Nesta quinta-feira (19), o presidente Lula foi entrevistado pelo rapper Mano Brown e pela jornalista Semayat Oliveira, no podcast Mano a Mano.
Dentre os assuntos abordados, Lula foi questionado sobre críticas feitas a ele devido à política neoliberal adotada pela área econômica do Executivo. Em sua resposta, o presidente acabou por expor em parte a realidade de que seu governo está cercado pela burguesia e não tem condições de governar:
“Eu fui eleito presidente da República e elegi 70 deputados do meu partido. O Congresso Nacional tem 513 deputados. É só analisar para saber que eu preciso fazer composições políticas para poder governar, senão eu não consigo”, acrescentando que, no Senado, há apenas nove senadores do PT dentre 81, frisando que “a dificuldade é imensa”.
Tentando justificar a política de conciliação com a burguesia, que cerca seu governo, ele afirmou se considerar um “cidadão de esquerda, mas muito realista desde o tempo em que eu era dirigente sindical”, acrescentando que “eu não era daqueles que ficava gritando ‘ou 100% ou nada’. Quem grita ‘100% ou nada’ vai ficar com nada. Eu reivindicava aquilo que era possível reivindicar de acordo com a força que eu tinha, e conquistava muita coisa”.
Em determinado momento da entrevista, Mano Brown questionou Lula sobre a escolha de Alckmin para vice-presidente. Ao afirmar que não concorda 100% com Lula, o entrevistador falou sobre ter questionado a escolha de Alckmin já na época das eleições:
“O seu vice eu nunca concordei [com a escolha dele]. Eu já questionei o senhor em relação ao seu vice-presidente… eu tenho um problema sério com ele. Quem é de São Paulo sabe… a gente discordou, eu questionei presidente o que que o Alckmin está fazendo no seu governo. O senhor me deu uma resposta que acabou não se concretizando, porque em São Paulo nós perdemos”.
Ao responder, Lula disse que “Alckmin vem sendo um vice extraordinário”, justificando que Alckmin “tem feito um trabalho extraordinário na vice-presidência”. Explicando o suposto serviço extraordinário, Lula disse que “ele é ministro do Desenvolvimento de Indústria e Comércio e tem feito um trabalho extraordinário para que a indústria brasileira volte a crescer. E depois de 14 anos a indústria brasileira voltou a crescer 3.4%”.
Ainda, o presidente disse que uma coisa que eu aprendi é que “o Alckmin tem uma lealdade extraordinária na relação comigo”, acrescentando que “sinceramente acho que foi um acerto trazer o Alckmin para ser vice. Sabe por quê? Senão você poderia trazer uma pessoa que depois ficasse tentando como Temer dar um golpe na Dilma sabe. O Alckmin não é esse tipo de gente”.
Lula também foi questionado sobre a questão da “segurança pública”, a que ele respondeu defendendo a chamada PEC da Segurança Pública, que fortalece o aparato de repressão:
“O que nós estamos fazendo para que o Governo Federal tenha uma incidência forte na segurança pública, sem interferir na autonomia dos estados? Nós fizemos uma PEC, mandamos uma emenda constitucional definindo o papel do Governo Federal na questão da segurança pública. Nós queremos participar mais ativamente com a Polícia Federal […] com a Polícia Rodoviária Federal […] com a Força Nacional de Segurança Nacional para que a gente possa interceder no combate à violência, mas que a gente possa interceder para evitar, antecipar a existência da violência.”
Falando sobre como se comunicar com a juventude, Lula aproveitou para falar contra as rede sociais: “como falar com a juventude? A juventude precisa ter sempre uma linguagem renovada a cada momento histórico. E nós temos a questão das redes digitais, que mudou o comportamento do ser humano. Mudou radicalmente. Alguns chamam de rede social, eu chamo de rede digital, porque de social tem pouca coisa e de ódio tem muita coisa”.
Lula também comentou sobre as eleições de 2026, e sobre a possibilidade de ser candidato. O presidente afirmou que será “candidato para ganhar as eleições”, acrescentando que “a extrema direita está procurando adversário, está procurando. Eu vejo todo dia um nome, eu vejo o Tarcísio [de Freitas] (Republicanos), eu vejo o Ratinho [Júnior] (PSD), eu vejo, eu vejo [Ronaldo] Caiado (União Brasil)”.
Ele afirmou também que “quem quiser ganhar de mim vai ter que andar mais do que eu na rua, vai ter que fazer mais discurso do que eu na rua, vai ter que conversar mais com o povo do que eu na rua e vai ter que fazer mais do que eu”.
Contudo, Lula defendeu a política neoliberal de Fernando Haddad, ministro da Economia, especificamente a questão do reajuste das alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Ele afirmou:
“O [Fernando] Haddad quer que as bets paguem imposto de renda, que as fintechs paguem imposto de renda, que os bancos paguem. Não é imposto de renda, é pagar um pouquinho só para a gente poder fazer a compensação, porque toda vez que a gente vai ultrapassar o arcabouço fiscal, a gente tem que cortar no orçamento. Então se eu tiver que cortar 40 bilhões do orçamento de obras de rua para saúde, para educação, eu tenho que ter uma compensação. E o IOF é uma forma para fazer compensação.”
Por outro lado, o presidente defendeu a exploração do petróleo na Margem Equatorial:
“Eu sou favorável que a gente vá trabalhando a ideia de um dia não ter mais combustível fóssil, mas eu sou muito realista. O mundo não está preparado para viver sem o petróleo, e você tem que utilizar o petróleo como instrumento para financiar a transição energética que o mundo precisa que seja feito. Você não conhece um desastre na história da Petrobras. […] A gente não pode abdicar dessa riqueza. O que podemos é assumir o compromisso de que nada será feito para causar qualquer dano ao meio ambiente, esse é o compromisso nosso, mas não podemos deixar de explorar a riqueza enquanto os Estados Unidos, a França, a Noruega e o Catar exploram. Nós precisamos do petróleo para muita coisa, sobretudo para exportar, para que o Brasil faça a transição energética.”
A entrevista de Lula a Mano Brown foi objeto de comentários por Rui Costa Pimenta, presidente do Partido da Causa Operária (PCO). Durante programa semanal de análise no canal TV 247, o dirigente avaliou que “pelo que eu vi nas matérias predominou um clima de maior realismo na entrevista tanto dos entrevistadores como do Lula né eu acho que é patente que há um desencanto […] o pessoal tinha expectativa de muito mais mudança, mas o governo não atendeu […] o próprio Lula reconhece que não atendeu porque o congresso as instituições de um modo geral não o deixam governar”.
No entanto, Rui Pimenta avaliou que “o PT não está tendo o nível de realismo necessário. Mas também não sei se eles têm condição de mudar”. Criticando a política de Lula, o dirigente afirmou que “o governo pode não realizar [o que prometeu], mas o governo precisa pelo menos dar a impressão de que ele deu uma batalha grande para realizar. O Lula não dá essa impressão porque a política dele é um conformismo”.