A multinacional norte-americana Chevron, em parceria com a estatal chinesa CNPC, arrematou nove blocos de exploração de petróleo na bacia da Foz do Amazonas durante o leilão da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), realizado em 17 de junho de 2025.
Com investimento de R$ 350 milhões, a companhia se tornou uma das principais vencedoras do 5º Ciclo da Oferta Permanente da agência, mas agora enfrenta uma série de entraves jurídicos e ambientais que colocam em risco o avanço do projeto.
O certame arrecadou R$ 989,2 milhões em bônus de assinatura, dos quais 85% vieram exclusivamente dos blocos localizados na Margem Equatorial brasileira. Entre os 34 blocos licitados, 19 pertencem à Foz do Amazonas.
A região concentrou a maior parte dos lances e atraiu duas grandes coalizões: uma formada por Petrobras e ExxonMobil, que ficou com 10 blocos, e outra liderada pela Chevron com a CNPC, responsável pelos nove blocos restantes.
Disputa concentra interesse em área estratégica
A aposta na Foz do Amazonas foi motivada por análises geológicas que indicam semelhanças entre essa bacia e a vizinha Guiana-Suriname, onde foram realizadas descobertas significativas de petróleo nos últimos anos.
A estratégia da Chevron reflete o movimento de grandes companhias do setor em garantir presença antecipada em áreas com potencial elevado de retorno, mesmo em regiões com alta complexidade ambiental e regulatória.
A parceria com a estatal chinesa CNPC visa compartilhar os riscos e custos envolvidos na exploração de águas ultraprofundas, além de diversificar as apostas diante da volatilidade regulatória no setor energético global.
Ação do MPF contesta legalidade do leilão
Cinco dias antes da realização do leilão, o Ministério Público Federal (MPF) do Pará ingressou com uma ação civil pública solicitando a suspensão da oferta dos blocos da Foz do Amazonas. A principal argumentação do MPF é que a licitação foi realizada sem a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), exigida para análise dos impactos cumulativos e sinérgicos em toda a bacia.
Além disso, o MPF sustenta que não houve consulta prévia a comunidades indígenas e tradicionais possivelmente afetadas, em desacordo com normas previstas em legislação nacional e em tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário. A ação judicial segue em tramitação e pode, caso acolhida, anular parte ou todos os resultados do leilão envolvendo a região.
Pressão ambiental e reação de organizações civis
Diversas organizações da sociedade civil também contestam a oferta dos blocos na Margem Equatorial. Grupos como Greenpeace e WWF classificaram o leilão como o “Leilão do Juízo Final” e alertaram para os riscos associados à exploração em uma região próxima ao Grande Sistema Recifal Amazônico, ecossistema ainda pouco estudado, mas considerado de alta relevância ambiental.
A preocupação tem como precedente a decisão do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que em 2023 negou licença de perfuração para a Petrobras em um bloco próximo ao da Chevron. Na ocasião, o órgão apontou falhas no Estudo de Impacto Ambiental e risco elevado de danos irreversíveis ao meio ambiente marinho.
Etapas regulatórias ainda pendentes
Mesmo com a aquisição formalizada no leilão, as empresas não têm autorização imediata para iniciar atividades de perfuração. A fase seguinte envolve a obtenção de licenças ambientais junto ao Ibama, processo que pode se estender por anos e está sujeito a avaliações técnicas detalhadas e consultas públicas. O histórico da Petrobras na mesma região indica que a aprovação de licenças não é garantida e pode ser negada por critérios ambientais.
Caso o licenciamento seja negado, os blocos permanecem sob controle das empresas, mas ficam inativos. Com isso, os investimentos iniciais em bônus de assinatura podem ser convertidos em perdas financeiras, a depender das cláusulas contratuais.
Implicações para a política energética e ambiental
O avanço da exploração na Margem Equatorial ocorre em um momento de grande atenção internacional à política ambiental brasileira. O país será sede da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), prevista para ocorrer em Belém, capital do Pará, próxima à área licitada.
A coexistência entre a agenda de transição energética e o estímulo à abertura de novas fronteiras de exploração de petróleo gera tensões internas no governo e pressões externas de organismos internacionais. O caso da Foz do Amazonas se tornou simbólico desse impasse, colocando em debate a estratégia do país diante da transição global para fontes energéticas de menor impacto ambiental.
Próximos desdobramentos
A continuidade dos projetos de exploração depende agora de três frentes paralelas: o desfecho da ação judicial proposta pelo MPF, a análise técnica e regulatória dos pedidos de licenciamento ambiental e a posição do governo federal sobre o futuro da Margem Equatorial como área de interesse estratégico.
Enquanto isso, as empresas vencedoras do leilão aguardam sinalizações dos órgãos ambientais e jurídicos para definir os próximos passos. O resultado das decisões nos tribunais e nas agências reguladoras poderá redefinir não apenas o ritmo de exploração na região, mas também a percepção internacional sobre o compromisso do Brasil com metas climáticas e práticas sustentáveis.