A crise no Oriente Médio atingiu um novo patamar de gravidade neste domingo (22), após o Parlamento do Irã aprovar o fechamento do Estreito de Ormuz — o gargalo marítimo por onde transita cerca de 20% de todo o petróleo consumido no mundo. A decisão, ainda pendente de confirmação pelo Conselho Supremo de Segurança Nacional e pelo líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, é uma retaliação direta aos bombardeios norte-americanos contra três instalações nucleares iranianas no fim de semana.

Embora o Irã já tenha ameaçado fechar o estreito em diversas ocasiões anteriores, esta é a primeira vez que o Parlamento aprova formalmente tal medida. O gesto foi lido por analistas como uma jogada geopolítica de alto risco, que combina retaliação simbólica, pressão estratégica e uma tentativa de forçar negociações globais, sobretudo com a Europa.

Um choque na economia global: petróleo em alta e incerteza nos mercados

A simples ameaça de fechamento já foi suficiente para provocar turbulência nos mercados de energia. O barril do tipo Brent saltou de US$ 69,36 para US$ 77,01, um aumento de 11% desde o início dos ataques. O WTI, referência nos EUA, teve alta semelhante. Analistas de instituições como Goldman Sachs e JPMorgan alertam que o preço do petróleo pode ultrapassar US$ 120 ou até US$ 130 por barril, caso o estreito permaneça bloqueado.

Isso afetaria diretamente a Europa, a Ásia e países emergentes importadores de energia. A alta dos combustíveis e a escassez de suprimentos poderiam empurrar economias já fragilizadas à beira da recessão. O próprio Irã, porém, também sofreria: suas exportações de petróleo à China — principal destino — também dependem do Estreito de Ormuz.

Pressão sobre a China e o dilema europeu

O fechamento do estreito coloca a China em uma posição sensível. Principal parceira comercial do Irã e dependente do petróleo do Golfo Pérsico, Pequim agora enfrenta pressões ocidentais para interceder junto ao governo iraniano. O secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio, apelou diretamente à China para que impeça o fechamento da hidrovia.

Do outro lado, a Europa vê-se compelida a escolher entre o alinhamento automático à estratégia belicista dos EUA e Israel — que bombardeiam alvos iranianos — ou uma política externa mais independente, voltada à diplomacia e à defesa do direito internacional. O temor de uma nova crise energética, como a provocada pela guerra na Ucrânia, já acende alertas em Berlim, Paris e Bruxelas.

Estreito sob risco: geografia estratégica e poder naval

Imagem de satélite do Estreito de Ormuz, um ponto estratégico de estrangulamento marítimo com o Irã situado no topo e a Ilha Qeshm e os Emirados Árabes Unidos ao sul. Foto de 24 de maio de 2017.

O Estreito de Ormuz, com apenas 33 km em seu ponto mais estreito, é vital para a segurança energética mundial. Por ele fluem diariamente entre 17 e 21 milhões de barris de petróleo e enormes volumes de gás natural liquefeito. Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Kuwait, Iraque, Irã e Catar utilizam o estreito para exportações — a maioria com destino à Ásia.

A Quinta Frota da Marinha dos EUA, baseada no Bahrein, é responsável pela segurança da navegação na região. Fontes militares revelaram que o Pentágono discute possíveis respostas ao bloqueio, incluindo missões de desminagem, uso de drones submarinos e envio de reforços navais. Ainda assim, especialistas alertam que uma ação iraniana bem-sucedida, mesmo que temporária, poderia paralisar o tráfego por semanas.

Mineração do estreito: risco calculado ou armadilha?

O Irã mantém capacidade naval significativa, incluindo minas navais de diversos tipos — de contato, magnéticas e acústicas —, além de submarinos e barcos de ataque rápido. Em 1988, durante a guerra com o Iraque, já utilizou minas contra navios comerciais e militares. O cenário atual, no entanto, é mais complexo: qualquer ação ofensiva iraniana no estreito pode ser encarada como “declaração de guerra” por parte dos EUA.

Mesmo assim, analistas como Bob McNally, da Rapidan Energy, alertam que o mercado subestima o impacto de uma ação iraniana bem-sucedida. “A ideia de que a Marinha dos EUA limparia o estreito em poucas horas é ilusória. Isso pode levar semanas ou meses, colocando marinheiros em risco constante”, afirmou.

Entre o cálculo e o desespero: o que quer Teerã?

A medida aprovada pelo Parlamento iraniano serve múltiplos objetivos: aumentar o custo da agressão dos EUA, pressionar aliados estratégicos como a China e forçar a abertura de canais diplomáticos sob seus próprios termos. Também serve como sinal interno de força, em meio à devastação causada pelos ataques nucleares e à fragilidade econômica.

O ministro das Relações Exteriores do Irã afirmou que o país “reserva todas as opções para defender sua soberania”. Já analistas apontam que o regime busca manter viva sua capacidade de dissuasão diante de Israel e dos EUA, mesmo sabendo que um confronto total pode ser desastroso.

O relógio geopolítico corre

O fechamento do Estreito de Ormuz, mesmo que temporário, não é apenas uma ameaça regional — é um choque global. Ele testa o equilíbrio de poder no Golfo Pérsico, a coesão política do Ocidente, a capacidade de contenção dos EUA e o pragmatismo da China.

A decisão final agora está nas mãos do Conselho Supremo de Segurança Nacional e do líder supremo iraniano. Se aprovada, pode marcar o início de uma nova etapa no confronto — não apenas militar, mas estratégico e energético — com reverberações profundas.

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Last Update: 23/06/2025