A China é a fábrica do mundo. Esta máxima foi absorvida e os produtos chineses passaram por três fases de percepção. A primeira fase foi a de que eram copiados e tinham baixa qualidade e tecnologia. Esta fase foi superada quando consumidores do mundo todo passaram a consumir os produtos vindos da China, mas com marcas de referência. Tênis Nike, smartphones da Apple, eletrodomésticos de praticamente todas as marcas ajudaram a compor a imagem de que a qualidade estaria garantida. A terceira fase, dos quais os carros são os maiores exemplos, jogaram definitivamente por terra a imagem de produtos ruins. Carros chineses transitam por todos os grandes centros do mundo. E, no Brasil, algumas marcas são quase uma febre.
Agora, a presença da chinesa no Brasil avança para outros nichos – em uma evolução lógica, mas ainda não assimilada. A China é um país complexo. Tem 1,4 bilhão de habitantes, praticamente 7 vezes maior do que o Brasil. As 15 maiores cidades somam a população brasileira. Xangai, a maior de todas, tem uma densidade demográfica de cerca de 27 mil moradores por km², enquanto São Paulo chega a 7,5 mil. A experiência chinesa em serviços começa a ser transportada para o Brasil.
Existem vários movimentos em andamento. Um deles é a entrada da Meituan no mercado de entrega de alimentos. A empresa divulgou um investimento de 5,6 bilhões em 5 anos e garantiu o início das operações ainda em 2025. Criada em 2010 em Pequim, a Meituan tem uma estratégia agressiva de negócios. Iniciou como uma plataforma de descontos e compras coletivas e evoluiu para um negócio de entregas O2O (online to offline). O grupo atua em atividades como serviços de varejo, incluindo entretenimento, restaurantes, viagens e outros.
A expansão internacional começou em Hong Kong com a marca Keeta, em 2023. A seguir iniciou sua operação na Arábia Saudita. Nos dois locais assumiu a liderança no delivery de alimentação. Os dados da empresa indicam que ela fechou o ano de 2023 com 115 mil funcionários. Em 2024 as informações de fontes de mercado apontam uma receita superior a 256 bilhões de reais e uma base de usuários de 704 milhões de usuários na plataforma. A média de entregas chegou a 98 milhões por dia.
A entrada no segmento de delivery de alimentação não será simples no Brasil. O iFood detém, segundo dados da Euromonitor, 70% do mercado de entregas. É uma marca que tem forte presença na mente dos consumidores e realiza campanhas de marketing bem estruturadas. Outro concorrente no setor de entregas de alimentos, o Rappi, aumentou os investimentos para dobrar a quantidade de parceiros comerciais, abolindo taxas cobradas de bares e restaurantes.
Embora já atuando no Brasil, a Didi, que opera o Uber na China e a 99 no Brasil, recentemente anunciou investimentos para voltar a disputar o mercado de entregas de alimentação. A 99Food faz parte de uma estratégia de ampliação de atividades. A empresa quer criar o que está chamando de superapp reunindo os serviços de transporte, entrega e uma plataforma financeira.
Todas essas iniciativas, somadas a uma ampliação de atuação da Shein, da Temu e de outras empresas que unem tecnologia, serviços de logística e conveniência, estabelecem um novo patamar de negócios para empresas chinesas no Brasil. Essa oportunidade também foi observada pela Mixue, maior rede de fast food do mundo, que desbancou o McDonald’s vendendo chás e sorvetes, que anunciou um investimento de 3,2 bilhões de reais e a criação de 25 mil empregos. A Mixue é outro serviço voltado para o atendimento de necessidades crescentes em centros urbanos: pontos de consumo fast food.
A experiência em locais densamente povoados e complexos em termos de densidade populacional e trânsito parecem uma oportunidade. No entanto, as empresas terão que passar por um processo de adaptação cultural. Os grandes centros brasileiros têm desafios de segurança, indefinições legais relacionadas a vínculos trabalhistas e outras características. A certeza que resta é que, depois dos produtos, agora chegou a vez das empresas de tecnologia e serviços de disputarem o mercado brasileiro. Em breve outros negócios estarão por aqui.