Durante o ato bolsonarista na Avenida Paulista, no último domingo (29), o pesquisador Márcio Moretto, do Monitor do Debate Político no Meio Digital, avaliou que a manifestação foi menor do que os organizadores esperavam, e que o cenário sinaliza um momento de enfraquecimento do bolsonarismo. “O Bolsonaro estava bastante abatido no carro de som. Achei que foi sintomático de um momento de declínio”.

Batizado de “Manifestação Justiça”, o evento reuniu, no momento de pico, apenas 12,4 mil pessoas, segundo contagem feita a partir de fotos aéreas analisadas com software de inteligência artificial.

A equipe do Monitor do Cebrap acompanha há anos protestos da extrema direita com metodologia científica consolidada, em contraste com os números frequentemente inflados por autoridades, como no caso da manifestação no Rio, em março, em que a Polícia Militar admitiu ter recorrido ao “olhômetro” ao calcular 400 mil pessoas.

Os números reais

O número está bem abaixo de mobilizações anteriores. A manifestação anterior, em abril deste ano, havia reunido 44,9 mil pessoas. Em 2023, uma das ações chegou a 185 mil, na mesma Avenida Paulista.

“Fora o fato de que objetivamente o ato foi menor do que os anteriores, me pareceu que foi menor também do que eles esperavam. A gente já tem uma série histórica longa de pesquisas na Paulista. São cerca de 20 atos monitorados desde o início do bolsonarismo. Em vez de ficar na especulação, agora temos algum tipo de método. Meu desejo é que outros grupos repliquem a metodologia e o debate deixe de ser ‘a palavra da PM contra a do organizador’”, afirma.

Apesar da baixa adesão, o ato contou com os principais símbolos da extrema direita. Estavam lá Jair Bolsonaro, Silas Malafaia, Tarcísio de Freitas, Nikolas Ferreira, além de governadores aliados como Romeu Zema (MG) e Cláudio Castro (RJ).

Mas o que chamou a atenção foi justamente a discrepância entre o investimento político e a resposta do público. “A baixa adesão em um ato com a cúpula bolsonarista completa é significativa. Quando o ato é menor, só vai quem é mais radical”.

Para Moretto, a ausência de setores mais amplos da base bolsonarista fez emergir, com mais nitidez, a força da ala radicalizada, aquela que exige fidelidade irrestrita à pauta do ex-presidente e defende abertamente ruptura institucional.

O núcleo duro do bolsonarismo

Os dados da pesquisa de opinião aplicada no local confirmam essa guinada. 57% dos entrevistados disseram considerar “muito adequada” a ideia de Bolsonaro ter decretado estado de defesa no TSE, como se cogitou no fim de 2022. “A gente tem um público bastante propenso a uma ruptura democrática”, alerta o pesquisador.

A pesquisa também revelou mudanças importantes no jogo sucessório da extrema direita. Tarcísio de Freitas ainda aparece na frente, com 30% das preferências entre bolsonaristas. Mas agora está seguido de perto por Eduardo Bolsonaro, com 28%, e Michelle Bolsonaro, com 14%.

“Esse foi o dado mais relevante da pesquisa. Antes, o Tarcísio tinha cerca de 60% das intenções e Eduardo vinha lá atrás. Agora, com o esvaziamento, só os mais radicais apareceram, e nesse grupo Eduardo encostou nele”.

Tarcísio, que até aqui vinha adotando uma estratégia ambígua — tentando agradar tanto a base bolsonarista quanto o eleitorado mais moderado, vê agora esse meio-termo se estreitar com a ascensão da ala “puro-sangue”.

“O Tarcísio é favorito por enquanto, mas o Bolsonaro quer um nome que se comprometa com anistia e que enfrente o STF. Eles sabem que, quando isso subir para o Judiciário, deve cair”, afirma Moretto, referindo-se à expectativa do bolsonarismo de obter perdão judicial para os envolvidos no ataque golpista de 8 de janeiro.

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Last Update: 02/07/2025