Em discursos na 17ª Cúpula do BRICS, presidente brasileiro condena genocídio em Gaza, critica paralisia da ONU e propõe reforma da governança global
Por Manus AI
Rio de Janeiro, 7 de julho de 2025
A 17ª Cúpula do BRICS, realizada no Rio de Janeiro em 6 de julho, marcou um momento histórico para o bloco que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Pela primeira vez, os chefes de Estado dos países parceiros participaram formalmente do encontro, consolidando a expansão mais significativa da organização desde sua criação.
Em dois discursos contundentes, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva posicionou o Brasil como uma das principais vozes críticas à ordem internacional vigente, denunciando o que chamou de “Plano Marshall às avessas” e defendendo reformas profundas na governança global.
“Esta 17ª Cúpula no Rio de Janeiro coroa a histórica expansão do BRICS”, declarou Lula, destacando que “os países convidados trazem consigo perspectivas de diferentes contextos regionais que enriquecem a articulação de uma visão própria do Sul Global”.
Sistema Financeiro Internacional sob Ataque
Uma das declarações mais impactantes do presidente foi sua caracterização do sistema financeiro internacional como um “Plano Marshall às avessas”. Em crítica direta às instituições de Bretton Woods, Lula afirmou que “as estruturas do Banco Mundial e do FMI sustentam um Plano Marshall às avessas, em que as economias emergentes e em desenvolvimento financiam o mundo mais desenvolvido”.
A analogia histórica inverteu a narrativa tradicional sobre fluxos de capital global. Enquanto o Plano Marshall original representou a transferência de recursos dos Estados Unidos para a reconstrução da Europa pós-Segunda Guerra, Lula denunciou um sistema onde os países em desenvolvimento subsidiam as economias mais ricas.
O presidente fundamentou sua crítica com dados sobre concentração de riqueza: “Três mil bilionários ganharam 6,5 trilhões de dólares desde 2015”, contrastando esta acumulação com a escassez de recursos para desenvolvimento. “Os fluxos de ajuda internacional caíram e o custo da dívida dos países mais pobres aumentou”, observou.
A distorção de representatividade nas instituições financeiras também foi alvo de críticas. “Para fazer jus ao nosso peso econômico, o poder de voto dos membros do BRICS no FMI deveria corresponder pelo menos a 25% – e não os 18% que detemos atualmente”, declarou Lula.
Paralisia da ONU aos 80 Anos
A crítica à governança global atingiu seu ponto mais contundente ao abordar a paralisia das Nações Unidas. “A ONU completou 80 anos no último dia 26 de junho e presenciamos colapso sem paralelo do multilateralismo”, declarou o presidente.
O diagnóstico sobre o Conselho de Segurança foi severo: “As reuniões do Conselho de Segurança da ONU reproduzem um enredo cujo desfecho todos conhecemos: perda de credibilidade e paralisia. Ultimamente sequer é consultado antes do início de ações bélicas”.
Lula conectou a paralisia institucional com o ressurgimento de ameaças globais: “O temor de uma catástrofe nuclear voltou ao cotidiano”, vinculando este fenômeno às “violações recorrentes da integridade territorial dos Estados”.
A inversão de prioridades orçamentárias globais também foi criticada: “É mais fácil destinar 5% do PIB para gastos militares do que alocar os 0,7% prometidos para Assistência Oficial ao Desenvolvimento. É sempre mais fácil investir na guerra do que na paz”.
Posicionamentos Firmes sobre Gaza e Ucrânia
Os discursos foram marcados por posicionamentos claros sobre os principais conflitos internacionais. Em relação ao Oriente Médio, Lula adotou postura equilibrada mas firme: “Absolutamente nada justifica as ações terroristas perpetradas pelo Hamas. Mas não podemos permanecer indiferentes ao genocídio praticado por Israel em Gaza e a matança indiscriminada de civis inocentes e o uso da fome como arma de guerra”.
