O número de trabalhadores atuando por meio de plataformas digitais no Brasil aumentou expressivamente entre 2022 e 2024. Segundo dados da segunda edição da pesquisa do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), divulgada nesta quarta-feira, 25, cerca de 2,2 milhões de pessoas trabalham atualmente como motoristas de transporte individual ou entregadores. O crescimento foi de 35% entre os motoristas e de 18% entre os entregadores no período.

O levantamento é o único do país baseado em registros administrativos das empresas do setor e oferece um retrato inédito sobre perfil, remuneração, jornada e vínculos com os aplicativos. Entre os 2,2 milhões de trabalhadores, 1,7 milhão são motoristas e aproximadamente 455 mil realizam entregas.

A pesquisa revela que, mesmo sem vínculo empregatício formal, os rendimentos líquidos médios desses trabalhadores superam o salário-mínimo nacional vigente e também os salários de trabalhadores com o mesmo nível de escolaridade no setor de serviços.

Motoristas que trabalham 40 horas por semana recebem entre R$ 3.083 e R$ 4.400 líquidos por mês, o equivalente a R$ 19 a R$ 27 por hora. Já os entregadores, na mesma carga horária, têm rendimentos entre R$ 2.669 e R$ 3.581, com ganho por hora entre R$ 17 e R$ 22. Para efeito de comparação, o salário-mínimo em 2024 é de R$ 1.412, e a média salarial de trabalhadores com ensino médio completo no setor de serviços, segundo o IBGE, é de R$ 2.392.

A jornada dos trabalhadores de aplicativo também apresenta características específicas. Os motoristas atuam, em média, entre 19 e 27 horas por semana, conectando-se às plataformas por cerca de três dias por semana.

Os entregadores, por sua vez, têm uma média semanal de 9 a 13 horas, com quatro dias de trabalho. A flexibilidade é apontada como fator determinante para a permanência na atividade: 42% dos motoristas e 45% dos entregadores afirmam que a carga horária varia consideravelmente semana a semana.

Ainda segundo o Cebrap, 58% dos motoristas têm nas plataformas sua única fonte de renda e 63% não estão em busca de outro tipo de ocupação. No grupo dos entregadores, 54% exercem exclusivamente essa atividade remunerada.

Entre os principais motivos apontados para essa escolha estão os ganhos financeiros (citado por 43% dos motoristas e 48% dos entregadores) e a flexibilidade e autonomia oferecidas pelo modelo de trabalho (27% e 24%, respectivamente).

O estudo indica também uma mudança no perfil da ocupação com plataformas digitais. O vínculo deixou de ser apenas uma alternativa ao desemprego. Cada vez mais, trabalhadores autônomos e com outras fontes de renda utilizam os aplicativos como forma de complementar o orçamento.

Entre os motoristas, o número de pessoas que acumulam outra atividade remunerada subiu de 37% para 42%. Entre os entregadores, 43% também têm outra ocupação, sendo que mais da metade possui vínculo formal com carteira assinada.

A cobertura previdenciária dos trabalhadores de aplicativo também foi analisada. Entre os motoristas, 53% contribuem com a Previdência Social. No grupo dos entregadores, a taxa é de 57%.

Desses, 21% dos motoristas e 27% dos entregadores estão registrados como trabalhadores formais. Outros 27% em ambos os grupos fazem as contribuições na condição de Microempreendedor Individual (MEI).

O Cebrap destaca que a regulamentação desses vínculos é tema em discussão no Congresso Nacional, especialmente por meio do Projeto de Lei Complementar 12/2024. A proposta trata das relações trabalhistas envolvendo plataformas digitais.

Em paralelo, um estudo da consultoria Ecoa, encomendado pela Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), analisou os possíveis impactos econômicos da aplicação das regras da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) aos motoristas e entregadores de aplicativo.

Os resultados apontam que, caso essa mudança ocorra, o valor das viagens pode subir até 34% e o preço das entregas até 26%. Como consequência, haveria uma queda estimada de 31% na demanda por corridas e de 43% por entregas.

A consultoria prevê ainda um impacto direto no número de postos de trabalho. A estimativa é de que 52% das vagas para motoristas e até 82% das oportunidades para entregadores poderiam ser extintas. Os ganhos líquidos dos trabalhadores também sofreriam redução mínima de 10%, segundo as projeções da Ecoa.

O diretor-executivo da Amobitec, André Porto, defende que qualquer proposta de regulamentação considere as especificidades do setor.

“Defendemos a regulamentação do setor para oferecer maior proteção social para os profissionais, assim como segurança jurídica para as empresas. Consideramos que qualquer iniciativa deve ser avaliada com cautela, observando as particularidades do modelo de negócio e os benefícios econômicos e sociais gerados pela tecnologia”, afirmou.

O debate sobre os rumos do trabalho por aplicativo continua em pauta, com foco na busca de equilíbrio entre segurança jurídica, proteção social e preservação das oportunidades de trabalho oferecidas pelo setor.

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 28/06/2025