de bens e serviços nas cadeias de suprimentos façam o mesmo. Tratar a ocupação como normal se traduz em apoio, ajuda ou assistência à presença ilegal de ‘Israel’ nos territórios palestinos ocupados. Esses vínculos devem ser quebrados com urgência.”

As primeiras medidas

Reunidos no Palácio de San Carlos, delegados de 12 Estados – Bolívia, Colômbia, Cuba, Indonésia, Iraque, Líbia, Malásia, Namíbia, Nicarágua, Omã, São Vicente e Granadinas e África do Sul – anunciaram seis medidas vinculativas. Isso incluiu um embargo total de armas ao Estado ocupante, proibições portuárias a navios militares israelenses, revisões de contratos para acabar com a cumplicidade comercial com a ocupação e forte apoio à condenação criminal das autoridades israelenses.

Apesar dos progressos, subsistem restrições significativas. Apenas 12 Estados adotaram as medidas diretamente. Os demais poderão ainda assinar as decisões até a Assembleia Geral da ONU, em setembro. Potências importantes, como a China, se abstiveram de apoiar as medidas, apesar de apoiarem os objetivos da iniciativa, provavelmente devido a conflitos econômicos com “Israel”, incluindo investimentos em infraestrutura portuária.

Sem ampliar os apoiadores das medidas econômicas, o veto de Washington e a hesitação europeia poderiam neutralizar a insurgência legal do Grupo de Haia. No entanto, a coalizão permanece inflexível de que a justiça não é mais negociável.

O impetuoso confronto do Grupo de Haia com a impunidade israelense marca uma ruptura decisiva, mas o futuro desse levante depende de se potências como China, Índia e Brasil passarem do apoio silencioso para o alinhamento ativo.

Em 16 de julho, quando milhares de pessoas se reuniram na Plaza Bolívar para protestar contra o genocídio em Gaza, a mensagem foi inequívoca: o enfrentamento verdadeiro com o imperialismo vai se dar efetivamente com a rebelião das massas.

O governo Petro não quer a OTAN

São vários os acontecimentos que indicam que a Colômbia tem outra forma de se relacionar com o resto do mundo no governo Petro. A Colômbia tinha sido, por mais de 120 anos, um peão das camarilhas imperiais norte-americanas. As burocracias políticas se vinculavam com a hegemonia econômica das multinacionais e à estrutura militar do Pentágono. A política antidrogas é o caso mais emblemático desse comportamento antinacional.

Com a ascensão ao governo do bloco histórico liderado pelo presidente Gustavo Petro, grandes mudanças sociais, econômicas, culturais e ambientais foram gradualmente implementadas. Os momentos mais importantes dessa transformação têm a ver com a ruptura diplomática com o governo de “Israel”, a entrada na Rota da Seda da China, o choque com o ataque migratório arbitrário de Trump, o desafio às políticas tarifárias de Washington, a entrada no Banco dos BRICS, as relações alternativas com o governo venezuelano de Nicolás Maduro, a solidariedade com o povo da Palestina e o apoio ao povo e ao governo de Cuba. Grandes reformas sociais têm sido implementadas, trazendo mudança para o povo colombiano.

O presidente Petro declarou na reunião do Grupo de Haia que a Colômbia vai se desligar da OTAN devido à sua vinculação com o genocídio em Gaza. A poderosa máquina de guerra imperialista das burguesias europeias busca o domínio completo sobre a Eurásia e, para isso, tem de destruir o Estado russo e conter a República Popular da China, que é a prioridade de Trump.

As mudanças da política externa colombiana terão implicações nas questões internas da Colômbia, que Petro quer que caminhe para a paz, justiça social, econômica e ambiental. A forte liderança do presidente Gustavo Petro é a garantia de sua sustentabilidade.

A intervenção da Venezuela

Em uma carta contundente e extensa, datada de 14 de julho de 2025, em Caracas, o presidente Nicolás Maduro dirigiu-se a seus homólogos Gustavo Petro, da Colômbia, e Cyril Ramaphosa, da África do Sul, mas também aos “povos do mundo”, “aos movimentos em defesa dos direitos humanos”, “à consciência rebelde da humanidade”, “ao heroico povo palestino” e “às nações da Ásia Ocidental”, a fim de expressar o apoio da Venezuela ao povo palestino e denunciar perante a comunidade internacional o que descreve como um genocídio estrutural, histórico e contínuo por parte do regime israelense.

O presidente Maduro inicia sua mensagem elogiando com “esperança e respeito” a convocação de uma “Reunião Ministerial Especial de Emergência promovida pela República da Colômbia em conjunto com a República da África do Sul, no âmbito do Grupo de Haia, a fim de abordar de forma coordenada e urgente as atrocidades que continuam sendo cometidas contra o povo palestino”.

A proposta venezuelana

O presidente venezuelano, em nome da Venezuela, levanta a voz “com firmeza, comovido com o sofrimento do povo palestino e profundamente indignado com a passividade do mundo diante do maior crime da história contemporânea: o genocídio em curso contra a Palestina”.

Como proposta concreta de ação internacional, Maduro propôs “convocar uma Grande Cúpula Mundial pela Paz e Contra a Guerra, com o objetivo de construir uma solução coletiva e firme que pare o massacre, desarme nuclearmente o regime israelense e o obrigue a se submeter ao sistema jurídico internacional”.

Especifica que “esta cúpula deve estruturar uma proposta para uma paz justa, efetiva e duradoura, nascida do povo e não das elites que lucram com a guerra”.

Finalmente, a Venezuela expressa seu “respeito e apoio ao corajoso trabalho da relatora especial das Nações Unidas, Francesca Albanese, sobre a situação dos direitos humanos nos Territórios Palestinos Ocupados”. Seu relatório recente “constitui um ato de dignidade e verdade, pelo qual foi atacada e ameaçada”.

É por isso que o presidente nacional lhe oferece sua “solidariedade ativa” e um “digno reconhecimento de sua coragem e o apelo para que ela não cesse em sua missão, apesar das sanções e estigmatizações a que está sujeita”, e enfatiza que “sua voz é necessária. Sua verdade deixa os poderosos desconfortáveis, mas salvará os oprimidos”.

A carta conclui com uma declaração poderosa de Caracas: “A causa palestina não é uma questão regional ou religiosa. É a linha que separa a justiça da barbárie. É a batalha moral do nosso tempo.”

Com isso, afirma que “defender a Palestina é defender a própria humanidade. Permanecer em silêncio diante da Palestina é trair o espírito de todos os povos que lutaram por sua independência e dignidade”.

Dessa forma, invoca a força do Libertador Simón Bolívar e a “clareza ética e política do Comandante Hugo Chávez”, para reiterar “nossa determinação inabalável de fortalecer a luta até encontrarmos o caminho para a paz duradoura na Palestina”.

A mensagem final é um grito de esperança, mas com compromisso: “A Palestina não está sozinha. A Venezuela está e sempre estará ao seu lado. A Palestina viverá. A Palestina vencerá.”

A carta aberta é, sim, uma carta diplomática, mas também um manifesto ético e político que busca posicionar a defesa da Palestina como uma questão central dos direitos humanos, da justiça internacional e da dignidade humana. Poucos Estados fizeram tais declarações oficialmente, mesmo que escritas em tom firme, emocional e profundamente comprometido.

O governo venezuelano, assim, expressa sua visão de mundo baseada na resistência à dominação imperialista e na defesa dos povos oprimidos, e posiciona a Venezuela como um ator firme e coerente no cenário internacional, com uma política externa baseada na solidariedade, justiça e anti-imperialismo.

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Last Update: 22/07/2025