O amor vai vencer, por Sara Goes

Este texto não é sobre amor


Lula tentou dar amor a Hugo Motta. Amor mesmo, com a paciência dos convertidos, os cargos dos generosos e a camisa de linho branco que até o mês passado, lá no campo, ainda era flor. Quis vê-lo brotar como aliado, vestir o uniforme simbólico do governo, encarnar a promessa de uma coalizão possível. E Hugo até encenou, posou ao lado, sorriu no Palácio, fez a coreografia do bom moço institucional. Mas bastou o vento do Centrão soprar para que ele voltasse correndo ao colo certo.

Foi acolhido pela guarda compartilhada de Arthur Lira e Eduardo Cunha, dois pais experientes em criar filhos políticos à base de chantagem, relatoria e orçamento. Com eles, Hugo não precisa fingir fidelidade, nem decorar discursos. Basta votar contra quando for conveniente, escalar bolsonaristas para relatorias sensíveis e, se questionado, lembrar que está dialogando.

Lula, acostumado a atravessar traições com pragmatismo, talvez tenha acreditado que um gesto de confiança valesse mais que um histórico. Ofereceu palco, prestígio e paciência. Hugo respondeu com emboscada. Nas entrelinhas, sua atuação revela uma escolha clara, entre um governo que ainda insiste em amor político e um sistema que só reconhece o interesse como linguagem, ele ficou com o segundo.

A bolha governista reagiu com frustração. Parte das redes vibrou com a derrota do governo, outra mal percebeu. O Congresso, cada vez mais impermeável à opinião pública, seguiu seu roteiro. E Lula subirá ao STF, não apenas para reverter o decreto, mas para mostrar que a institucionalidade também se protege. Não é impulso, é método. O presidente não bate na mesa, ele assina. Não esbraveja, age. E no silêncio entre uma foto e uma votação, deixa claro que quem se opõe ao governo se opõe ao povo.

Lula sabe que o amor oferecido é uma moldura. Dentro dela, desenha uma lição: quem joga contra o Brasil que trabalha e come, contra o Brasil que sonha e luta, não ganha. Nem a curto, nem a longo prazo. Hugo é jovem. E Lula aposta que ele ainda não quer virar cinza antes do tempo.

Sara Goes
Sara Goes é apresentadora da TV 247, comunicadora e designer.
Artigo Anterior

Simões recebe Bolsonaro com pompa para iniciar negociação da chapa ao governo de Minas

Próximo Artigo

Carta Brasil 2000 (II), por Izaías Almada

Assine nossa newsletter

Assine nossa newsletter por e-mail para receber as últimas publicações diretamente na sua caixa de entrada.
Não enviaremos spam!