O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) decidiu levar ao Supremo Tribunal Federal (STF) a disputa sobre a revogação, pelo Congresso Nacional, do decreto que aumentava o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). A medida será apresentada oficialmente pela Advocacia-Geral da União (AGU) nesta terça-feira, 1º, segundo informações divulgadas pela Folha de S.Paulo.
A ação a ser protocolada pela AGU questiona a constitucionalidade da decisão do Legislativo que anulou o decreto presidencial. O governo alega que a iniciativa tem como objetivo proteger as prerrogativas do chefe do Executivo, incluindo a competência para editar decretos que tratem do IOF.
De acordo com integrantes do governo, o presidente Lula solicitou pessoalmente ao ministro-chefe da AGU, Jorge Messias, a elaboração da ação. A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, confirmou a parlamentares aliados que a medida será tomada. Um assessor do Palácio do Planalto, sob condição de anonimato, classificou a iniciativa como uma tentativa de restabelecer a normalidade institucional.
Apesar da decisão, há resistência dentro do próprio governo e no Partido dos Trabalhadores (PT). Alguns integrantes da base temem o desgaste político que pode surgir com a judicialização do caso, principalmente diante do discurso da oposição, que aponta uma tentativa de elevar a carga tributária por meio de decisões judiciais. A crítica central é que a ação reforça a narrativa de que o governo estaria buscando ampliar impostos sem apoio do Congresso.
Nos bastidores, a crise foi intensificada por um atrito entre o Planalto e o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB). Motta usou as redes sociais, na noite de 23 de junho, para anunciar que levaria o decreto ao plenário da Casa no dia seguinte. O resultado foi a derrubada da medida presidencial com apoio da maioria dos parlamentares.
A articulação para evitar o embate direto com o Congresso foi conduzida pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que buscava uma saída negociada. A decisão de Motta foi interpretada pelo presidente Lula como uma quebra de acordo e, segundo interlocutores, uma “traição” tanto a ele quanto ao titular da Fazenda.
Após a votação, Motta gravou um vídeo rebatendo críticas de membros do governo. No conteúdo, o presidente da Câmara afirmou que a proposta de aumento do IOF foi tratada com viés ideológico e que o governo foi alertado sobre a dificuldade de aprovação no Legislativo.
“Capitão que vê o barco ir em direção ao iceberg e não avisa, não é leal, é cúmplice. E nós avisamos ao governo que essa matéria do IOF teria muita dificuldade de ser aprovada no Parlamento”, declarou. Ele acrescentou: “Presidente de qualquer Poder não pode servir ao seu partido. Tem que servir ao seu país”.
Aliados do Planalto sustentam que há base jurídica para contestar a decisão do Congresso no Supremo. Argumentam que a Constituição Federal prevê a competência do Executivo para editar decretos relacionados ao IOF, e que a revogação feita pelo Legislativo fere esse princípio. O próprio ministro Fernando Haddad já declarou publicamente ser favorável à judicialização da questão.
Atualmente, duas ações tramitam no STF com interpretações opostas sobre o tema. O Partido Liberal (PL) e o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) apresentaram pedidos distintos à Corte. Enquanto o PL defende a revogação, o PSOL é favorável à reativação do decreto presidencial.
O presidente do Supremo, ministro Luís Roberto Barroso, encaminhou o pedido do PSOL ao gabinete do ministro Alexandre de Moraes, que será o relator do caso. Moraes também passou a relatar outra ação sobre o mesmo tema, que estava inicialmente sob responsabilidade do decano da Corte, ministro Gilmar Mendes. A redistribuição foi justificada pela existência de conexão entre os processos.
O desfecho da disputa no STF terá impacto direto na condução da política fiscal do governo, uma vez que o decreto derrubado integrava um conjunto de medidas do Ministério da Fazenda para ampliar a arrecadação em 2025. A expectativa do Planalto é que o Supremo reconheça a validade do decreto e, assim, restabeleça a política fiscal prevista pelo Executivo para o próximo ano.
A ação da AGU será acompanhada de perto por lideranças do Congresso, setores do mercado financeiro e entidades empresariais, que observam os desdobramentos do caso como sinalização do equilíbrio de forças entre os Poderes da República. Até o momento, o STF ainda não se pronunciou oficialmente sobre prazos para a análise da ação.