O governo brasileiro respondeu oficialmente às críticas publicadas pela revista britânica The Economist, que apontou uma suposta perda de relevância internacional do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e classificou sua postura como “cada vez mais hostil” ao Ocidente. Em nota enviada à publicação nesta terça-feira (1º), o chanceler Mauro Vieira defendeu a política externa do Brasil e afirmou que o país atua de forma coerente com os princípios do direito internacional.
A carta foi entregue por meio da embaixada do Brasil em Londres e responde a uma reportagem da The Economist que destacou o posicionamento do governo brasileiro diante de ataques dos Estados Unidos a instalações nucleares no Irã. Segundo a revista, a posição de Lula diverge da adotada por “todas as outras democracias ocidentais”, que se omitiram ou apoiaram as ações americanas.
Na reportagem, a revista também criticou o fato de o Brasil não ter declarado apoio ao argumento de que Israel teria agido em legítima defesa ao atacar Teerã. A publicação associou ainda o posicionamento do Brasil a uma suposta aproximação com o Irã, indicando que essa relação será reforçada durante a próxima cúpula do BRICS, marcada para a semana seguinte no Rio de Janeiro.
Carta do chanceler nega omissão e reforça compromisso com a ONU
Na carta enviada à revista, Mauro Vieira afirma que “as críticas brasileiras aos bombardeios contra o Irã decorrem do entendimento de que esses ataques violam a Carta das Nações Unidas e as normas básicas da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)”.
O texto argumenta que a postura do governo brasileiro se baseia em normas destinadas a evitar contaminação radioativa e desastres ambientais de grande escala. “Essas ações específicas são uma flagrante transgressão da Carta da ONU”, afirmou Vieira. Ele também reiterou que o Brasil não adota critérios seletivos na defesa do direito internacional.
Segundo um diplomata ouvido pela Folha de S.Paulo, o Brasil entende que mesmo países considerados democracias consolidadas adotam, por vezes, “dois pesos e duas medidas”. O representante indicou que o governo brasileiro não pretende repetir posicionamentos anteriores que, segundo ele, ferem o direito internacional.
Lula critica ações no Oriente Médio e rejeita acusações de omissão
De acordo com a nota do Ministério das Relações Exteriores, o presidente Lula manifestou “grave preocupação com a escalada militar no Oriente Médio” e condenou os ataques de Israel e dos Estados Unidos a instalações nucleares iranianas. “Em violação à soberania do Irã e do direito internacional”, declarou.
Em resposta à insinuação de omissão diante da crise humanitária em Gaza e na Cisjordânia, o governo brasileiro afirmou que “não hesita em condenar os atos de violência” contra civis palestinos. O posicionamento foi citado como um contraste com o comportamento de outras nações que, segundo a avaliação do Itamaraty, não demonstraram a mesma disposição.
Críticas à ausência de encontros com Trump
A The Economist também destacou que o presidente Lula “nunca fez esforço” para se reunir com o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, o que seria, segundo a publicação, um indício de afastamento do Brasil em relação a aliados ocidentais tradicionais. O governo brasileiro não comentou diretamente essa observação, mas reiterou que o país se posiciona com base em princípios multilaterais.
Defesa do BRICS e da liderança no G20
Na carta enviada à revista, o chanceler afirmou que “o Brasil vê o BRICS como ator incontornável na luta por um mundo multipolar, menos assimétrico e mais pacífico”. O texto indica que a presidência brasileira do grupo será usada para reforçar a cooperação política e para defender reformas na governança global.
O governo também lembrou que o presidente Lula liderou a criação de uma aliança global contra a fome e a pobreza no G20 e apresentou uma proposta de taxação de bilionários, mesmo diante da resistência de setores empresariais. “Poucos líderes mundiais, como o Presidente Lula, podem dizer que sustentam com a mesma coerência os quatro pilares essenciais à humanidade e ao planeta: democracia, sustentabilidade, paz e multilateralismo”, afirmou Mauro Vieira.
Rejeição a políticas armamentistas
A carta enviada à revista também faz referência à guerra na Ucrânia. O governo brasileiro reiterou sua condenação à invasão russa e voltou a defender a busca por uma resolução diplomática para o conflito. Segundo o chanceler, essa posição foi manifestada ainda em 2023.
O texto afirma ainda que Lula critica a ampliação dos gastos militares em detrimento de políticas sociais e ambientais. “Diante de uma nova corrida armamentista, ele está entre os líderes que denunciam a irracionalidade de investir na destruição, em detrimento da luta contra a fome e o aquecimento global.”
A resposta termina com uma avaliação sobre o papel do Brasil no cenário internacional: “Como um país que não tem inimigos, o Brasil é também um defensor consistente do direito internacional e da resolução de disputas por meio da diplomacia.”