Estamos assistindo, no Brasil e no mundo, ao esgotamento de um modelo econômico que só conhece a linguagem da exploração, da exclusão e da concentração de riquezas. O capitalismo global, em sua fase mais predatória, multiplica crises, destrói territórios e condena as maiorias à precariedade. Mas há outras formas de organizar a economia, e elas já florescem nos territórios de resistência do nosso país. A experiência da Economia Solidária na Bahia, com suas redes de cooperativas, associações, empreendimentos autogestionários e políticas públicas ousadas, mostra que é possível construir um modelo econômico centrado na vida, na dignidade e na soberania popular. Da Bahia para o Brasil, é hora de afirmar que a Economia Solidária é mais do que uma alternativa: é uma necessidade histórica diante do fracasso do capitalismo.
O Nordeste brasileiro sempre foi muito mais do que o estigma da seca ou da pobreza imposta historicamente pelas elites. É, sobretudo, um território de resistência, criatividade popular e construção de alternativas. Foi ali que brotaram algumas das experiências mais vibrantes de organização popular, de luta pela terra, pela água, pelos direitos das mulheres, dos povos originários, das comunidades tradicionais e da juventude periférica.
Nesse caldo de cultura política e social, que bebeu na fonte secular das práticas coletivas dos Quilombos, Terreiros, Comunidade Indígenas e Tradicionais, a Economia Solidária encontrou terreno fértil para florescer como uma prática cotidiana de sobrevivência e autonomia. Antes mesmo de ser reconhecida como política pública, já era vivida nas feiras, nos quintais produtivos, nos mutirões, nas cooperativas populares e nas redes de trocas que garantiram vida digna a milhares de famílias.
O Nordeste, em especial a Bahia, não esperou ordens do mercado ou autorização do capital financeiro para inventar sua própria economia. Foi a partir da escassez imposta e da exclusão sistêmica que o povo nordestino ergueu suas próprias soluções, combinando saberes tradicionais, práticas ancestrais e tecnologias sociais inovadoras.
Hoje, essas experiências acumulam um saber estratégico para o Brasil inteiro. São lições de como, mesmo em contextos adversos, é possível construir economias baseadas na cooperação, na solidariedade e na soberania dos territórios. O que a Bahia faz não é só resistir: é inovar. E essa inovação popular precisa ser reconhecida como uma referência nacional.
Na Bahia, a Economia Solidária deixou de ser apenas uma prática comunitária e assumiu o status de política pública de Estado. O governo baiano, através da Superintendência de Economia Solidária (SESOL), vinculada à Secretaria do Trabalho, Emprego, Renda e Esporte (SETRE), consolidou uma política robusta, com investimentos diretos, articulação de redes produtivas e apoio técnico aos empreendimentos populares.
Programas como o Bahia Solidária demonstram, com números concretos, o impacto dessa política. Nos últimos três anos, foram injetados mais de R$ 60 milhões em ações de fortalecimento da Economia Solidária, beneficiando mais de 75 mil pessoas em 19 territórios de identidade. Esses recursos chegam na ponta, organizam cadeias produtivas, fortalecem a economia local e garantem que comunidades historicamente invisibilizadas tenham acesso a trabalho e renda de forma autônoma e digna.
Os Centros Públicos de Economia Solidária (CESOL) são o braço estratégico dessa política. Presentes em diversas regiões do estado, são 17 unidades e mais 06 em fase de implantação, os CESOLs oferecem suporte técnico, capacitação, apoio à comercialização e articulação entre empreendimentos, permitindo que essas iniciativas não apenas sobrevivam, mas se tornem sustentáveis e competitivas em seus territórios. Trata-se de uma política que aposta na autogestão, na organização coletiva e na inteligência popular como motor do desenvolvimento.
Mais do que uma ação emergencial, a Bahia afirma a Economia Solidária como estratégia de desenvolvimento territorial, combate às desigualdades estruturais e afirmação da soberania popular. Uma economia que nasce do povo, com o povo e para o povo.
A experiência da Bahia e do Nordeste mostra que é possível construir um modelo econômico alternativo, ancorado no protagonismo popular e no fortalecimento dos territórios. O que vem sendo feito na região não é um experimento isolado, mas uma prática consolidada que pode – e deve – inspirar políticas públicas em todo o Brasil.
O caminho percorrido na Bahia comprova que a Economia Solidária não é apenas uma estratégia de combate à pobreza, mas uma proposta concreta de desenvolvimento, que valoriza o trabalho coletivo, respeita os saberes locais, protege o meio ambiente e constrói autonomia econômica real para as comunidades. É um modelo que enfrenta de frente o desemprego estrutural, a fome e a exclusão, oferecendo alternativas viáveis, sustentáveis e de longo prazo.
Nesse sentido, o desafio que se coloca é nacionalizar essas práticas, reconhecendo que as respostas para a crise civilizatória do capitalismo podem, e devem, vir das margens, dos sertões, das periferias, dos territórios invisibilizados. A Bahia está pronta para compartilhar suas experiências, seus aprendizados e seus erros, contribuindo para a construção de uma política nacional de Economia Solidária que seja robusta, estruturante e permanente.
Ao invés de importar soluções de fora, é hora do Brasil olhar para dentro, ouvir o povo e reconhecer que a Economia Solidária que pulsa no Nordeste é uma chave estratégica para um futuro mais justo, democrático e popular.
A Economia Solidária não é uma promessa distante, tampouco uma utopia romântica. Ela já é realidade concreta em milhares de comunidades que encontraram, na organização coletiva e na autogestão, o caminho para garantir sua sobrevivência com dignidade, fortalecendo suas culturas, territórios e economias locais.
A experiência da Bahia prova que, com vontade política, é possível transformar essas práticas em políticas públicas de Estado, garantindo escala, sustentabilidade e reconhecimento institucional. Frente ao esgotamento do modelo capitalista, que segue concentrando riqueza e disseminando miséria, a Economia Solidária se apresenta como uma alternativa prática, popular e profundamente enraizada na realidade brasileira.
Da Bahia para o Brasil, esse é o convite: olhar para o que o povo já constrói nas suas redes de solidariedade, nas cooperativas, nas feiras, nos quintais e transformar essas práticas em políticas nacionais. Porque sim, uma outra economia é possível, e ela já está em movimento.