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Um dos precursores do modelo de integração na inovação da saúde brasileira, Carlos Gadelha abriu mais uma discussão de alto nível sobre políticas públicas no Projeto Brasil, em entrevista exclusiva que foi ao ar nesta quarta-feira (02), na TVGGN.
Carlos Augusto Grabois Gadelha, formulador de políticas públicas-chave no país desde 2003, comandando secretarias do Ministério da Saúde, da Integração Nacional e do Desenvolvimento Industrial, lidera hoje grupos de pesquisa da Fiocruz.
Na conversa, ele discutiu uma nova abordagem para a política industrial brasileira, enfatizando a integração multissetorial e a resolução de problemas sociais como propulsores do desenvolvimento. O tema abriu um dos importantes Fóruns de discussão do Projeto Brasil, “Políticas Integrativas para a Saúde”. Cadastre-se e participe dessa discussão aqui.
Gadelha lembrou a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP), um modelo de política de desenvolvimento produtivo implementado com sucesso na saúde no Brasil, que utilizou o poder de compra estatal do SUS e a transferência de tecnologia para fortalecer a indústria farmacêutica, em laboratórios públicos e privados, com os genéricos.
“Só no caso da saúde, conseguimos alavancar R$ 20 bilhões de investimentos públicos nos 2 últimos anos. E, ao contrário dessa visão precária que coloca em oposição o investimento público e o privado, ao sinalizar que haveria mercado para inovação e produção local, o investimento público de R$ 20 bilhões alavancou um investimento privado duas vezes maior, de R$ 40 bilhões”, exemplificou.
Aliado ao exemplo da saúde, ele defendeu que também para outros setores, a compra pública não deve ser vista apenas como um meio para somente desenvolver indústria e inovação, mas como uma forma de aliar a política industrial e de inovação aos grandes desafios do país.
“O principal gargalo para a inovação e para a transformação produtiva é ter um horizonte de mercado estável, ou seja, o que a gente assiste é dramático, cerca de 90% das patentes do mundo estão concentradas no campo da biotecnologia ou da inteligência artificial, que pegando todos os setores estão concentrados em apenas 10 países”, disse.
“A gente sabe que tem que passar por um processo profundo de mudança nas assimetrias globais, na dependência global e a questão da garantia do mercado interno, da garantia das compras públicas como grande farol para orientar o investimento público e privado”, completou.

O especialista expôs a necessidade de replicar esse modelo em outros setores, visando um crescimento econômico que seja inovador, sustentável e capaz de enfrentar os desafios sociais e ambientais do Brasil.
“O Brasil tem tudo para alavancar e cooperar com a América Latina, com África, com os BRICs. Colocar isso numa escala global é utilizar o mercado para o desenvolvimento, não apenas como consumo, mas o mercado como uma grande alavanca para o desenvolvimento produtivo e inovação”, introduziu.
“É uma mudança paradigmática, onde a gente deixa de ter políticas apenas para setores ou para determinadas empresas, os ‘vencedores’, digamos assim, e os próprios problemas da sociedade, as necessidades da sociedade revelada na política de saúde, na política de educação, ambiental, de inclusão social, agricultura familiar, entre tantas outras, os problemas nacionais se tornam foco da política de desenvolvimento. É a colagem, a soldagem da política de desenvolvimento produtivo e da política de inovação com os grandes desafios nacionais”, acrescentou.
Carlos Gadelha também discutiu a impossibilidade de se ter uma política social robusta sem indústria e inovação, nem uma política industrial que reproduza um modelo de crescimento com alta desigualdade no país.
“Celso Furtado é o nosso grande ícone, porque ele já pensava essas dimensões de modo integrado, mas se coloca como uma necessidade premente de uma superação, com grande respeito e incorporação do que a gente conseguiu no passado no desenvolvimento brasileiro.”
“Na trajetória brasileira, a gente ter que saudar os nossos desenvolvimentas, o que seria do Brasil sem Getúlio Vargas, sem Juscelino Kubitschek, mas está no momento em que ou a gente traz a política industrial e de inovação para as necessidades sociais ou vai ser insustentável a gente ter indústria, ter inovação e ser um dos países mais desiguais do mundo”, expôs.