O presidente apresentou solução concreta: “A solução desse conflito só será possível com o fim da ocupação israelense e com o estabelecimento de um Estado palestino soberano, dentro das fronteiras de 1967”.
Sobre a Ucrânia, manteve a linha diplomática de soluções negociadas: “É urgente que as partes envolvidas na guerra na Ucrânia aprofundem o diálogo direto com vistas a um cessar-fogo e uma paz duradoura”. Destacou a iniciativa conjunta com a China: “O Grupo de Amigos para a Paz, criado por China e Brasil e que conta com a participação de países do Sul Global, procura identificar possíveis caminhos para o fim das hostilidades”.
Soberania Tecnológica e Inteligência Artificial
Lula apresentou visão estratégica sobre soberania tecnológica, declarando que “o desenvolvimento da Inteligência Artificial não pode se tornar privilégio de poucos países ou um instrumento de manipulação na mão de bilionários”.
A “Declaração sobre Governança da Inteligência Artificial” adotada pelo BRICS foi apresentada como marco: “As novas tecnologias devem atuar dentro de um modelo de governança justo, inclusivo e equitativo”.
Em infraestrutura digital, anunciou iniciativa ambiciosa: “Fazer um estudo de viabilidade para o estabelecimento de cabos submarinos ligando diretamente membros do BRICS aumentará a velocidade, a segurança e a soberania na troca de dados”.
Sobre sistemas de pagamento, contrastou: “Enquanto o unilateralismo cria barreiras ao comércio, nosso bloco trabalha por sistemas de pagamento transfronteiriços mais rápidos, baratos e seguros”.
BRICS como Herdeiro do Movimento Não-Alinhado
Lula posicionou o BRICS como continuador histórico da resistência do Sul Global: “O BRICS é herdeiro do Movimento Não-Alinhado”, estabelecendo continuidade entre a resistência à bipolaridade da Guerra Fria e a atual oposição ao unilateralismo.
A referência à Conferência de Bandung reforçou esta conexão: “A Conferência de Bandung refutou a divisão do mundo em zonas de influência e avançou na luta por uma ordem internacional multipolar”.
O papel do bloco foi definido claramente: “O BRICS é ator incontornável na luta por um mundo multipolar, menos assimétrico e mais pacífico”.
Reformas Urgentes da Governança Global
As propostas de reforma constituíram programa abrangente de transformação. Para o Conselho de Segurança, Lula defendeu “incluir novos membros permanentes da Ásia, da África e da América Latina e do Caribe”, caracterizando como questão de sobrevivência: “É garantir a própria sobrevivência da ONU”.
A urgência foi enfatizada: “Cada dia que passamos com uma estrutura internacional arcaica e excludente é um dia perdido para solucionar as graves crises que assolam a humanidade”.
O Novo Banco de Desenvolvimento foi elogiado como alternativa funcional: “O ingresso da Argélia, e o processo de adesão da Colômbia, Uzbequistão, Peru e todos os demais que a companheira Dilma Rousseff anunciou, atestam a capacidade do Banco de oferecer financiamento para transição justa e soberana”.
Agenda de Desenvolvimento e Justiça Tributária
Lula apresentou diagnóstico severo sobre o financiamento do desenvolvimento: “Na Conferência de Sevilha, encerrada na semana passada, ficou evidente que a Agenda 2030 não recebeu recursos suficientes”.
A proposta centrou-se na reforma tributária global: “Justiça tributária e combate à evasão fiscal são fundamentais para consolidar estratégias de crescimento inclusivas e sustentáveis”. O BRICS assumiu protagonismo através da “Declaração do BRICS em apoio à negociação de uma ‘Convenção Quadro da ONU sobre Cooperação Tributária Internacional’”.
A 17ª Cúpula do BRICS no Rio pode ser lembrada como momento de consolidação da identidade do bloco como alternativa ao modelo ocidental, com o Brasil assumindo liderança intelectual nesta transformação.