Uma sessão solene ocorrida nessa quarta-feira (2) na Câmara dos Deputados, em Brasília, relembrou hoje os 77 anos da Nakba, a “catástrofe” palestina. O evento, requerido pelos deputados Padre João (PT-MG) e Paulo Pimenta (PT-RS), serviu como tribuna para denunciar o genocídio o apartheid imposto por “Israel”, culminando em um apelo contundente pela ruptura das relações diplomáticas e comerciais do Brasil com o Estado sionista.

A mesa foi composta por figuras proeminentes da causa palestina e aliados, incluindo o Embaixador do Estado da Palestina no Brasil, Ibrahim Alzeben, o Dr. Ahmed Shehada, presidente do Instituto Brasil-Palestina (Ibraspal), e o Rabino Israel Dovid Weiss.

Assumindo a presidência da sessão, o deputado Padre João iniciou sua fala descrevendo a Nakba, quando em maio de 1948, arrancou mais de 750 mil palestinos de suas terras ancestrais, destruindo mais de 400 aldeias e vilarejos. Ele enfatizou que os efeitos dessa catástrofe nunca foram omitidos do mundo, com organismos internacionais documentando e denunciando as sistemáticas violações dos direitos fundamentais do povo palestino.

Padre João trouxe à tona a alarmante realidade atual, destacando que mais de nove  milhões de refugiados palestinos vivem espalhados pelo mundo e que, desde outubro de 2023, a Faixa de Gaza tem sido palco de uma escalada de violência sem precedentes. Ele citou números chocantes: mais de 55 mil vidas ceifadas, incluindo mais de 19 mil crianças e 20 mil mulheres, além de médicos, enfermeiros, professores e jornalistas. Mais de 11 mil pessoas permanecem desaparecidas. “Isso não são meros números estatísticos. Cada vida perdida representa sonhos interrompidos, famílias destroçadas”, afirmou, sublinhando que “a fome nunca pode ser normalizada como tática militar”.

O deputado ressaltou o papel fundamental do Brasil, guiado por sua Constituição Federal, que preza pela paz, cooperação e autodeterminação dos povos. Ele instou a Câmara a não se omitir diante de questões que afetam a dignidade humana globalmente. Padre João mencionou o crescente movimento internacional de reconhecimento do Estado da Palestina, citando países do Caribe e da Europa que recentemente tomaram essa decisão, elevando o total para mais de 140 nações. “Não haverá paz duradoura no Oriente Médio sem o reconhecimento dos direitos legítimos do povo palestino”, declarou.

Finalizando seu pronunciamento, o deputado reiterou a importância da Palestina como berço das três grandes religiões monoteístas e clamou pelo fim da impunidade dos crimes contra a humanidade. Em um apelo emocionado, ele pediu ao Presidente Lula que o Brasil corte todas as relações com Israel, qualificando-a como a “catástrofe” e o “genocídio em curso”.

Após o Padre João, o Embaixador da Palestina, Ibrahim Alzeben, descreveu a Nakba como o “início da longa trajetória de sofrimento, exílio e resistência” de seu povo. Ele reforçou que, após 77 anos, a luta pelos direitos inalienáveis – retorno, autodeterminação e estabelecimento do Estado independente e soberano com Jerusalém como capital – persiste. O Embaixador expressou “profunda gratidão ao Brasil” e ao Presidente Lula, que, segundo ele, tem sustentado “com coragem consciente a bandeira da solidariedade”, mesmo diante de acusações falsas de antissemitismo.

Já o Dr. Ahmed Shehada, presidente do Ibraspal, reiterou que a Nakba não foi um evento isolado, mas o “marco inicial de uma catástrofe contínua”, originada pela “usurpação violenta” de terras e a “expulsão forçada” do povo palestino. Ele classificou os sionistas como “gangues terroristas” que se transformaram no “exército terrorista mais monstruoso do mundo”.

Em sua fala, Shehada afirmou que “Israel” busca “eliminar por completo a presença palestina”, através de anexações e expansão de assentamentos ilegais na Cisjordânia, e uma “guerra de extermínio” em Gaza. Ele apresentou dados alarmantes: mais de 55 mil palestinos mortos desde outubro de 2023, a maioria mulheres e crianças, e dezenas de milhares sob escombros.

Shehada destacou que dois terços dos habitantes de Gaza são refugiados, expulsos de suas terras em 1948, com direito ao retorno pela Resolução 194 da ONU. Ele lembrou que o reconhecimento de Israel pela ONU foi condicionado ao cumprimento das resoluções, o que, segundo ele, não ocorreu.

O presidente do Ibraspal também abordou a situação nas prisões israelenses: mais de 9.900 palestinos presos, incluindo 250 crianças, submetidos a torturas e detenção administrativa. Shehada ainda afirmou, com base no direito internacional, que a resistência de um povo sob ocupação militar estrangeira é legítima, citando resoluções da ONU que o Brasil inclusive votou a favor. Ele condenou a “tentativa de rotular toda forma de resistência como terrorismo”, que visa “negar à Palestina o que foi reconhecido a tantos povos anteriormente colonizados”.

