Durante entrevista concedida no último dia 24 à TV 247, a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) defendeu a construção de mais uma frente ampla para garantir a governabilidade e conter os avanços da extrema direita no Brasil. “Nós precisamos ter frente ampla para ganhar eleição, para governar e para fazer com que as coisas aconteçam; é preciso conquistar o centro, o centro-direita”, disse a parlamentar, destacando que a esquerda soma pouco mais de 130 dos 513 votos da Câmara. Trata-se de um argumento ridículo, o que pode ser comprovado com o fracasso dos três anos e meio do governo Lula.
Sob esse argumento de que “precisamos conquistar ganhar eleição e governar”, a esquerda fez exatamente o que Feghali defende: uma aliança com setores tão abrangentes da direita quanto os partidos bolsonaristas União Brasil e, pasmem, o Republicanos, partido do ex-vice-presidente Hamilton Mourão e do governador de São Paulo Tarcísio de Freitas, cotado inclusive para representar o bolsonarismo nas eleições de 2026. Após dois anos e meio de governo, a pergunta normal a ser feita é: “deu certo?”, questionamento que só admite uma resposta honesta: não.
Em primeiro lugar, é preciso lembrar a composição do gabinete de Lula para um questionamento importante: se até o bolsonarismo coube na frente ampla atual – ainda não revisada -, que outro setor político a despudorada deputada propõe a aliança? O próprio Jair Bolsonaro? Além disso, para que fim? Finalmente, e não menos importante, digamos que por um milagre a aliança seja feita: vai dar certo para quem?
O fracasso da frente ampla foi tamanho que o governo enfrenta uma crise de reprovação inédita na história do lulismo. A razão para isso é o que comprova a falácia do raciocínio de Feghali e poder ser resumido da seguinte forma: alianças políticas não devem ser pensadas como uma operação aritmética, mas física, ciência na qual o sentido das forças conta, e muito.
Na física, são os vetores que indicam a direção das forças, que se tiverem sentidos antagônicos, podem se anular ou terminar com uma prevalecendo sobre a outra, sem indicar, necessariamente, que ambas terão uma atuação harmônica. Mais concretamente, o governo quer, como vinha defendendo durante as eleições, colocar o pobre no orçamento e o rico no imposto de renda.
Ao fazer o que a parlamentar do PCdoB defende, porém, terminou unindo-se ao setor da luta política que defende a burguesia, os segmentos mais ricos e poderosos da sociedade, cuja consideração pelo povo é tamanha que deram um golpe de Estado para derrubar a presidenta eleita pela população, Dilma Rousseff. Na sequência, colocaram um programa neoliberal em marcha, à revelia da aceitação popular, atacando as aposentadorias, os direitos trabalhistas, a soberania nacional e o petróleo nacional, para ficar apenas nos três exemplos mais dramáticos.
Com isso claro, não é nem um pouco estranho a total inversão da meta de “pobre no orçamento e rico no imposto”, mas antes, uma consequência natural da política de frente ampla. É sabido que criar impostos como “taxa da blusinha” e outros aumentos na carga tributária não são parte da política natural do presidente Lula. Ele só o faz por estar sob uma severa pressão.
Tivesse essa pressão origens exógenas, ela já demandaria uma energia considerável, porém vindas do interior do próprio governo, se mostraram capazes de demolir o terceiro mandato de Lula. Não por acaso, a política econômica de arrocho está na base real da crise que Lula enfrenta.
Embora não seja a política natural de Lula, é a que se espera de direitistas como o ministro da Fazenda Fernando Haddad (PT), o presidente do BC Gabriel Galípolo, a ministra do Planejamento Simone Tebet (MDB) e o vice-presidente (e Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, portanto, membro da equipe econômica) Geraldo Alckmin (PSB). O sucesso da política desse quarteto infernal, por sinal, foi tamanho, que há menos de um ano do período oficial de campanha eleitoral, Feghali faz um reconhecimento velado da desmoralização da esquerda.
A solução apresentada para superar o problema, porém, é aprofundá-lo. Na prática, a tática defendida pela deputada se mostrou um fracasso, gerando um governo Frankenstein, combinando forças antagônicas, que longe de tornar o governo uma espécie de árbitro de interesses conflitantes, colocou o atual mandato em um estado de crise permanente, incapaz de atender qualquer uma das classes fundamentais da sociedade e finalmente, imóvel.
Para fins de foco no debate, não entraremos no mérito de se a burguesia está disposta a uma frente ampla com o PT no atual estágio de desmoralização do governo, mantendo o foco da discussão na validade da manutenção dessa tática. Vai dar certo repetir o que se mostrou a essência de um governo que fracassou?
A pergunta é um recurso retórico e a resposta é óbvia: claro que não. Se antes órgãos como este Diário Causa Operária apresentavam argumentos demonstrando o quão falacioso era a tática de compor forças com setores da direita para governar, hoje temos o resultado prático desse tipo de política derrotista.
O físico Albert Einstein, tinha uma definição de loucura, fazer repetidamente a mesma coisa e esperar resultados diferentes. O fato de Feghali retomar a defesa da frente ampla demonstra muita disposição da parlamentar para se alinhar com a direita, a ponto inclusive de defender uma tática fracassada, é sintomático do que o medo fez com a esquerda brasileira, levada a um estado irremediável de loucura.