O jornalista Bepe Damasco, em artigo publicado no Brasil 247 (28 de junho), celebra os indicadores econômicos do governo Lula, como a queda do desemprego para 6,2% e a inflação em trajetória descendente, enquanto sugere uma nova tática para o governo. Sua análise, embora reconheça a sabotagem da direita e da extrema direita, peca por um otimismo reformista que desarma os trabalhadores diante da realidade caótica do Brasil. Mesmo com alguns dados econômicos positivos, a situação do país permanece crítica, e os programas sociais atuais estão muito aquém dos primeiros governos Lula, que já eram limitados. A única forma de enfrentar a sabotagem — que vem tanto do Congresso, da imprensa e da direita, quanto de setores dentro do próprio governo — é com mobilização popular e uma política radical de apoio ao povo, não com ilusões de diálogo com a burguesia ou defesa de medidas impopulares.
Bepe Damasco destaca que o desemprego caiu para 6,2% no trimestre encerrado em maio de 2025, conforme a PNAD Contínua do IBGE, a menor taxa em 13 anos, e que a inflação está em queda, com o dólar abaixo de R$5,50. No entanto, esses indicadores mascaram uma crise que afeta diretamente os trabalhadores. A inflação acumulada de 2024 foi de 4,7%, mas a inflação de alimentos atingiu 7,9%, encarecendo itens básicos como arroz (alta de 12%) e feijão (15%). As contas de luz subiram 9,5% em 2024, segundo a Aneel, devido a ajustes tarifários e à crise hídrica, impactando o orçamento das famílias trabalhadoras. O preço do gás de cozinha aumentou 8% no mesmo período, enquanto o transporte público em grandes cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro, teve reajustes de até 10%. A precarização do trabalho também avança: 40% dos trabalhadores estão na informalidade, com 12 milhões dependentes de aplicativos como Uber e iFood, sem direitos trabalhistas ou proteção social.
Damasco afirma que “os preços dos alimentos estão cedendo” e que “o Brasil está em um ótimo ambiente econômico”, mas essa propaganda ignora o impacto devastador da alta de alimentos, energia e transporte sobre a classe trabalhadora. De fato, houve uma pequena melhoria, mas muito insuficiente para reverter a crise em que se encontra a economia nacional principalmente desde o golpe de Estado neoliberal de 2016. Fingir que a situação está sob controle, como sugere Damasco, é uma péssima política. Essa ilusão desarma os trabalhadores diante da realidade caótica, enfraquecendo sua capacidade de luta contra os capitalistas. Fato é que os indicadores econômicos celebrados pelo governo servem mais aos interesses da burguesia do que às necessidades do proletariado.
Damasco elogia os “vários programas sociais exitosos” do governo Lula, mas a realidade é que essas iniciativas não chegam nem perto do impacto — já limitado — dos primeiros mandatos (2003-2010). Naquela época, o Bolsa Família e o aumento real do salário mínimo (mesmo que ainda muito abaixo do que deveria), aliados a um boom de commodities, reduziram a pobreza e a desigualdade, com a razão dívida bruta/PIB caindo de 77% para 62%. Hoje, o Bolsa Família reativado em 2023, com um orçamento adicional de R$ 168 bilhões, atende 21 milhões de famílias, mas está restrito pelo teto de gastos e não enfrenta a pobreza que afeta 71 milhões de brasileiros. Programas como Farmácia Popular e a expansão de universidades públicas, embora positivos, são insuficientes frente à crise em saúde, educação e moradia. Em 2024, apenas 15% do orçamento da saúde foi executado até outubro, enquanto filas no SUS crescem.
Damasco afirma que “o governo exibe vários programas sociais exitosos”, mas essa visão superestima medidas paliativas que não alteram a estrutura sócio-econômica. Os primeiros governos Lula, embora reformistas, beneficiaram-se de um cenário global favorável; hoje, o governo opera sob uma pressão muito mais forte do imperialismo e do Congresso, limitando seu alcance. Não é somente que reformas dentro do capitalismo são insuficientes para enfrentar as contradições do sistema, as atuais reformas não fazem cócegas à estrutura neoliberal implementada no Brasil por Michel Temer e Jair Bolsonaro. O otimismo de Damasco, ao ignorar essas limitações, trai a base social do governo e subestima a necessidade de uma ruptura mais profunda com a burguesia.