Após a fala do Dr. Ahmed Shehada, o deputado Paulo Pimenta (PT-SP) ressaltou a importância de sessões como essa para que as famílias palestinas saibam que “não estão sozinhas”, enfatizando que o momento atual é uma “encruzilhada civilizatória”. “O silêncio neste momento é sinônimo de cumplicidade”, afirmou.

Pimenta destacou o papel histórico do Brasil como um dos primeiros países a reconhecer o Estado Palestino e a “enorme coragem” do presidente Lula pela denúncia do genocídio em Gaza. Ele, porém, defendeu que o Brasil vá além do protesto e da solidariedade, tomando “medidas concretas”. Assim como o Padre João, o deputado defendeu um “gesto formal de rompimento do governo brasileiro com o Estado de Israel”.

Ualid Rabah, da Federação Árabe-Palestina do Brasil (Fepal), classificou a Nakba como a “maior limpeza étnica de todos os tempos na história humana”, onde 78% do território palestino foi tomado à força e 88% da população foi morta ou expulsa. Ele relembrou a destruição de 531 localidades, algumas com 10 mil anos de história, qualificando-o como “um crime de lesa-humanidade contra o patrimônio histórico da civilização humana”.

Rabah denunciou que, no momento atual, está ocorrendo o “maior genocídio de todos os tempos em números proporcionais”. Ele citou relatórios que indicam que o número de mortos em Gaza pode ser muito superior aos 68.679 identificados, chegando a 177 mil, ou até 250 mil segundo a revista The Lancet, o que representaria até 13% da demografia de Gaza.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) reiterou que a Nakba é um “projeto de extermínio de um povo, é o projeto de limpeza étnica”.

“Esse projeto tá aí, mas tá se desmascarando, tá ficando claro qual é a sua intenção e a violência com que é tratado esse projeto. E é um projeto do estado sionista.”

Em um dos momentos mais impactantes da sessão, o Rabino Yisroel Dovid Weiss se apresentou como representante da voz dos judeus fiéis à Torá em todo o mundo. Ele expressou horror e vergonha pela “opressão, tortura e genocídio horrendos” perpetrados em Gaza “em nome da religião judaica e do povo judeu”.

O Rabino fez uma distinção fundamental entre judaísmo e sionismo, esclarecendo a “autêntica posição religiosa judaica” sobre a ocupação da Palestina e a existência do Estado sionista de “Israel”. Ele afirmou que, de acordo com os fundamentos da fé judaica, os judeus são “proibidos de criar sua própria soberania” e que é “absolutamente proibido criar uma soberania através de ocupação, roubo e assassinato”.

Weiss relembrou a “convivência pacífica entre árabes e muçulmanos e judeus que existiu durante muitos séculos em todos os países árabes e muçulmanos, inclusive na Palestina”, e que “a diferença de religião nunca foi causa de conflito”. Ele concluiu que “a ocupação sionista da Palestina é a causa principal do derramamento de sangue trágico e contínuo“.

O Rabino ainda declarou enfaticamente que “ser contra o Estado sionista de ‘Israel’ não é ser contra os judeus, nem ser antissemita”. Pelo contrário, “o Estado de Israel é a personificação e a definição mais clara do antissemitismo”, pois age falsamente em nome de todos os judeus. Seu apelo final foi claro:

“A Palestina deve ser devolvida ao povo palestino e o movimento sionista deve terminar. Os líderes mundiais devem agir agora imediatamente para acabar com o genocídio em Gaza e ajudar a pôr fim à ocupação por completo.”

A deputada Maria do Rosário iniciou sua intervenção reforçando que a sessão se encontrava em prol do direito humanitário internacional, “anterior inclusive a definições de direitos humanos”. Ela destacou a “crise humanitária em pleno século XXI” e a urgência de “dar um fim à violência, dar um fim aos bombardeios e salvar vidas”.

“É agora, neste momento, que nós não podemos nos calar”, enfatizou. Ela classificou as ações em Gaza como um “crime contra a humanidade”, atribuindo a responsabilidade a quem governa “Israel” e ao “apoio do Presidente Trump”.

Thiago Ávila, coordenador da Flotilha da Liberdade,  explicou que a missão da Flotilha só existe “porque os governos falharam com o povo palestino”. Ávila detalhou o projeto colonial que, de 1947 a 1949, expulsou 750 mil famílias e destruiu mais de 530 vilarejos, iniciando um processo de limpeza étnica.

Ele apresentou números aterrorizantes sobre o genocídio em Gaza, que já matou mais de 68 mil pessoas identificadas, podendo chegar a 250 mil. Destacou os mais de 10 mil amputados sem anestesia, 317 trabalhadores da ONU, 1000 médicos e 215 jornalistas assassinados. Ávila afirmou que “Israel” é um “Estado terrorista, um estado genocida, que é um estado pirata perante o direito internacional”.

Ao final dos pronunciamentos, o deputado Padre João agradeceu a todos os presentes e reafirmou que o “grito” da sessão é a “indignação em relação ao genocídio” e “pela cumplicidade do sionismo”, e o “apelo a de fato interromper todas as relações com o estado de ‘Israel’”.

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Last Update: 03/07/2025