
A Câmara dos Deputados realizou, nesta quarta-feira (2/7) uma sessão solene em memória aos 77 anos da Nakba (“catástrofe” em árabe), que marca a expulsão de mais de 750 mil palestinos de suas terras em 1948, com a criação do Estado de Israel. Parlamentares do PT criticaram a escalada de violência em Gaza, classificaram as ações israelenses como genocídio e cobraram do governo brasileiro a ruptura de relações diplomáticas com o Estado de Israel. A sessão é de autoria dos deputados Paulo Pimenta (PT-RS) e Padre João (PT-MG) e de parlamentares da bancada petista na Câmara.

O deputado Padre João afirmou que Nakba não foi um evento pontual. “Hoje, mais de 9 milhões de refugiados palestinos vivem espalhados pelo mundo, incluindo em campos de refugiados”. De acordo com o parlamentar, devido à atual crise humanitária em Gaza já foram ceifadas mais de 55 mil vidas, sendo 19 mil crianças e 20 mil mulheres. “Negar alimento, água e medicamentos a uma população sitiada é crime contra a humanidade”, denunciou.
Justiça histórica
Ele reforçou o apelo por justiça histórica. “A Terra Santa, por onde caminhou Cristo, não pode ser palco de dominação. Jerusalém, Belém e Jericó são patrimônios espirituais da humanidade. O que vemos hoje é a destruição de templos, mesquitas e hospitais – uma afronta à dignidade humana. A solução passa pelo reconhecimento mútuo dos direitos de palestinos e israelenses, mas não haverá paz enquanto a Palestina não for livre, do rio ao mar, como determina a ONU.”
Padre João disse ainda que a sessão não era apenas para lembrar o Nakba, mas para impedir sua continuidade. “Cada criança morta em Gaza é uma prova de que o mundo falhou. O Brasil, como nação comprometida com os direitos humanos, não pode ser cúmplice”. Ele ainda fez um pedido ao Presidente Lula. “Nosso clamor ao Presidente Lula é claro: rompa agora com Israel. Paz só virá com o fim da ocupação e o nascimento de um Estado palestino soberano.”
Rompimento de relações
“O momento exige mais do que palavras”, afirmou o deputado Paulo Pimenta, que também foi autor da sessão. “Temos de sinalizar ao mundo com ações concretas: o Brasil deve romper relações com o Estado de Israel. O silêncio diante do genocídio em Gaza é cumplicidade. A história nos perguntará: onde estávamos quando isso aconteceu?”
Pimenta elogiou o Presidente Lula por ser “uma das vozes mais corajosas no cenário global” contra a ofensiva israelense em Gaza, mas foi enfático. “O protesto não basta. Países como Espanha, Irlanda e Noruega já reconheceram o Estado palestino. O Brasil, que foi pioneiro nesse reconhecimento em 2010, precisa dar o próximo passo, cortar relações diplomáticas com Israel”.
O deputado destacou a resistência palestina. “Que nossos irmãos em Gaza e na Cisjordânia saibam, não estão sozinhos. O Brasil está com vocês. Esta sessão é prova de que estamos do lado certo da história”.
Dia da Amizade
O parlamentar gaúcho anunciou um projeto de lei para instituir o Dia da Amizade Brasil-Palestina em 29 de novembro, data reconhecida pela Organização das Nações Unidas. Pimenta, que em 1983 posou com uma camiseta da Juventude Al-Fatah estampando o rosto de Yasser Arafat, relembrou sua trajetória de apoio à causa palestina. “Representei o Brasil no funeral de Arafat no Egito, assinando o livro de condolências em nome do Parlamento brasileiro. Hoje, renovo esse compromisso com um projeto que homenageia a contribuição dos palestinos à nossa nação”.
Crime contra a humanidade

A deputada Maria do Rosário (PT-RS) foi enfática ao dizer que os governantes de Israel praticam crime contra a humanidade. “Não interessa justificar o injustificável. Crianças morrem de fome, mães carregam filhos sob escombros. Quem governa Israel hoje tem responsabilidade direta por este crime contra a humanidade.”
A deputada Lenir de Assis (PT-PR) vinculou a paz mundial à libertação da Palestina. “Não haverá paz enquanto a Palestina não for livre. Este genocídio tem autores: o governo de Netanyahu (presidente de Israel), os EUA e as nações que os apoiam. Basta de violência”.

Projeto de erradicação
O embaixador da Palestina no Brasil, Ibrahim Alzeben, enfatizou que a situação nos territórios ocupados, especialmente na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, é insuportável e não pode ser mais ignorada. Ele ressaltou que a violência diária, com centenas de pessoas mortas ou feridas, é apenas uma parte da realidade dramática e triste vivida pelo povo palestino. “Estamos diante de um projeto de erradicação que se sustenta no silêncio oficial internacional e na cumplicidade de potências pró-sionistas que ignoram o clamor de centenas de milhões de vozes ao redor do mundo”, declarou.
Alzeben fez um apelo por justiça e solidariedade ativa. “A Palestina não pede caridade, pede justiça. É um tempo de violência que precisa cessar”, disse. Ele expressou gratidão ao Brasil e a todos que apoiam a causa palestina, especialmente ao Presidente Lula, que, segundo ele, tem sustentado a bandeira da solidariedade. “Denunciar a ocupação e o genocídio é um dever moral e humano”, concluiu, ao enfatizar a importância de gravar essa tragédia na memória coletiva da humanidade para que não se repita.
Ajuda humanitária
O ativista Thiago Ávila, organizador da Flotilha da Liberdade – missões civis que tentam romper o bloqueio a Gaza – e sobrevivente de ataque israelense à missão humanitária no dia 8 de junho, acusa o Estado de Israel de “terrorismo” e pediu o fim do comércio bilateral do Brasil com o Estado. “Israel é um Estado pirata, genocida e terrorista perante o direito internacional”.
Ao relatar sua experiência ao ser sequestrado pelas forças israelenses no barco Medellín (em águas internacionais), Ávila foi direto. “Nossa ação só existe porque há oito décadas um projeto colonial europeu expulsou 750 mil famílias, destruiu 530 vilarejos e iniciou uma limpeza étnica que não parou. Hoje, Gaza vive um genocídio que já matou mais de 68 mil – mas estudos da Universidade de Harvard e da revista The Lancet apontam que o número real pode passar de 250 mil”.
Ele detalhou as violações que Israel tem praticado em Gaza. “São 10 mil crianças amputadas sem anestesia, 317 trabalhadores da ONU assassinados, 215 jornalistas mortos. Israel cercou Gaza ilegalmente em 2007 e agora escalou para o extermínio. Condenar a resistência palestina é ignorar que a colonização é o crime, não a luta contra ela”.
Sionismo
Ávila comparou a ideologia sionista a regimes históricos de exceção. “O sionismo, como o apartheid e o nazismo, é uma ideologia racista e supremacista que deve ser erradicada. O mundo acordou. Assassinar crianças de fome é errado, bombardear hospitais é errado”.
Sobre as missões civis para furar o bloqueio, Ávila adiantou. “Israel já anunciou que manterá o cerco ilegal, mas os povos do mundo não aceitarão. A Flotilha prepara nova missão. Seguiremos nas ruas, redes e mares até derrotar o sionismo. Palestina livre, do rio ao mar. Essa é a tarefa de nossa geração”, encerrou, sob aplausos.
Assista a íntegra da sessão solene:
Lorena Vale