Hipocrisia e Mentiras

Por Marcelo Zero*

A questão do desarmamento sempre foi usada como desculpa para se impor sanções ou intervenções militares a países vistos geopoliticamente como rivais dos interesses dos EUA e do Ocidente.

A invasão do Iraque foi justificada pela suposta presença de armas químicas em território iraquiano, uma mentira deslavada, comprovada pela OPAQ, cuja ação correta, baseada no direito internacional público, provocou a brutal defenestração do nosso embaixador Bustani, um herói esquecido da soberania nacional e do multilateralismo.

Essa guerra provocou a morte de 300 mil pessoas e destruiu o Iraque.

Há muitos anos, usa-se a questão do programa nuclear iraniano, criado por um acordo entre os EUA e o antigo ditador pró-Ocidente Reza Pahlevi, para se impor sanções pesadas contra o Irã e, agora, para justificar uma guerra contra Teerã.

Em setembro de 2012, Netanyahu afirmou, ante a ONU, que o Irã teria armas nucleares já em meados de 2013. Emulou Colin Powell. Estamos em 2025.

É sempre assim: o Irã está sempre “às vésperas” de construir armas atômicas.

A Agência Internacional e Energia Atômica e seu diretor, Rafael Grossi, simplesmente mentiram descaradamente, em sua última Resolução, quando afirmaram que Irã poderia estar enriquecendo urânio a mais de 60%, provavelmente almejando fins militares.

Essa agência não tem nenhuma evidência concreta dessa afirmação, até mesmo porque não tem realizado inspeções recentes. No entanto, foi essa resolução sem fundamentos, sem evidências, que justificou os ataques israelenses e o início da guerra.

A CIA já tinha assinalado, 3 meses antes, que não havia provas de que o Irã estava enriquecendo urânia a níveis perigosos.

Hoje, Rafael Grossi, admitiu que “eles não tinham qualquer evidência de que o Irã estaria promovendo um esforço sistemático para construir armar nucleares.”

Agora, é tarde, não é? E ainda manifesta preocupação com os bombardeios, que poderiam promover contaminação radioativa de grandes áreas.

O objetivo principal de Israel com essa guerra é tentar desestabilizar o regime iraniano e isolar mais o Irã, que estava conseguindo se aproximar a países árabes sunitas, como a Arábia Saudita. Uma unificação de xiitas e sunitas não agrada a Netanyahu. Ademais, a entrada do Irã no BRICS, tende a fortalecê-lo e a amainar as terríveis sanções a que está submetido. Netanyahu percebe que é “agora ou nunca”.

Porém, o mais rematado oligofrênico sabe que maioria do povo iraniano jamais aceitaria um governo lá colocado por Israel e pelos EUA. Isso é delírio geopolítico. O Irã poderá até evoluir para um regime mais comedido, como o está fazendo agora, mas jamais aceitará ser forçado a isso por seus “arqui-inimigos”.

Por aqueles que o humilham sistematicamente.

O programa nuclear, como sempre, é mero pretexto para a aventura irracional.

Diga-se de passagem, o Irã sempre honrou seus compromissos nos acordos feitos, quem sempre descumpriram foram os EUA.

Netanyahu, contudo, não tem condições de promover uma guerra de ocupação contra Irã, um país de 1,65 milhão de quilômetros quadrados e uma população de 92 milhões. E Trump sabe que uma guerra desse tipo seria um atoleiro estratégico e financeiro. Os EUA ficaram 20 anos no Afeganistão, um país bem menor e muito mais fraco. Gastaram US$ 2,5 trilhões, apenas para devolver o poder aos Talibãs, de forma humilhante.

Se Trump tivesse evidência concreta de um real descontrole do programa nuclear iraniano, já teria bombardeado as instalações.

Suas dúvidas e reticências, demonstram que não há provas objetivas de que o Irã está “prestes” a construir armar nucleares. Prestes desde 2012, segundo Netanyahu.

Além disso, seus aliados estão divididos sobre o que fazer. Os unem somente a proverbial ignorância estadunidense sobre o mundo e a arrogância de um Império ameaçado.

*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais

Leia também

Julian Marcfarlane: Uma nação de mártires

Julian Macfarlane: Irã vs Israel. Quem ganha?

Chris Hedges: A regra dos idiotas

Marcelo Zero: Alguns esclarecimentos sobre a questão do Irã

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 20/06/2025