Em uma declaração divulgada nesta terça-feira (24), os países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Irã, Egito, Etiópia, Indonésia, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita) expressaram “profunda preocupação” com os ataques militares ao território da República Islâmica do Irã, iniciados em 13 de junho. O texto denuncia os bombardeios como violação do direito internacional e da Carta das Nações Unidas, além de alertar para os riscos de uma escalada ainda mais grave no Oriente Médio, com impactos diretos sobre a economia global e a segurança internacional.

O bloco também condena especificamente possíveis ataques a instalações nucleares de uso pacífico, classificando-os como uma ameaça inadmissível à integridade de civis e do meio ambiente. Ao reafirmar seu apoio a canais diplomáticos e ao diálogo como única via legítima de resolução de conflitos, a declaração do BRICS reforça um tom moderador e contrapõe-se à lógica da retaliação armada.

Zona livre de armas nucleares e respeito ao direito humanitário

Um dos pontos centrais do documento é a defesa da criação de uma zona livre de armas nucleares e de destruição em massa no Oriente Médio — proposta antiga, mas historicamente bloqueada por Israel, única potência nuclear não declarada da região. O BRICS retoma esse pleito como forma de garantir estabilidade de longo prazo, enfatizando a urgência do desarmamento e da não proliferação.

A declaração também traz um apelo direto à proteção de vidas civis e da infraestrutura humanitária, princípios do Direito Internacional Humanitário frequentemente negligenciados nos conflitos da região. “Vidas civis devem ser protegidas”, reforça o texto, que ainda presta solidariedade às vítimas e suas famílias.

Silêncio e ambiguidade da aliança EUA-União Europeia

O tom da declaração conjunta do BRICS contrasta fortemente com o posicionamento — ou a ausência dele — dos principais aliados ocidentais. Os Estados Unidos, que mantêm presença militar estratégica em torno do Irã, têm adotado uma postura ambígua, evitando condenações explícitas aos bombardeios e, em alguns casos, justificando ações como “preventivas” ou “defensivas”. A União Europeia, por sua vez, limita-se a apelos genéricos por “contenção” e “evitação de escalada”, sem fazer referência direta ao ataque ao território iraniano.

Essa diferença de abordagem revela a crescente cisão entre dois polos geopolíticos: de um lado, a aliança euro-atlântica, cujo discurso de defesa da ordem internacional muitas vezes se mostra seletivo; de outro, o BRICS, que busca afirmar uma ordem multipolar baseada em soberania, diplomacia e não-intervenção.

Multipolaridade e disputa pela legitimidade internacional

Ao emitir uma declaração com linguagem diplomática clara, fundamentada no direito internacional e endereçada à “comunidade internacional”, o BRICS sinaliza não apenas sua preocupação com a estabilidade regional, mas também sua disposição de se apresentar como mediador legítimo em crises globais. A presença de países como Irã, Arábia Saudita e Egito no bloco amplia o alcance simbólico do comunicado, ao passo que reforça a percepção de que a ordem liderada pelos EUA já não detém o monopólio da narrativa internacional.

Ao chamar a atenção para os riscos da escalada militar e propor soluções baseadas na diplomacia, o BRICS projeta-se como uma alternativa à política de “choque e pavor” que marcou a atuação ocidental em décadas recentes no Oriente Médio.

Brasil e o papel construtivo da presidência do BRICS

Sob a presidência rotativa do Brasil em 2025, o BRICS tem procurado reforçar sua relevância diplomática, e a nota conjunta reflete esse esforço. O Itamaraty, embora evite adotar termos beligerantes, endossa os princípios da não agressão, da soberania e do multilateralismo — elementos centrais na diplomacia brasileira desde a redemocratização.

Com essa declaração, o BRICS reafirma seu compromisso com a construção de uma ordem internacional menos assimétrica e mais regulada pelo direito, num momento em que a militarização das disputas internacionais volta a ameaçar a paz global. Em meio a esse cenário, a diferença de tom entre os dois blocos torna-se cada vez mais visível — e politicamente relevante.

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Last Update: 24/06/2025