As recentes restrições da China sobre a exportação de terras raras provocaram uma resposta imediata de empresas e governos ao redor do mundo, que agora intensificam esforços para reduzir a dependência de Pequim no fornecimento desses minerais considerados estratégicos. As movimentações ocorrem em meio à crescente disputa geoeconômica entre China e Estados Unidos.
Em junho, o Ministério do Comércio da China informou que passaria a autorizar apenas exportações qualificadas de terras raras. O governo também declarou estar aberto ao diálogo com outros países, mas a sinalização foi interpretada como parte de um movimento mais amplo de controle sobre recursos essenciais.
As terras raras, grupo de 17 elementos químicos utilizados em produtos eletrônicos, veículos elétricos, equipamentos médicos e sistemas de defesa, tornaram-se tema central na disputa entre grandes potências. Com 90% do refino e 69% da produção mundial concentrados na China, o mercado global responde com projetos em diversas regiões para reduzir o risco de concentração de fornecimento.
Projetos avançam na Austrália, Brasil e Groenlândia
Em 2 de julho, a St George Mining, companhia australiana listada na bolsa de valores, anunciou que iniciou a identificação de zonas minerais em seu projeto localizado em Araxá (MG), no Brasil. A área contém nióbio e elementos de terras raras, e a iniciativa é considerada parte da estratégia para diversificar a origem desses minerais no mercado global.
Duas semanas antes, as empresas norte-americanas Kaz Resources e Cove Kaz Capital comunicaram uma parceria com a empresa geológica estatal do Cazaquistão para realizar estudos no projeto de terras raras de Akbulak. Os testes metalúrgicos e levantamentos de campo visam avaliar a viabilidade econômica da exploração.
Na Groenlândia, a Critical Metals Corp — listada na Nasdaq — anunciou em junho a obtenção de um empréstimo de até US$ 120 milhões concedido pelo Banco de Exportação e Importação dos Estados Unidos. Os recursos serão usados para financiar um projeto de exploração de terras raras no sul do território autônomo.
Em maio, a Lynas Rare Earths, outra companhia australiana, informou que iniciou a produção de óxido de disprósio na Malásia. De acordo com a empresa, trata-se da única operação comercial de separação de terras raras pesadas fora da China atualmente em funcionamento.
Ações governamentais ganham ritmo
Além das iniciativas privadas, governos também têm anunciado medidas para fortalecer a produção e a segurança das cadeias de suprimento. No início de julho, o governo da Índia divulgou investimento de até 50 bilhões de rúpias (cerca de US$ 408 milhões) para impulsionar a extração de terras raras em território nacional.
Em maio, Estados Unidos e Ucrânia assinaram um acordo voltado ao setor mineral. Pelo pacto, Kiev se compromete a garantir o acesso de empresas americanas a projetos com potencial para exploração de terras raras, em troca de investimentos de longo prazo.
Na Austrália, a empresa Earth Rarest declarou que o país pode assumir a posição de segunda maior fonte de terras raras leves do mundo, com estimativa de fornecer entre 15% e 20% da produção global de neodímio e praseodímio, excluindo a China. Ainda assim, a empresa destacou que a substituição completa da China em todos os 17 elementos não é considerada viável no curto prazo.
Especialistas alertam para dificuldades
Apesar do avanço dos projetos, analistas afirmam que a redução da dependência global em relação à China ainda enfrenta obstáculos significativos. Vivek Y. Kelkar, analista independente sediado na Índia, declarou que “a China continuará segurando as cartas por um bom tempo”. Segundo ele, as tentativas de diversificação começaram há anos, mas ainda não avançaram a ponto de representar ameaça ao domínio chinês.
Cameron Johnson, sócio da consultoria Tidwalwave Solutions, baseada em Xangai, avalia que o desafio envolve não apenas tempo e investimento, mas também capacitação técnica. “O tempo necessário é de pelo menos 10 a 20 anos, [e] custa pelo menos trilhões”, afirmou. Johnson questiona a disponibilidade de profissionais especializados. “Quem entende como processar esses materiais? Quem entende como funciona o processo de refino?”, completou.
Kelkar também observou que poucos países criaram estratégias robustas de investimento com apoio estatal. Segundo ele, essa ausência oferece à China uma vantagem prolongada, a menos que haja mobilização internacional coordenada. “A menos que o financiamento global possa ser canalizado de forma eficaz, a posição da China seguirá fortalecida”, disse.
O especialista também destacou que o domínio da China confere ao país poder de precificação, que pode ser usado para gerar incertezas e atrasos em projetos concorrentes. “A participação de mercado dominante da China lhe confere poder de precificação”, explicou. Em contraste, segundo Kelkar, os Estados Unidos, sob a liderança de Donald Trump, demonstram hesitação em implementar mecanismos de financiamento público vinculados a subsídios.
Disputa se expande para África e América Latina
A crescente rivalidade sino-americana se estende agora a regiões como África e América Latina. Kelkar apontou para iniciativas dos EUA em países como Angola, Ruanda e Arábia Saudita, com o objetivo de garantir acesso seguro a fontes alternativas de terras raras.
O movimento é parte de um esforço mais amplo para proteger cadeias de fornecimento consideradas estratégicas. Segundo analistas, a próxima fase da disputa entre Washington e Pequim será marcada pela corrida por minerais essenciais, com impacto direto sobre a política externa e os fluxos de investimento.
Com informações da SCMP