A Advocacia-Geral da União (AGU) encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF), na noite desta quinta-feira, 26, uma proposta de regularização para áreas reivindicadas por indígenas que estão sob litígio judicial.
O documento foi entregue à comissão de conciliação criada pelo ministro Gilmar Mendes com o objetivo de discutir a aplicação do marco temporal para demarcação de terras indígenas.
O plano prevê o pagamento de indenizações a particulares que possuem títulos de propriedade legalmente emitidos pelos estados, mas que estão sobre áreas reconhecidas como indígenas pela União. A proposta abrange oito terras localizadas em Santa Catarina e Mato Grosso do Sul, cujas demarcações já foram reconhecidas, mas seguem judicializadas.
O projeto, chamado de “Plano Transitório para Regularização das Terras Indígenas em Litígio Judicial”, prevê a compensação de 752 proprietários. Os pagamentos seriam realizados por meio de precatórios e englobariam tanto o valor das benfeitorias quanto o valor da terra nua — este último já reconhecido pelo STF como passível de indenização.
As terras envolvidas são Toldo Imbu, Morro dos Cavalos, Guarani de Araçaí e Ibirama-Lá Klãnõ, em Santa Catarina, e Arroio-Korá, Taquara, Potrero Guaçu e Yvy-Katu, em Mato Grosso do Sul. De acordo com a AGU, o plano visa permitir a continuidade dos procedimentos de demarcação em paralelo a um processo conciliatório com os detentores dos títulos.
O texto entregue ao STF estabelece que a regularização será aplicada aos casos em que os proprietários tenham títulos emitidos antes do reconhecimento da terra indígena.
“Fica instituído o Plano Transitório para Regularização das Terras Indígenas em Litígio Judicial, com objetivo de viabilizar a conclusão de procedimentos demarcatórios e a conciliação com particulares detentores de títulos válidos de propriedade ou posse sobre áreas total ou parcialmente sobrepostas a terras indígenas”, registra o documento.
Conciliação no STF
A proposta foi encaminhada após a última reunião da comissão de conciliação conduzida pelo gabinete do ministro Gilmar Mendes, realizada na segunda-feira, 23. O grupo trabalhou por nove meses na elaboração de uma minuta que servirá de base para um anteprojeto de lei a ser apresentado ao Congresso Nacional.
A minuta trata de mudanças na Lei 14.701/2023, que regulamenta os direitos territoriais dos povos indígenas, mas também incorporou a tese do marco temporal, aprovada pelo Legislativo no final de 2023. A comissão evitou incluir alterações sobre o marco temporal por falta de consenso entre os participantes.
A tese estabelece que comunidades indígenas só têm direito à posse de terras que ocupavam em 5 de outubro de 1988 — data da promulgação da Constituição — ou que estavam sendo disputadas judicialmente naquela época.
Em setembro de 2023, o STF considerou a regra inconstitucional. A decisão da Corte foi levada em conta pelo Palácio do Planalto para justificar o veto parcial ao projeto de lei aprovado no Congresso. No entanto, em dezembro do mesmo ano, o veto foi derrubado pelos parlamentares, validando a tese do marco temporal.
Com o impasse entre os Poderes, Gilmar Mendes decidiu suspender temporariamente os efeitos da norma e submeteu o tema à comissão de conciliação.
Participação dos povos indígenas
A participação de representantes indígenas no processo de conciliação foi limitada. Em agosto de 2023, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) se retirou dos trabalhos, afirmando que não havia paridade no debate e que os direitos territoriais dos povos originários não poderiam ser objeto de negociação.
A ausência de representantes indígenas na fase final dos debates foi criticada por entidades da sociedade civil, que apontaram a necessidade de maior diálogo com os grupos afetados pelas medidas propostas. Apesar disso, o governo federal manteve a condução do plano, que agora depende de homologação do Supremo.
Etapas seguintes
Caso o STF valide a proposta apresentada pela AGU, o governo poderá iniciar o pagamento das indenizações por meio de precatórios. A medida abriria caminho para a continuidade dos processos de desintrusão das áreas e para a efetivação das demarcações, conforme previsto na Constituição Federal.
O plano também pode servir de base para outras disputas em curso, criando um precedente jurídico e administrativo para a resolução de conflitos semelhantes em outras regiões do país.
O avanço da proposta ainda depende da análise dos ministros do STF, que devem se manifestar nos próximos meses. Não há prazo definido para a homologação do plano ou para a tramitação do anteprojeto no Congresso Nacional.
Com informações da Agência Brasil