No dia em que a Câmara dos Deputados decidiu derrubar o decreto do governo federal que aumentava o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tentou entrar em contato diretamente com o presidente da Casa, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), mas não teve sucesso. A informação foi revelada por Igor Gadelha, do portal Metrópoles.

De acordo com relatos dos bastidores, a tentativa de ligação ocorreu horas antes da votação. Lula buscava convencer Motta a não levar a proposta de sustação do decreto ao plenário. A medida, que previa o aumento da alíquota do IOF, era considerada estratégica pela equipe econômica para viabilizar o equilíbrio das contas públicas.

A decisão de não atender à ligação partiu do próprio presidente da Câmara. Segundo aliados, Motta optou por não conversar com o chefe do Executivo por entender que já conhecia o conteúdo do pedido e avaliava que não haveria espaço político para recuar. Deputados próximos ao parlamentar afirmam que a articulação contrária ao decreto já estava consolidada entre as bancadas e que um apelo do presidente da República não mudaria o resultado.

Além de Lula, pelo menos dois ministros também tentaram contato com Hugo Motta no mesmo dia: o titular da Fazenda, Fernando Haddad (PT), e a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann (PT). Ambos procuraram o deputado com o mesmo objetivo — evitar que a proposta de revogação fosse submetida ao plenário. As tentativas, no entanto, não tiveram retorno.

Nos bastidores, a decisão de Motta foi interpretada no Palácio do Planalto como uma sinalização clara de ruptura no diálogo entre o Legislativo e o Executivo. Fontes próximas ao governo relatam que havia uma expectativa de que o presidente da Câmara buscasse uma saída negociada com o ministro da Fazenda, o que não ocorreu.

A equipe econômica, liderada por Haddad, considerava o aumento do IOF uma das medidas prioritárias para ampliar a arrecadação federal no próximo exercício. A derrubada do decreto foi vista como uma derrota direta da política fiscal traçada pelo Ministério da Fazenda.

O episódio gerou insatisfação entre aliados de Lula. A negativa de diálogo, somada à articulação que resultou na rejeição do decreto, acentuou o clima de tensão entre o Congresso e o Palácio do Planalto. Integrantes da base afirmam que o governo já esperava resistência à medida, mas não previa uma rejeição com tal grau de articulação e velocidade.

Mesmo após a tentativa frustrada de contato, o governo manteve a defesa do decreto. Em declarações públicas, Fernando Haddad argumentou que o aumento do IOF se baseava em prerrogativas constitucionais do Executivo e que medidas desse tipo fazem parte do esforço fiscal adotado pela administração federal.

Procurada pela imprensa, a assessoria de imprensa da presidência da Câmara informou que Hugo Motta “não irá comentar o episódio”.

A negativa do presidente da Câmara de dialogar com o Palácio do Planalto se soma a outros movimentos recentes de insatisfação do Legislativo com decisões do Executivo. Na semana anterior, Motta havia publicado em suas redes sociais que colocaria o decreto em votação. A declaração foi vista dentro do governo como um gesto de enfrentamento, o que intensificou a mobilização nos bastidores.

A derrubada da medida ocorreu no mesmo dia da tentativa de contato, com ampla maioria de votos. Parlamentares argumentaram que o aumento do IOF impactaria setores sensíveis da economia e criticaram a falta de articulação política do governo na condução do tema.

Após a votação, Hugo Motta gravou um vídeo rebatendo críticas recebidas de membros da base governista. Na gravação, o presidente da Câmara declarou: “Capitão que vê o barco ir em direção ao iceberg e não avisa, não é leal, é cúmplice. E nós avisamos ao governo que essa matéria do IOF teria muita dificuldade de ser aprovada no Parlamento.” Ele acrescentou ainda: “Presidente de qualquer Poder não pode servir ao seu partido. Tem que servir ao seu país”.

O episódio reforça o distanciamento entre o Legislativo e o Executivo e ocorre em um momento de disputa judicial sobre a validade do decreto. O governo já anunciou que recorrerá ao Supremo Tribunal Federal (STF) para contestar a decisão do Congresso. A Advocacia-Geral da União deve protocolar uma ação direta de inconstitucionalidade alegando que a revogação da norma interfere em prerrogativas do presidente da República.

O desfecho do embate entre os Poderes dependerá agora da avaliação do STF, que analisa outras duas ações sobre o mesmo tema, uma apresentada pelo PL e outra pelo PSOL. A relatoria do caso está sob responsabilidade do ministro Alexandre de Moraes.

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Last Update: 01/07/2025