Um acordo recentemente assinado pelo Ministério de Minas e Energia (MME) pode beneficiar em bilhões de reais a empresa Âmbar Energia, que faz parte do grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista. A empresa foi contratada para construir energias termelétricas e não entregou o serviço – o que levaria à suspensão do contrato. Entretanto, a empresa conseguiu manter o acordo, que pode render 9,4 bilhões de reais.

As informações são do jornalista Breno Pires, da revista piauí, que teve acesso ao despacho assinado pelo ministro da pasta, Alexandre Silveira, no último dia 18 de abril, quando o acordo foi selado. O documento foi mantido sob sigilo.

A empresa foi contratada originalmente em 2021, ainda sob o governo de Jair Bolsonaro (PL). Na ocasião, foi escolhida para entregar quatro usinas termelétricas, em meio a um risco de crise hídrica. Ao não cumprir o combinado, a empresa deveria pagar multas de 6 bilhões de reais, junto à rescisão dos contratos.

Conforme mostrou a piauí, as multas por descumprimento ficaram em 1,1 bilhão de reais, bem abaixo dos 9,4 bilhões relativos ao novo acordo.

Para entender

O caso não é de simples compreensão.

A empresa dos irmãos Batista sequer participou do leilão original que levou à contratação emergencial das termelétricas, mas comprou os direitos de geração de energia que tinham sido arrematados por outra empresa. A Âmbar, então, arrendou usinas e pediu autorização especial à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para usá-las em vez de construir novas estruturas. O pedido foi aceito, mas depois foi revisto, já que os contratos determinavam que a produção deveria ser feita por novas térmicas.

A piauí apontou, ainda, que a decisão da Aneel que favoreceu a Âmbar foi tomada pelo então diretor Efrain Cruz, que deixou a agência em março de 2023 e assumiu cargo de secretário-executivo – o segundo posto mais importante – do MME. Ainda naquele mês, o ministério, em documento assinado por Silveira, encaminhou ao Tribunal de Contas da União (TCU) um pedido de solução consensual entre a empresa dos Batista, a agência reguladora e o governo.

Os técnicos do TCU chegaram a publicar manifestação favorável, mas depois recomendaram a rejeição do acordo, diante das dificuldades técnicas mostradas pela empresa na tentativa de entregar a energia contratada. O representante do Ministério Público no Tribunal de Contas chegou a chamar o serviço de “um evidente fracasso”.

Ainda assim, a Secretaria de Controle Externo de Solução Consensual e Prevenção de Conflitos do TCU, em decisão assinada pelo secretário Nicola Khoury, tomou uma decisão que contraria a própria ideia de consenso e ignorou os pareceres dos auditores que fizeram a análise. Na sessão que discutiu o caso no Tribunal de Contas, o relator chegou a recomendar a rejeição do acordo, mas disse ter “simpatia” pela proposta.

As sinalizações positivas vindas do TCU anteciparam a decisão do MME de fechar o acordo com a empresa dos irmãos Batista. Em poucos dias, e antes mesmo da manifestação da Aneel naquele contexto, o acordo saiu do ministério, passou pela Advocacia-Geral da União (AGU) e retornou à pasta comandada por Alexandre Silveira para o despacho ser assinado.

Ao assinar o documento – ao qual a revista piauí teve acesso –, Silveira ignorou problemas apontados pelos auditores do TCU, e alegou que o acerto era uma alternativa melhor que a judicialização. “Não nos parece restar outra alternativa a não ser firmar o acordo, inclusive para não penalizar ainda mais os consumidores de energia, diante de uma praticamente certa demanda judicial, com risco elevado, que virá caso o cenário de indefinições perdure ainda mais”, escreveu o ministro.

Os contratos, a princípio, entram em vigor em 22 de julho. A empresa conquistou o direito de operar uma usina térmica antiga de Cuiabá (e não apenas estruturas novas), e teve o prazo dobrado – os contratos, antes de 44 meses, passaram a ter duração de 88. A energia passará a ser fornecida sob demanda.

À piauí, o Ministério das Minas e Energia defendeu o acordo assinado com a Âmbar Energia, destacando a cobrança das multas. A pasta afirmou, ainda, que o acerto teve aprovação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

A Âmbar também se manifestou, afirmando que “as vantagens de um acordo são tão significativas que o próprio TCU recomendou, em plenário, que as partes buscassem o consenso direto para evitar a judicialização”.

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Última Atualização: 09/07/2024