Concordamos com Damasco que a imprensa, a direita e a extrema direita, com forte presença no Congresso, estão em uma campanha para sabotar o governo Lula. A revogação do decreto do IOF, como Damasco aponta, é uma tentativa de “forçar o governo a sagrar seu coração eleitoral”, comprometendo investimentos sociais. Além disso, a sabotagem vem de dentro do próprio governo, com figuras como Marina Silva, Simone Tebet, entre outros, como o próprio ministro da Fazenda petista, Fernando Haddad, priorizando o ajuste fiscal para agradar os capitalistas, como visto na defesa do arcabouço fiscal que limita gastos sociais em 2024.
No entanto, Damasco erra ao sugerir que a solução está em “tensionar as bancadas com mais realizações” e “manter canais com lideranças intermediárias da Câmara e do Senado”. Ele próprio reconhece que “a cúpula do Congresso rompeu os canais de diálogo e negociação” e que “é impossível negociar com quem não quer negociar”. Sua proposta de intensificar o diálogo com um Congresso dominado pela direita — com partidos como União Brasil e Progressistas alinhados a Tarcísio de Freitas — é contraditória e ilusória. O governo Lula não pode depender de acordos com a burguesia reacionária, mas deve usar os dispositivos institucionais do Congresso (como medidas provisórias e vetos) enquanto aposta na mobilização de sua base social: os trabalhadores, movimentos sociais e sindicatos.
Damasco está correto ao sugerir que “o presidente Lula deveria ocupar uma cadeia de rádio e TV” para se comunicar diretamente com o povo, rompendo a dependência da imprensa capitalista, como as Organizações Globo, que ele critica. No entanto, ele erra ao propor que isso seja usado para “explicar didaticamente a importância do pequeno aumento do IOF”. O IOF, um imposto regressivo que onera os trabalhadores, é uma medida impopular que contradiz o programa de desenvolvimento nacional e social pelo qual Lula foi eleito em 2022, com 60,3 milhões de votos ancorados na mobilização popular. Em vez disso, uma rádio e TV próprias deveriam ser usadas para convocar o povo a defender políticas como a taxação de grandes fortunas, a reindustrialização, o petróleo 100% estatal e a ampliação de direitos trabalhistas, mobilizando a classe trabalhadora contra a sabotagem do Congresso e dos capitalistas.
Damasco também acerta ao propor que Lula vá “ao encontro do povo” em “manifestações amplas de prestação pública de contas”, mas sua ressalva sobre “riscos de segurança” subestima a força dos movimentos sociais. A única saída para o governo Lula é uma política radical de apoio ao povo, baseada na mobilização de sua base social. A história do movimento operário mostra que o proletariado só pode conquistar seus direitos através da mobilização revolucionária das massas. Lula deve abandonar as ilusões de conciliação com a burguesia e convocar os trabalhadores para a luta.
A análise de Bepe Damasco, ao celebrar os avanços econômicos e sugerir mais diálogo com o Congresso, ignora a realidade caótica do Brasil e desarma os trabalhadores. Sua proposta de defender o IOF e intensificar negociações com a direita contradiz sua própria constatação de que o Congresso é um entrave. O governo Lula só enfrentará a sabotagem — externa e interna — com uma política radical que mobilize sua base social, usando meios de comunicação próprios para defender um programa de desenvolvimento nacional e social, não medidas impopulares. A luta contra a burguesia exige a organização e a mobilização da classe trabalhadora, não a conciliação com os opressores. Damasco, ao tapar o sol com a peneira, arrisca alinhar-se, ainda que inconscientemente, com uma estratégia que enfraquece a luta dos trabalhadores.